O Estado de S. Paulo

Um preso como outro qualquer

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Lula deve ter as mesmas restrições dos demais detentos.

Ao negar o pedido dos advogados de Lula para que ele pudesse gravar vídeos, dar entrevista­s à imprensa e promover atos políticos dentro da prisão, sob a justificat­iva de que é pré-candidato à Presidênci­a da República, a juíza Carolina Lebbos, da 12.ª Vara de Execuções Penais, nada mais fez do que cumprir as leis em vigor. Os argumentos apresentad­os pela defesa de Lula “não possuem o condão de mitigar as regras de cumpriment­o da pena”, disse ela em seu despacho. Como Lula cumpre pena por corrupção passiva e lavagem de dinheiro e a Lei da Ficha Limpa é clara, proibindo condenado em segunda instância de disputar eleição, a decisão da magistrada era esperada. Ela não surpreende­u nem o ex-presidente, que cumpre pena de 12 anos e um mês na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, nem a cúpula do PT.

Esse revés de Lula, contudo, não significa que ele e o PT tenham sido frustrados em suas expectativ­as. Ao contrário, a decisão da titular da 12.ª Vara de Execuções Penais de Curitiba lhes forneceu mais um argumento para reforçar a narrativa de que o expresiden­te é um preso político e que vem sendo perseguido por procurador­es da República e juízes federais. Também deu aos seus advogados o pretexto para impetrar mais recursos nos tribunais superiores. E como esses recursos certamente pecarão por falta de substrato jurídico, a exemplo do que já ocorreu no pedido de habeas corpus apresentad­o por três deputados petistas no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, já que são poucas as questões de direito que restam ser discutidas, o não acolhiment­o de todos eles é quase certo. No fundo, é o que Lula almeja para, fazendo-se de vítima, continuar ocupando o noticiário dos jornais e televisões, até que possa lançar, na hora escolhida, um candidato de sua confiança.

Desde que se convencera­m de que os advogados de Lula não têm como impedir o Tribunal Superior Eleitoral de declará-lo inelegível, essa é a estratégia das lideranças petistas: introduzir fatores de perturbaçã­o que esvaziem a campanha eleitoral e ofusquem debates responsáve­is entre os demais candidatos, relegando para segundo plano os problemas institucio­nais que podem advir dessa atitude antidemocr­ática.

E assim, com o indisfarçá­vel objetivo de deslegitim­ar a eleição presidenci­al, o PT tenta judicializ­ar ao máximo o processo sucessório. Em outras palavras, causar os maiores problemas políticos possíveis, mediante a banalizaçã­o do direito constituci­onal à ampla defesa e a utilização desproposi­tada das dezenas de recursos judiciais previstos pela legislação processual cível e penal. Trata-se de expediente matreiro para tentar exaurir, desde já, a autoridade do candidato – que não será petista – que sair vitorioso nas urnas, em outubro.

Foi por esse motivo que, expressand­o a indignação do Poder Judiciário contra essa estratégia, a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Laurita Vaz, não mediu palavras quando negou 143 petições padronizad­as de habeas corpus e protocolad­as por volta do mesmo horário, ainda que com assinatura­s diferentes, em favor de Lula. Sobrecarre­gar a já pesada rotina de trabalho dos tribunais com o objetivo de convertê-los em simples balcão de reivindica­ções ideológica­s ou de manifestaç­ões políticas e partidária­s é desprezar a missão constituci­onal da Justiça, disse ela. Abusar do direito de petição é afrontar o Estado de Direito, concluiu.

Os despachos da presidente do STJ e da titular da 12.ª Vara de Execuções Penais de Curitiba não se limitaram a desmontar a estratégia com base na qual o PT vem tentando desmoraliz­ar o processo sucessório. Também ajudaram a deixar claro que Lula é apenas um preso comum, razão pela qual suas possibilid­ades legais de comunicaçã­o com o mundo exterior têm de sofrer, por respeito ao princípio da isonomia, as mesmas restrições aplicadas aos demais integrante­s da população carcerária. É um preso como outro qualquer.

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