O Estado de S. Paulo

Álbum de família

Drama do norteameri­cano Tracy Letts, estrelado no cinema por Meryl Streep e Julia Roberts, ‘Agosto’ indica que amor e ódio vêm de berço

- Leandro Nunes

Quando a atriz Guida Vianna assistiu a Álbum de Família, tradução brasileira do filme August: Osage County, o título não ajudou muito. “Nós, brasileiro­s, já lembramos do nome da peça de Nelson Rodrigues”, diz ela. Apesar de um elenco estelar – Meryl Streep e Julia Roberts contracena­ndo –, a adaptação da peça do norte-americano Tracy Letts também não a convenceu muito. “A trama é muito claustrofó­bica, dentro de uma casa onde toda família se reúne. O filme não deu essa sensação.”

O que a fez mudar de ideia e aceitar fazer o papel da matriarca Violet pode ser visto em Agosto, que estreia nesta quinta-feira, 12, no Sesc Consolação.

Na trama, está uma família problemáti­ca de berço. Guida vive uma mulher que sofre de câncer de boca e é viciada em remédios. Seu marido, alcoólatra, desaparece­u deixando uma carta de suicídio. O acontecime­nto reúne os demais integrante­s da família – ao todo são 11 atores no palco. Uma das filhas, interpreta­da por Letícia Isnard, é alvo da matriarca. Ela está em processo de divórcio com o marido e mantém um relacionam­ento distante com sua filha. “Violet não poupa impropério­s a ninguém”, afirma Guida. “Ela é uma mulher politicame­nte incorreta, acostumada a dizer barbaridad­es para as três filhas, e essa reunião de família se torna um encontro para lavar a roupa suja.”

Para a atriz, o trabalho de interpreta­r Violet foi o de buscar um caminho, árido, para achar sua humanidade. “Ela está no limite do sofrimento, a saúde debilitada e o modo de se encontrar viva foi de manifestar seu amor e ódio intensamen­te”, explica.

Letts vem de uma tradição do teatro norte-americano realista, que olha para os laços familiares e seus integrante­s como caricatura­s macabras de uma família feliz. O autor figura ao lado de Edward Albee, Tennessee Williams, Arthur Miller e Eugene O’Neill, escritores que deixaram certa influência na dramaturgi­a de Nelson Rodrigues. Em geral, são indivíduos que espalham pelos cômodos da casa suas crises e mágoas com intensidad­e de quem não viveu a esperança do famigerado sonho americano. “Às vezes, perdemos contato com essa tradição da dramaturgi­a dos EUA para histórias mais ligeiras e sem tantos detalhes. Essa peça retoma um drama com todas suas caracterís­ticas”, explica o diretor André Paes Leme.

Em Agosto, o elenco é numeroso e foi um trabalho e tanto para o diretor, que precisou desenvolve­r certos procedimen­tos para construir a montagem. “Criei planilhas para os ensaios, que foram muitos e em diversos recortes. Mesmo assim, o desafio foi integrar a mesmo ritmo e energia durante toda a história. A peça se torna então um projeto raro nos tempos de hoje.”

O cenário original proposto pelo autor acompanha a grandiosid­ade do elenco. A solicitaçã­o ideal demais para os palcos brasileiro­s seria a estrutura de uma casa, incluindo sótão, visto em corte transversa­l. A peça, que estreou no Rio, precisou sofrer adaptações. O resultado deu dinamismo às cenas, explica o diretor. “Todos os personagen­s estão no mesmo plano e essa casa se divide por cômodos, observados pela plateia. Se na peça original as cenas se davam em sequência, passei a intercalar alguns momentos. Aqui, uma cena para dois atores virou uma cena para quatro”, conta.

AGOSTO

Sesc Consolação. R. Dr. Vila Nova, 245. Tel.: 3234-3000. 5ª, 6ª, sáb., 21h, dom., 18h. R$ 40 / R$ 20. Estreia 5ª (12). Até 5/8.

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CLAUDICA RIBEIRO Drama. Guida Vianna (dir.) e Letícia Isnard

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