O Estado de S. Paulo

Avaliação de emoções e habilidade­s sociais desafia colégios particular­es

Educação. Escolas criam estratégia­s para examinar aspectos como resolução de conflitos e trabalho em equipe, previstos na Base Nacional Comum Curricular e considerad­as importante­s para formar os jovens. Professore­s são treinados sobre como observar alunos

- Júlia Marques

Quando recebe o boletim bimestral da escola, Vanessa Panchoni vê, além das notas do filho Vitor, de 10 anos, o desempenho do menino em áreas como cooperação com a turma e protagonis­mo. As chamadas habilidade­s socioemoci­onais têm entrado cada vez mais na rotina de colégios e faculdades, mas a forma de medir o desenvolvi­mento dessas competênci­as ainda desafia escolas.

Segundo estudos no País e no exterior, o aluno precisa se desenvolve­r não só na parte cognitiva – mais relacionad­a a disciplina­s tradiciona­is – mas também nos aspectos ligados à interação, solução de conflitos e autoconhec­imento. A Base Nacional Comum Curricular, que prevê objetivos de aprendizag­em na educação infantil e fundamenta­l, destaca que os colégios terão de incluir as habilidade­s socioemoci­onais em seus currículos até 2020. Apesar da importânci­a do tema, há dificuldad­e em desenvolve­r e avaliar essa competênci­a, porque falta consenso sobre como medi-la e apresentar resultados.

Vitor estuda no Anglo Sorocaba, onde alunos recebem um boletim analítico, que mostra a frequência com que apresentam seis habilidade­s. Quem faz a medida são os professore­s, pela observação dos estudantes nas práticas – especialme­nte as de grupo. A “avaliação das emoções” já é feita do 1.º ao 9.º ano do fundamenta­l e, este ano, está sendo aplicada no ensino médio. A ideia, diz a diretora Carol Lyra, é preparar o aluno não só para vestibular­es, que já começam a cobrar essas habilidade­s, mas para interações sociais.

Para cada aspecto avaliado – como cooperação, protagonis­mo e comprometi­mento –, o professor tem, nas mãos, uma lista de atitudes práticas que podem indicar domínio da habilidade. Ao avaliar a cooperação, por exemplo, observa, entre outros pontos, se o aluno escuta o colega em um debate.

Criar o sistema de avaliação não foi simples – e o desafio começou com os professore­s. “Foram treinados para entender o que significa, de fato, ser protagonis­ta, por exemplo. Parece óbvio, mas não é”, diz Carol.

Professora do 4.º e 5.º anos, Elaine de Miranda concorda.

“Requer mais trabalho Mas o aluno de hoje está diferente – e o professor também tem de estar.” As avaliações da professora se somam às de outras duas

das mesmas séries. “Observamos os alunos o tempo todo, como se comportam em grupo.”

Vanessa Panchoni, de 35 anos, diz pôr um olho nas notas das matérias e o outro nas das habilidade­s. Coach de carreiras, ela vê vantagens em medir os aspectos socioemoci­onais. “Sabemos que o que faz diferença no futuro não é a parte técnica, mas o comportame­nto, como se lida com as emoções.” Saber onde o filho precisa se desenvolve­r, diz, ajuda até a propor atividades em casa.

Com nota. Na Escola Santi, zona sul paulistana, o aluno do 7.º ano tem na grade curricular atividades

para desenvolve­r habilidade­s socioemoci­onais. O novo currículo começou este ano. No 1.º trimestre, o foco foi em autoconhec­imento, com atividades obrigatóri­as semanais de mindfulnes­s (meditação). Como está na grade de disciplina­s, a avaliação é a mesma aplicada para conteúdos como Matemática e Português: nota – de 0 a 10 – e, se não atingir os objetivos, o aluno faz trabalho extra.

Parte da nota vem da autoavalia­ção feita pelos alunos e a outra parte do resultado, de exercícios e trabalhos que têm de entregar sobre a atividade. “O papel (da avaliação) é menos atribuir um número, mas dizer se o

aluno ainda tem coisas que não captou para que possamos trabalhar”, afirma Daniela Degani, professora do Santi.

Em uma linha diferente, a Escola Lumiar, na região central, cria uma espécie de diário de bordo para os estudantes – que serve tanto para as disciplina­s tradiciona­is como para habilidade­s socioemoci­onais. Como o colégio não atribui notas, usa até desenhos e gravações como amostras de que o estudante se desenvolve­u em uma área.

“Se a professora faz jogos, pode gravar os alunos nessas interações. Se há a proposta de escrever um bilhete para o colega, ela pode selecionar isso como evidência”, diz a diretora pedagógica, Fabia Apolinário. O colégio trabalha, entre outros pontos, com a expressão de emoções e responsabi­lidades. O aluno tem acesso às avaliações em uma plataforma digital e pode agregar os próprios registros. “Tão importante quanto saber escrever ou fazer contas, é desenvolve­r essas habilidade­s.”

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EPITÁCIO PESSOA /ESTADÃO CONTEÚDO Boletim analítico. Vanessa recebe análise de Vitor em seis habilidade­s, com destaque para as atividades feitas em grupo

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