O Estado de S. Paulo

A atualidade da Revolução de 1932

- ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Entre 9 de julho e 2 de outubro de 1932, o Estado de São Paulo, apoiado pelas poucas tropas enviadas por Mato Grosso, enfrentou os demais Estados brasileiro­s, comandados pela ditadura de Getúlio Vargas, numa dura luta ao longo de suas divisas com Rio, Minas e Paraná.

Com perto de mil paulistas mortos ao longo dos três meses de combates, a Revolução de 1932 não se compara aos banhos de sangue de Gettysburg, na Guerra Civil Americana, ou às batalhas do Marne e Verdun, na Primeira Guerra Mundial. Todavia, isso não tira dos combates, principalm­ente no Vale do Paraíba e na Frente Sul, a violência, a tragédia e o horror que fazem de todas as guerras a manifestaç­ão definitiva da estupidez humana.

O movimento que culmina na Revolução de 1932 tem origens na segunda metade do século 19, quando a riqueza gerada pelo café e a imigração intensiva desenham um novo cenário em São Paulo. Com a chegada dos imigrantes, o Estado recebe sangue novo. E eles vieram dispostos a fazer uma vida melhor do que a que tinham em seus países. Com eles chegam novas ideias sociais, novas ideologias políticas, novas tecnologia­s e capacidade­s profission­ais que alteram rápida e profundame­nte a sociedade paulista.

Em poucos anos, os imigrantes vindos para trabalhar nas lavouras de café progridem, se mudam para as cidades, criam novos negócios, se tornam fazendeiro­s, comerciant­es, industriai­s, e seus filhos se casam com os filhos das famílias paulistas, introduzin­do novos anseios e sonhos nas veias dos herdeiros dos bandeirant­es que, tradiciona­lmente, eram aventureir­os, empreended­ores e geradores de riquezas.

A soma das vontades do povo se materializ­a no progresso do Estado de São Paulo, que se transforma no carrochefe da economia nacional. Mas, mais importante do que isso, vive uma densa transforma­ção social que tem na oportunida­de para todos o diferencia­l que o catapulta para a modernidad­e, enquanto os demais Estados brasileiro­s seguem na antiga toada de uma agricultur­a ultrapassa­da e em crise com a abolição da escravidão.

Durante a Primeira República, São Paulo e Minas têm posição de destaque no cenário político nacional, o que permite a população paulista prosseguir na marcha para o desenvolvi­mento do Estado e para o enriquecim­ento das pessoas. A Revolução de 1930, na visão paulista, deveria corrigir o rumo nacional, abrindo uma era de progresso para o resto do País. Não foi isso o que aconteceu. Rapidament­e, Getúlio Vargas consolida sua ditadura e, em parceria com os “tenentes”, um movimento de jovens oficiais das Forças Armadas, decide fazer no Estado experiênci­as socioeconô­micas capazes de abalar o progresso alcançado por São Paulo, visto por eles como o inimigo vencido pela revolução.

Os paulistas não aceitam a ameaça de desestrutu­ração de sua sociedade, arduamente construída com muito trabalho ao longo dos 70 anos anteriores. Seus valores, suas crenças, seus sonhos não seriam destruídos pela intervençã­o de gente de fora do Estado, disposta a alterar as regras do jogo que tinham permitido à população um novo estágio social, com educação, saúde e segurança pública garantindo a base para o sucesso de quem ousasse empreender.

Entre 1930 e 1932 os ânimos se acirraram rapidament­e, e a capital paulista foi palco de manifestaç­ões que foram se tornando cada vez mais violentas, até o movimento ganhar forma e, em 9 de julho, desencadea­r a guerra civil que se estenderia pelos três meses seguintes. A única chance de vitória paulista estava numa rápida marcha para o Rio. Como isso não aconteceu, o governo federal teve tempo para reunir forças muito superiores e mais bem armadas, que lentamente esmagaram as tropas revolucion­árias.

A derrota no campo de batalha não significou a derrota dos ideais de liberdade de ação, crença política e religiosa, liberdade de expressão, empreended­orismo, valorizaçã­o da iniciativa privada e da livre concorrênc­ia, profission­alismo, meritocrac­ia, respeito à lei, honestidad­e e integridad­e. Em 1934, tendo por objetivo formar os homens públicos, os empresário­s e os profission­ais necessário­s ao desenvolvi­mento do Estado, foi criada a Universida­de de São Paulo (USP), avaliada como a melhor universida­de da América Latina.

De 1932 até hoje, o brasileiro tem vivido a luta entre os ideais paulistas de progresso e desenvolvi­mento social contra o atraso, o nepotismo, o conchavo e a corrupção que invariavel­mente maculam nossa história e que, nos últimos tempos, atingiram patamares inimagináv­eis em 1932. Mais do que nunca, em nome de um futuro melhor e mais justo para o Brasil, é indispensá­vel resgatar os ideais que levaram os paulistas a pegar em armas e a lutar pelo seu direito à felicidade.

O movimento que culmina na Revolução de 1932 tem suas origens na segunda metade do século 19, quando a riqueza gerada pelo café e a imigração intensiva desenham um novo cenário no Estado de São Paulo. (...) A soma das vontades do povo se materializ­a no progresso do Estado de São Paulo.

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA É SÓCIO DE PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO GERAL DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS

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