Projeto causa debate sobre fundamentos da democracia em Israel
Lei que determina caráter judaico é criticada por ser racista e defendida por garantir direito de existência do país
Um controvertido projeto no Parlamento israelense está provocando um áspero debate sobre os fundamentos da democracia em Israel e sobre o que significa ser israelense, com críticos afirmando que a matéria negará direitos iguais a israelenses não judeus.
Na quinta-feira, o governo chegou perto de aprovar o chamado “projeto do Estado-nação”, destinado a impulsionar o caráter judaico de Israel. Proposto por membros do partido do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, o Likud, e apoiado por grande parte da coalizão de direita do premiê, o projeto explica em uma dezena de pontos a proposta de Israel ser a “pátria nacional do povo judeu”, identificando ainda os símbolos nacionais. O projeto pode ser votado e convertido em lei já na próxima semana.
A base da proposta é semelhante à Declaração de Independência assinada pelos fundadores de Israel, em 1948 – exceto que o documento histórico também assinala os valores democráticos do Estado, dando aos habitantes árabes “igual cidadania e representação em todas as instituições.
Em contraste, o projeto do Estado-nação, que se tornará uma lei com status constitucional, rebaixa a língua do grupo minoritário, o árabe, a um “status especial”, em lugar de considerála uma língua oficial ao lado do hebraico. O árabe é falado por 20% da população de Israel.
O projeto também incluiu uma cláusula problemática, que autoriza a criação de comunidades homogêneas com base em religião e nacionalidade. A Cláusula 7B tem sido condenada como antidemocrática e racista por parlamentares opositores, membros da comunidade árabe e grupos de direitos humanos.
Em carta a Netanyahu, o presidente Reuven Rivlin disse que a lei não é equilibrada e poderia “prejudicar os judeus em todo o mundo e em Israel. Poderia mesmo ser usada como arma por nossos inimigos”.
Falando na tribuna, Yousef Jabareen, membro árabe da Knesset, chamou o projeto de lei de “apartheid”, aludindo ao sistema discriminatório que governou a África do Sul.
Em torno de 75% dos 8,5 milhões de habitantes de Israel são judeus, segundo os últimos dados do Escritório Central de Estatísticas. Muçulmanos e árabes cristãos são mais de 20% da população; outros grupos minoritários não judeus somam 5%. Israel tem ainda populações que são etnicamente etíopes e russas, cujo status judaico às vezes é questionado pelo Estado.
Amir Fuchs, do Israel Democracy Institute, disse que “não existe país no mundo que não preveja o direito de igualdade em sua Constituição”. “Esse direito está contido nos valores mencionados na Declaração de Independência, que vem sendo o documento definitivo que molda o caráter do Estados de Israel pelos últimos 70 anos.” Segundo ele, se o projeto for aprovado, vai se sobrepor a outras leis básicas.
Já Avraham Diskin, professor de ciência política da Universidade Hebraica de Jerusalém, disse que a lei foi pensada para fazer frente a inimigos de Israel, incluindo os palestinos, que “não reconhecem o direito à existência do Estado judaico”.
“Pode haver algumas cláusulas controvertidas, mas se trata de uma lei muito simples, que pessoas com interesses políticos gostam de dizer que é racista porque não acreditam no direito de Israel de existir.”