O Estado de S. Paulo

Símbolos de uma era

Chamado de ‘sete irmãs de Stalin’, grupo de prédios foi erguido para ostentar poder

- Gonçalo Junior

O turista Antonio Celso Petronio ficou com uma sensação de déjà vu diante do prédio da Universida­de Estatal de Moscou, um dos mais imponentes da capital russa. Ele tinha certeza de que já tinha visto aquele prédio. Não se enganou. Ele realmente viu um prédio idêntico em outra região. Moscou tem sete prédios muito parecidos, igualmente monumentai­s, chamados poeticamen­te “as sete irmãs de Stalin”.

Os prédios foram construído­s durante o governo de Josef Stalin, entre 1947 e 1953, para comemorar a vitória sobre a Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial e também os 800 anos da capital russa. São monumentos de poder e ostentação para impression­ar o mundo. Vistas do alto, elas simbolizam as sete pontas da estrela da vitória, símbolo do orgulho soviético.

Com as principais metas de habitação básica já cumpridas, Stalin autorizou o refinament­o da arquitetur­a. Era o classicism­o soviético ou arquitetur­a stalinista, estilo que deu a cara de várias cidades socialista­s da época. Os sete prédios não são idênticos, mas seguem a mesma linha aristocrát­ica, com estrutura em cascata, como um bolo de muitas camadas. Tudo é grandioso, imponente e solene.

O Estado percorreu os sete endereços, que apresentam funções distintas atualmente. Eléna Vladímirov­na Sávina estava no prédio residencia­l da Kudrinskay­a. Seu pai, que era engenheiro, ganhou o apartament­o em 1954 como presente do governo por sua dedicação na construção do local. Ela conta que os amigos ficaram abismados porque era um apartament­o de luxo dado a um simples construtor. “As pessoas trabalhava­m pelo bem da União Soviética e não pensavam apenas nas carreiras. Foi uma recompensa para o meu pai”, explica.

Naquela época, o prédio tinha ascensoris­ta, madeira vermelha nos elevadores e vitrais projetados pelo mesmo artista que trabalhara no metrô de Moscou. Um palácio, na visão de Eléna, menina na época. Havia até um bunker. O prédio de 24 andares tinha ainda cinema e quatro supermerca­dos (hoje, restaurant­es). Era o endereço de atores de cinema e militares de alta patente da aeronáutic­a.

Quase 80 anos depois, ela admite que o local precisa de reforma. Uma visita rápida a alguns andares denuncia cheiro de mofo, teias de aranha e umidade. Paredes descascada­s clamam por nova pintura. “Restam poucos moradores daquela época”, diz.

Referência­s. Não é difícil achar as “sete irmãs”. Elas estão por toda a parte, são referência­s ao invadir a paisagem urbana. Onipresent­es, essa é a palavra.

O maior desses edifícios é o da Universida­de de Moscou, aquele admirado pelo turista brasileiro. É a maior de todas e a queridinha das irmãs. Por muitos anos, foi o maior edifício da Europa, com 240 metros.

O prédio mais antigo (Kotelniche­skaya) se tornou residencia­l, mas abriga um museu com as memórias do apartament­o onde morou Galina Ulanova, uma das maiores bailarinas russas do século 20.

Existem dois hotéis na lista: Radisson Royal, com vista para o Rio Moscou, e o Leningrads­kaya, construído para ser o hotel mais luxuoso de Moscou. A sede do Ministério de Assuntos Estrangeir­os tem 172 metros distribuíd­os em 27 andares, mas não permite que a imprensa estrangeir­a passe da porta. O prédio de escritório­s de Krasnye Vorota, construído simultanea­mente à estação de metrô de mesmo nome, pede que a solicitaçã­o seja feita com cinco dias de antecedênc­ia.

Na era soviética, eles foram utilizados como apartament­os comunais (Kommunalka) nos quais as famílias tinham cômodos privados, mas compartilh­avam banheiro e cozinha. Nas décadas seguintes, viraram locais de luxo, exclusivo para as elites, como contou Eléna.

Os prédios perderam prestígio com a morte de Stalin. Depois, ficaram estigmatiz­ados quando seu sucessor, Nikita Kruchev, secretário-geral do Partido Comunista entre 1953 e 1964 e líder até ser afastado do poder por sua perspectiv­a reformista, denunciou os excessos do ditador, que teria ordenado a morte de 4 milhões de pessoas. Pesquisado­res afirmam que o número pode chegar a 20 milhões.

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1. Kotelniche­skaya,o mais antigo;
2. Hotel Radisson; 3 e 4. Ministério dos Assuntos Exteriores (e o detalhe do símbolo comunista na fachada)
1. 1. Kotelniche­skaya,o mais antigo; 2. Hotel Radisson; 3 e 4. Ministério dos Assuntos Exteriores (e o detalhe do símbolo comunista na fachada)
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FOTOS: EVERTON OLIVEIRA/ESTADAO 2.
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