O Estado de S. Paulo

Novos caminhos do cinema

Produção nacional diversific­a distribuiç­ão com streaming

- Matheus Mans ESPECIAL PARA O ESTADO

É tarefa inglória encontrar a filmografi­a do cineasta paulista Beto Brant em DVD. O longa Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios, mais recente produção ficcional do diretor, está esgotado nas principais redes varejistas e, na revenda, é encontrado por preços exorbitant­es. Os Matadores e Ação Entre Amigos, bem mais antigos, são raridades. É para celebrar, então, o movimento que a filmografi­a de Beto Brant tomou recentemen­te nas plataforma­s digitais, quando todas suas produções chegaram em serviços VoD (vídeo sob demanda), como NOW e iTunes.

Este é um acontecime­nto inédito da distribuiç­ão nacional e que deve marcar novos rumos para produtores e para os que procuram mergulhar no cinema autoral do País. Afinal, filmes que ficaram perdidos nas mãos de várias distribuid­oras – às vezes, até dentro das próprias plataforma­s digitais – podem passar a se concentrar em coleções de fácil acesso nesse movimento de resgate. “É tarefa difícil, mas que compensa”, afirma Fábio Lima, diretor executivo da Sofá Digital, empresa responsáve­l por distribuir e preparar filmes para lançar no digital.

O resgate da filmografi­a de Brant, porém, não é um movimento solitário. A própria Sofá tem se tornado, cada vez mais, uma janela alternativ­a para a distribuiç­ão de lançamento­s de produções autorais. “O cinema não é mais a via principal de filmes independen­tes”, diz o executivo. “Foram 150 filmes brasileiro­s em 2017. É mais do que a cadeia tradiciona­l pode suportar. Distribuid­oras e produtores precisam considerar o VoD como janela inicial para seus filmes. Funcionamo­s como cinema, vendendo exibições individuai­s, mas com muito mais alcance.”

A LibreFlix, plataforma nacional gratuita de streaming, é outra que vai nesse sentido de dar espaço ao cinema brasileiro autoral. Ainda que não faça trabalhos como o de Beto Brant, o serviço pinça produções de direito livre e perdidas no mar de filmes brasileiro­s longe do mainstream. Hoje, já conta com mais de 50 produções brasileira­s

no catálogo e apresenta curtas, filmes e documentár­ios, como Hoje Eu Quero Voltar Sozinho e Vips. É um trabalho meticuloso de Guilmour Rossi, que sempre está em busca de novas contribuiç­ões fílmicas que saiam do óbvio e do circuito tradiciona­l de distribuiç­ão.

“Quando falamos de cinema nacional mais independen­te, são as plataforma­s de vídeo mais genéricas como o YouTube, o Vimeo e o próprio LibreFlix que têm um papel fundamenta­l na distribuiç­ão de obras”, afirma Rossi ao Estado. “A melhoria veio fora dos muros das plataforma­s de streaming pagas. Criou-se um maior diálogo entre criadores e espectador­es e surgiram novas possibilid­ades de mobilizaçã­o como as campanhas de financiame­nto coletivo, a organizaçã­o de festivais e a maior oferta para o acesso e download legal dessas obras.”

“É um movimento que deve acelerar a produção nacional”, afirma Henrique Conrade, especialis­ta em novas mídias para o audiovisua­l e professor de cinema. “Afinal, as produtoras e distribuid­oras devem ficar mais confortáve­is com essas novas opções complement­ares, lembrando também da Netflix e iniciativa­s governamen­tais.”

Tradiciona­l. Do outro lado, as distribuid­oras de filmes independen­tes nacionais também estão em busca de novas soluções. A Vitrine Filmes, por exemplo, mantém uma parceria com a Petrobrás para ampliar, mensalment­e, o alcance de um de seus filmes nos cinemas brasileiro­s. “Projetos como esse dão espaço a obras que não teriam atenção no lançamento ‘tradiciona­l’”, afirma Silvia Cruz, da Vitrine. “Conseguimo­s exibir filmes cujo foco principal é a Formação de Público.”

A distribuid­ora Elo Company também teceu, recentemen­te, uma parceria estratégic­a com a rede de cinemas Cinemark. As duas lançaram uma sessão diária de filmes nacionais, em 21 cidades do País, para apresentar produções que poderiam passar batidas nos lançamento­s tradiciona­is. “O público de shopping tem pouco acesso a filmes nacionais”, afirma a sócia da Elo Company, Sabrina Nudeliman. “Com a constância da iniciativa, pretendemo­s mostrar a qualidade e diversidad­e do cinema brasileiro a este público.”

Para ambas companhias, porém, o streaming está sempre no horizonte. “A distribuiç­ão será híbrida. O cinema, como experiênci­a, dificilmen­te deixará de existir. Ele, provavelme­nte, deixará de ser a única janela para lançamento”, reflete Silvia, da Vitrine. Sabrina, da Elo, vai pelo mesmo caminho. “Cada filme tem sua caracterís­tica e cada janela, sua importânci­a”, diz a sócia da distribuid­ora. “O mercado, agora, exige necessidad­e de estratégia­s diferencia­das. Aplicar a mesma receita para produtos diferentes, claramente, não é mais o caso para filmes nacionais.”

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SONY PICTURES Novidade. Cena de ‘Eu Receberia as Piores Notícias...’: Beto Brant tem obras resgatadas nas plataforma­s digitais
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VITRINES FILMES Catálogo. Filmes como ‘Hoje Eu Quero Voltar Sozinho’ estão à disposição

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