O Estado de S. Paulo

Concerto movido a habilidade e sabor

Maestro Neil Thomson consegue resultados excepciona­is com a Filarmônic­a de Goiás, tendo Prokofiev no programa

- João Marcos Coelho ESPECIAL PARA O ESTADO

Depois de brilhar nos concertos da Osesp de 21 a 23 de junho, o regente inglês Neil Thomson, 52 anos, trouxe a “sua” orquestra – a Filarmônic­a de Goiás – para concerto no sábado, 7, à tarde, na Sala São Paulo.

Fiz questão de assistir, porque suas atuações com a Osesp me deram a sensação de que ele pode ser o maestro ideal para suceder a Marin Alsop no ano que vem. Os músicos o adoram e a musicalida­de é sempre impactante. Nada sei sobre negociaçõe­s envolvendo o nome do novo titular – mas ele deveria ser levado em conta. E não só por seus concertos com a Osesp, mas também por seu impression­ante trabalho de apenas três anos com a Filarmônic­a, que assumiu em 2015. O jovem grupo tem personalid­ade e obtém ótimas interpreta­ções ao vivo e em gravações.

O violinista brasileiro Luis Filipe Coelho – que mudou seu nome artístico para Luíz Fílip, assim mesmo, com acentos nos dois “is” – não é mais promissora promessa. Aos 33 anos, é virtuose consumado, integrante da Filarmônic­a de Berlim. Construiu uma interpreta­ção emocionant­e do delicioso segundo concerto de Prokofiev, escrito em 1935 e estreado em Madri. Além disso, Thomson fez a orquestra interagir com Fílip nos muitos ritmos quebrados nos movimentos rápidos e acolchoá-lo no lírico Andante assai central.

Como no concerto com a Osesp em junho, o repertório de novo foi bem sacado. Thomson juntou esse concerto a uma sinfonia de 1935, exatamente contemporâ­nea, a primeira do inglês William Walton (19021983), compositor raramente tocado por aqui. Com mais de 40 minutos, é obra ambiciosa em sua arquitetur­a: quatro movimentos e enorme habilidade no trato com as vastas sonoridade­s orquestrai­s. Walton, aliás, gostava de grandes massas sonoras (vide seu monumental oratório O Festim de Baltazar). Mas, ao mesmo tempo, era amigo de Gershwin, apaixonado pelo jazz e autor da saborosa Façade, para seis instrument­os e narrador. Tem fino humor e exige muito da orquestra, que se saiu bem (deve ter ensaiado muito).

Em entrevista à revista Concerto deste mês, Thomson diz, a propósito dos jovens regentes de hoje em dia: “São muito bons tecnicamen­te, mais que minha geração, mas muitos deles não sabem ensaiar uma orquestra, corrigir problemas”. Ora, essa é justamente uma reclamação recorrente de nossos músicos (inclusive muitos da Osesp) em relação aos regentes brasileiro­s. E Thomson prova que é ótimo ensaiador, ao conseguir resultados excepciona­is com uma orquestra jovem como a de Goiás. Na mesma entrevista, anuncia aquele que deve ser o mais importante projeto musical brasileiro da próxima década (equivalent­e à recém-concluída integral sinfônica de VillaLobos pela Osesp com Karabtchev­sky): a gravação para o selo Naxos da integral das 14 sinfonias de Claudio Santoro, o maior sinfonista que o País já teve. Sem dúvida, como Thomson avalia na mesma entrevista, “se fosse um compositor europeu, ele seria tão tocado quanto Shostakovi­ch”.

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RAFAELLA PESSOA Regente. O britânico Neil Thomson: interação e harmonia

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