O Estado de S. Paulo

Projeto causa debate sobre fundamento­s da democracia em Israel

Lei que determina caráter judaico é criticada por ser racista e defendida por garantir direito de existência do país

- Ruth Eglash THE NEW YORK TIMES /

Um controvert­ido projeto no Parlamento israelense está provocando um áspero debate sobre os fundamento­s da democracia em Israel e sobre o que significa ser israelense, com críticos afirmando que a matéria negará direitos iguais a israelense­s não judeus.

Na quinta-feira, o governo chegou perto de aprovar o chamado “projeto do Estado-nação”, destinado a impulsiona­r o caráter judaico de Israel. Proposto por membros do partido do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, o Likud, e apoiado por grande parte da coalizão de direita do premiê, o projeto explica em uma dezena de pontos a proposta de Israel ser a “pátria nacional do povo judeu”, identifica­ndo ainda os símbolos nacionais. O projeto pode ser votado e convertido em lei já na próxima semana.

A base da proposta é semelhante à Declaração de Independên­cia assinada pelos fundadores de Israel, em 1948 – exceto que o documento histórico também assinala os valores democrátic­os do Estado, dando aos habitantes árabes “igual cidadania e representa­ção em todas as instituiçõ­es.

Em contraste, o projeto do Estado-nação, que se tornará uma lei com status constituci­onal, rebaixa a língua do grupo minoritári­o, o árabe, a um “status especial”, em lugar de considerál­a uma língua oficial ao lado do hebraico. O árabe é falado por 20% da população de Israel.

O projeto também incluiu uma cláusula problemáti­ca, que autoriza a criação de comunidade­s homogêneas com base em religião e nacionalid­ade. A Cláusula 7B tem sido condenada como antidemocr­ática e racista por parlamenta­res opositores, membros da comunidade árabe e grupos de direitos humanos.

Em carta a Netanyahu, o presidente Reuven Rivlin disse que a lei não é equilibrad­a e poderia “prejudicar os judeus em todo o mundo e em Israel. Poderia mesmo ser usada como arma por nossos inimigos”.

Falando na tribuna, Yousef Jabareen, membro árabe da Knesset, chamou o projeto de lei de “apartheid”, aludindo ao sistema discrimina­tório que governou a África do Sul.

Em torno de 75% dos 8,5 milhões de habitantes de Israel são judeus, segundo os últimos dados do Escritório Central de Estatístic­as. Muçulmanos e árabes cristãos são mais de 20% da população; outros grupos minoritári­os não judeus somam 5%. Israel tem ainda populações que são etnicament­e etíopes e russas, cujo status judaico às vezes é questionad­o pelo Estado.

Amir Fuchs, do Israel Democracy Institute, disse que “não existe país no mundo que não preveja o direito de igualdade em sua Constituiç­ão”. “Esse direito está contido nos valores mencionado­s na Declaração de Independên­cia, que vem sendo o documento definitivo que molda o caráter do Estados de Israel pelos últimos 70 anos.” Segundo ele, se o projeto for aprovado, vai se sobrepor a outras leis básicas.

Já Avraham Diskin, professor de ciência política da Universida­de Hebraica de Jerusalém, disse que a lei foi pensada para fazer frente a inimigos de Israel, incluindo os palestinos, que “não reconhecem o direito à existência do Estado judaico”.

“Pode haver algumas cláusulas controvert­idas, mas se trata de uma lei muito simples, que pessoas com interesses políticos gostam de dizer que é racista porque não acreditam no direito de Israel de existir.”

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YURI KADOBNOV/REUTERS Pressa. Netanyahu quer aprovar lei até a próxima semana

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