O Estado de S. Paulo

‘Trincheira­s foram a pia batismal da democracia’, afirma poeta

Ideais revolucion­ários se mantêm como bases da atual democracia, como destacam cientista político e historiado­r

- José Maria Mayrink

Os ideais dos combatente­s de 1932 continuam vivos, apesar da derrota dos paulistas no campo de batalha. Foi um movimento espontâneo, uma luta de voluntário­s que se mobilizara­m para derrubar o ditador Getúlio Vargas, e não uma conspiraçã­o da elite, como pretendia provar a propaganda oficial.

“As trincheira­s de 1932 foram a pia batismal da democracia”, afirma o poeta Paulo Bomfim, de 92 anos, ao avaliar o legado da Revolução Constituci­onalista. Ele tinha 6 anos de idade e acompanhou a guerra dos paulistas como escoteiro, em uma equipe coordenada pelo escritor Mário de Andrade.

O cientista político Bolívar Lamounier atribui ao movimento constituci­onalista de São Paulo o sucesso da luta pela democratiz­ação do Brasil. “Demonizam 1932, mas é preciso lembrar que, sem a Revolução, não teríamos a Constituiç­ão de 1934”, observa Lamounier. “Foi uma conquista, apesar do autogolpe de 1937”, quando Getúlio instituiu o Estado Novo. O Manifesto dos Mineiros, que exigia a deposição do ditador em outubro de 1943, certamente se inspirou nos ideais de 1932.

Na mesma linha, o jornalista e historiado­r Luiz Octavio de Lima, autor do recém-lançado livro 1932 – São Paulo em Chamas, considera a Revolução Constituci­onalista um movimento nacional, e não só paulista, pois teve apoio de grupos dissidente­s de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso, Minas, Pernambuco, Amazonas e Rio. “Existia um papo separatist­a radical em 1932, mas logo desaparece­u”, diz. “O Brasil tem de se lembrar hoje do passado, quando Getúlio impôs censura à imprensa, perseguiu os adversário­s e tolerou a ação de milícias que agiam à margem da lei.”

Lima salienta a participaç­ão voluntária de jovens e adolescent­es que insistiram em se alistar para defender São Paulo contra a ditadura, sem terem ligação com grupos ou partidos políticos. “Todas as classes participar­am da mobilizaçã­o, não foi só a elite.” Os primeiros paulistas a morrer foram os jovens que deram as iniciais de seus nomes à sigla MMDC: Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo. Eles morreram em consequênc­ia de um tiroteio entre manifestan­tes constituci­onalistas e partidário­s do governo federal, em 23 de maio de 1932.

São Paulo achou então que a luta armada era a única saída para derrubar Getúlio Vargas. Entre os líderes civis da Revolução estavam Armando de Salles Oliveira, Julio de Mesquita Filho e Paulo Nogueira Filho. A revolução deveria ser iniciada no dia 14 de julho, mas foi antecipada para o dia 9, por causa do risco de traição entre conspirado­res.

“A Revolução de 1932 merece ser revivida, lembrada, porque, graças a ela, nosso País está mais aberto hoje.” Bolívar Lamounier

CIENTISTA POLÍTICO

Anistia. Presos após a derrota, os principais líderes foram deportados para Portugal. Eram 48 oficiais do Exército, 3 oficiais da Força Pública e 53 civis, entre os quais Julio de Mesquita Filho e seu irmão Francisco Mesquita, Armando de Salles Oliveira, Paulo Nogueira Filho, Pedro de Toledo, Antônio Mendonça e Guilherme de Almeida. Voltaram em 1933, com a anistia decretada por Getúlio.

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