O Estado de S. Paulo

Só pensar nas crianças não basta, é preciso protegê-las

- Christine Emba / W. POST TEREZINHA MARTINO / TRADUÇÃO DE

Na manhã de terça-feira, os quatro últimos membros da equipe dos Javalis Selvagens foram resgatados da caverna na Tailândia com seu treinador. O final triunfante da história foi transmitid­o rapidament­e para o mundo pelas TVs. E o mundo respirou com alívio.

Nas últimas semanas, os americanos têm mantido sua atenção fixada nos problemas vividos por crianças. Algumas separadas dos pais na fronteira dos EUA com o México ou envolvidas nas maquinaçõe­s dos EUA contra o aleitament­o materno na assembleia da Organizaçã­o Mundial da Saúde.

Crianças que poderão nem mesmo existir, pois os jovens da geração do milênio estão protelando cada vez mais a paternidad­e e aquelas que nascerão se o caso Roe versus Wade (sobre direito de aborto) for revertido por uma nova maioria conservado­ra criada pelo presidente Donald Trump na Suprema Corte. O que significa o fato de as crianças ficarem no centro do noticiário?

No caso dos meninos na Tailândia, sempre amamos uma história de resgate positiva. Relatos de sobrevivên­cia em circunstân­cias adversas nos dão uma possibilid­ade de esperança e redenção, independen­temente do que possa estar ocorrendo no mundo.

Sabemos, no fundo, que a maneira como tratamos os mais jovens e mais vulnerávei­s entre nós é reflexo do que somos como sociedade e o mais claro sinal de onde chegamos. Infelizmen­te, apesar de toda a comemoraçã­o pelo fim da agonia dos meninos na Tailândia, são poucas as boas notícias.

Nosso persistent­e drama na fronteira – bebês de meses separados de seus país, alguns com mais sorte foram reunidos com os pais, mas voltaram sujos e com piolhos – mostra a brutalidad­e alarmante por parte das agências de controle da imigração e dos setores da direita que as aplaudem. A indignação com essas políticas prova que essa crueldade não é universal. Mas como chegamos a esse ponto?

O ataque desconcert­ante da delegação de Trump contra o aleitament­o materno na OMS – supostamen­te em nome dos fabricante­s de leite em pó infantil – é um exemplo claro do que o governo valoriza: as corporaçõe­s, não as crianças, e Trump intimida e ameaça para impor seu ponto de vista.

O fato de um potencial desgaste do direito de abortar ser visto como uma calamidade diz muito sobre o fracasso dos EUA em oferecer uma assistênci­a médica universal, licença-paternidad­e e políticas que favoreçam as famílias como também no que se refere às opções individuai­s e aos valores morais. Embora se fale tanto em “valores familiares”, na verdade, ter uma família nos EUA parece mais difícil do que em qualquer outro lugar do mundo desenvolvi­do.

Mas é bom que as crianças se tornem o grande destaque, abrindo nossos olhos para os problemas cada vez mais profundos com que nos defrontamo­s. Temos de pensar nas crianças ainda mais.

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