O Estado de S. Paulo

MAIS MULHERES NO COMANDO DE AVIÕES

Avianca forma a 1ª turma só de pilotas do País; mulheres são agora 5% do quadro da aérea

- /LUCIANA DYNIEWICZ

Foi só aos 19 anos que a carioca Gizelle Hashimura descobriu que existiam pilotas de avião. Acostumada, desde pequena, com idas e vindas ao Japão, onde morava com os pais, nunca havia visto uma mulher comandando os aviões em que viajava. Quis trabalhar com aviação e teve de entrar pela única porta que lhe pareceu aberta – a de agente de aeroporto. “Foi aí que eu vi uma mulher comandante passando pelo aeroporto pela primeira vez. Até então, nem sabia que existia.”

Nesta semana, Gizelle, aos 29 anos, formou-se pilota na primeira turma exclusivam­ente feminina da aviação brasileira, em um projeto da Avianca para aumentar a presença de mulheres no comando de aviões. No fim do ano passado, havia 41 mulheres no País com licença para pilotar um avião comercial, ou 0,86% do total dos profission­ais, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Na Avianca, eram 18 antes do projeto “Donas do Ar”, uma referência à personagem Mônica, de Mauricio de Sousa, a “dona da rua” das histórias em quadrinhos. Com a formatura realizada na quarta-feira, esse número saltou para 34.

“Para o homem, é muito claro que ele pode ser piloto. Para a mulher, não é segredo que tem preconceit­o. Quando comecei no aeroclube, era a única mulher. Tudo intimidava, não estava em minha zona de conforto. É mais fácil você seguir profissões estereotip­adas”, diz Gizelle. “Ainda falta muito para ver outras mulheres em cargos ocupados por homens. Essa formatura é um marco, mas deveria ser normal.”

Antes de chegar ao atual cargo, de copilota, Gizelle ainda trabalhou como comissária de bordo por um ano, em uma tentativa de se aproximar do setor. Fez, então, curso para ser pilota e concluiu a carga horária de voo mínima para atuar em companhias de aviação comercial em 2013. “Logo depois, veio a crise. Aí sobrou profission­al no mercado”, diz. Teve de esperar até 2017, quando foi chamada pela Avianca para participar da primeira turma feminina.

A formanda Paula Soffo, de 32 anos, também precisou esperar por uma oportunida­de em uma cabine de pilotos. Antes, teve de trabalhar com prevenção de acidentes aéreos e instrutora de voo. Via dificuldad­e até para entrar em uma empresa de táxi aéreo: “A companhia pensa: se tiver uma mulher, em um deslocamen­to, vou ter de pagar dois quartos no pernoite. Se for homem, posso colocar os dois (piloto e copiloto) no mesmo quarto”.

Além de questões financeira­s como essa, piadas de mau gosto e preconceit­o são questões a ser enfrentada­s diariament­e. Rayanne Sousa, de 28 anos, conta que, recentemen­te, um passageiro entrou no avião, a viu na cabine de pilotagem e, com descrédito, perguntou ao comissário de bordo se ela era pilota. “Existe preconceit­o, sim, e a gente ainda escuta piadas como ‘mulher não pilota nem fogão direito, imagina avião”, afirma a recém-formada.

Antes de iniciar o programa “Donas do Ar”, a Avianca tinha 2% de seu quadro de pilotos formado for mulheres. Hoje, após a formatura, são 5%. A companhia se compromete­u com a ONU Mulheres em aumentar a presença feminina nas cabines de pilotagem em 10% ao ano.

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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO ‘Donas do ar’. Total de pilotas passou de 18 para 34 na aérea

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