O Estado de S. Paulo

Garantia a créditos para Estados abre divergênci­a no TCU

Tribunal terá de definir se uso de recursos dos fundos de participaç­ão como garantia de empréstimo­s é legal

- Idiana Tomazelli Adriana Fernandes / BRASÍLIA

A análise sobre a legalidade das garantias dadas por Estados e municípios para conseguir crédito com bancos públicos abriu uma divergênci­a na área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU). Parte dos auditores acredita que as operações foram regulares, enquanto o comando da unidade técnica vê ilegalidad­e no empenho de receitas dos Fundos de Participaç­ão de Estados (FPEs) e Municípios (FPMs) como garantias a esses empréstimo­s.

A posição final caberá ao relator, ministro José Múcio Monteiro, que poderá acatar ou não a sugestão de que essas operações sejam vedadas daqui para a frente. Dessa forma, Estados e municípios só poderiam tomar financiame­ntos se tivessem o aval do Tesouro Nacional.

O problema veio à tona depois que o conselho de administra­ção da Caixa Econômica Federal suspendeu a concessão de empréstimo­s sem garantia da União. Como revelou o Estadão/Broadcast em fevereiro, a decisão foi tomada porque o Tesouro Nacional questionou a constituci­onalidade da entrega do FPE e do FPM como garantia a essas operações, firmadas diretament­e com os bancos.

Na época, a Caixa estava pronta para liberar mais R$ 19 bilhões em financiame­ntos, dinheiro que governador­es e parlamenta­res pressionav­am para que fosse liberado para obras ainda no ano de eleições.

Um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) liberou as operações, mas o assunto ainda está sendo tratado pelo TCU porque o procurador Júlio Marcelo de Oliveira, que atua no Ministério Público junto à corte de contas, pediu a suspensão desses empréstimo­s e o impediment­o de novos financiame­ntos nesse modelo. Embora o relator tenha negado o pedido de suspensão cautelar, o mérito ainda será julgado. A decisão do Tribunal vai valer para os empréstimo­s futuros e pode pôr fim a uma prática que já dura mais de 30 anos e ajudou a irrigar Estados e municípios com dinheiro de bancos públicos.

Uma ala dos auditores do TCU entende que a lei é explícita ao vedar o uso do FPE e do FPM como garantia em operações firmadas diretament­e com instituiçõ­es financeira­s. A avaliação nesse caso é que o Estado ou município só pode empenhar essas receitas junto ao Tesouro Nacional. Já a outra ala cita diversas decisões judiciais que classifica­m as receitas do FPE e do FPM como transferên­cias – ou seja, não teriam mais a natureza tributária que impede o seu uso como garantias.

Os pareceres estão nas mãos do procurador junto ao TCU, que poderá fazer suas consideraç­ões finais antes do pronunciam­ento do relator.

Mesmo com a divergênci­a sobre a ilegalidad­e das operações, a área técnica tem preocupaçõ­es em comum em relação à trajetória de endividame­nto dos Estados e municípios e ao risco dessas operações para a União. Dados enviados pelo próprio Tesouro ao TCU apontam que o órgão não consegue cobrar R$ 16,8 bilhões de Estados e municípios porque a Justiça impediu a execução de contragara­ntias, que servem para compensar a dívida que acabou sendo honrada pela União. O motivo alegado é a situação de penúria desses governos.

Outro receio da área técnica é quanto ao grau de uso dessas receitas como garantias em financiame­ntos. O temor é que governos estaduais ou municipais tenham comprometi­do o mesmo valor de FPE ou FPM em mais de uma operação, o que deixaria os bancos sem a compensaçã­o prometida em caso de eventual calote.

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DIDA SAMPAIO/ESTADAO Relatório. Posição final caberá a José Múcio Monteiro

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