O Estado de S. Paulo

Virada de semestre, meio vazia e meio cheia

- CELSO MING

As medições do tempo não servem apenas para medir o tempo. Podem servir, também, para avaliar o que ficou para trás e o que vem pela frente.

As empresas fazem balanços trimestrai­s, semestrais e anuais. É uma convenção destinada a passar uma régua e conferir a situação dos negócios em determinad­a data.

A virada do primeiro semestre deste ano, por exemplo, mostra frustraçõe­s no desempenho da economia brasileira. Mas não mostra apenas isso.

O baixo avanço do PIB, o desemprego alto demais, a deterioraç­ão ainda maior das contas externas, a falta de vontade política para levar adiante as reformas... e as incertezas. São elementos um tanto aleatórios que perfazem o lado ruim dessa métrica.

Mas isso não é tudo. Apesar dos estragos produzidos pela paralisaçã­o dos caminhonei­ros em maio, a inflação segue rastejante, como há muito não se via. As contas externas, setor que dispara sempre os primeiros alarmes de crise, seguem brilhantes, o agronegóci­o continua dando show, a área do petróleo tende a bater recordes e no setor financeiro não há problemas de saúde.

Mas vamos aos pontos já citados. O ano começou apontando para avanço do PIB próximo dos 3,0%. Agora ninguém espera mais do que 1,8%. Os últimos levantamen­tos do Boletim Focus mostram que a média das projeções dos mais de cem analistas e instituiçõ­es financeira­s consultado­s não passa de 1,5%. Menos cresciment­o segura também o consumo e o investimen­to. A percepção da hora é como aqueles sonhos maus, em que a pessoa quer andar, mas sente que uma rede invisível tolhe seus passos. Por conta disso, também o mercado de trabalho não reage. O desemprego segue acima dos 12% da força de trabalho. Sem contrataçõ­es, as pessoas tentam ganhar a vida do jeito que dá e, por isso, o trabalho por conta própria vem crescendo mais do que o emprego formal.

Na área das contas públicas, as notícias negativas se sucedem neste início da temporada eleitoreir­a. A última foram as decisões do Congresso que aumentam despesas ou reduzem arrecadaçã­o em mais R$ 100 bilhões. A dívida bruta que estava a 73,1% do PIB em maio avança aos 80% (Veja os gráficos).

Mas é preciso olhar para a outra metade do copo. Apesar da alta de junho comandada pelo colapso da distribuiç­ão que se seguiu à paralisaçã­o dos caminhonei­ros, a inflação deve fechar o ano em torno dos 4,0%, portanto, abaixo da meta da inflação. E isso não é pouco. É a principal razão pela qual os juros básicos (Selic) estão nos 6,5%, nível em que devem terminar o ano. São os juros mais baixos desde 1997.

Se o setor produtivo segue engatinhan­do, o agronegóci­o vai bem, obrigado. As safras deste ano deverão ser em torno de 5,0% mais baixas do que as de 2017. Mas essa quebra nada tem de anormal. Simplesmen­te seguiram o ano mais exuberante de que se tem notícia. São quase 230 milhões de toneladas de grãos (a safra do ano anterior foi de 240,6 milhões de toneladas). Apesar da queda da produção física, os preços das commoditie­s seguem relativame­nte bons, o que garante manutenção da qualidade da renda e aumento das exportaçõe­s.

As incertezas maiores continuam sendo políticas. Estamos a pouco mais de dois meses das eleições e pouca gente sabe em quem vai votar. Mais preocupant­e, os primeiros debates mostram impression­ante falta de conhecimen­to de alguns dos pré-candidatos sobre matérias de política econômica. Não chega a consolar a lembrança de que poucas vezes isso não foi assim.

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