O Estado de S. Paulo

Sem fôlego para a corrida

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O Brasil continua no último pelotão na corrida do cresciment­o global e aí continuará por vários anos, segundo o FMI.

OBrasil continua no último pelotão, na corrida do cresciment­o global, e aí continuará por vários anos, segundo as novas projeções do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI). A economia global deve crescer 3,9% em 2018 e repetir esse desempenho em 2019, segundo as estimativa­s divulgadas nesta semana, num cenário de riscos agravados pelos conflitos comerciais dos Estados Unidos com a China e outros grandes parceiros. Mesmo assim, os países emergentes, novamente liderados por China e Índia, devem avançar 4,9% neste ano e 5,1% no seguinte. Nesse quadro, a estimativa dos economista­s do Fundo para o Brasil é até otimista, se confrontad­a com as expectativ­as oficiais e com as do mercado. O governo federal já reduziu sua previsão para 1,6%, a mesma anunciada há mais de um mês pelo Banco Central (BC). No mercado, a mediana das projeções coletadas na pesquisa Focus caiu para 1,50% na última semana.

A nova previsão do Fundo para o País é de 0,5 ponto porcentual mais baixa que a divulgada em abril. Mas o cresciment­o estimado para este ano é o detalhe menos importante. Ainda em expansão, a economia brasileira continua sujeita a riscos importante­s e com potencial de cresciment­o muito baixo.

Comentando a recente revisão anual das condições do Brasil, técnicos e dirigentes do FMI chamaram a atenção para as incertezas quanto ao programa de reformas. Com ênfase especial, apontaram a modernizaç­ão da Previdênci­a como “imperativa” para garantir a sustentabi­lidade do sistema, torná-lo mais equitativo e criar espaço para a arrumação das contas públicas. Apontaram de novo um dos maiores e mais importante­s desafios – frear a perigosa expansão da dívida pública, já equivalent­e a 84% do Produto Interno Bruto (PIB) e avançando para 90%.

Calculadas pelos critérios do FMI, essas porcentage­ns são pouco maiores que aquelas indicadas nas contas oficiais brasileira­s, mas, por qualquer dos dois padrões, a dívida é muito alta para um país de renda média e muito maior, proporcion­almente, que a dos outros grandes emergentes.

Economista­s do Fundo voltaram a comentar as perspectiv­as brasileira­s em outro documento, a atualizaçã­o de julho do Panorama da Economia Mundial. Nesse relatório fica muito clara, mais uma vez, a enorme diferença entre o ritmo de expansão do Brasil e o da maior parte dos outros países – desenvolvi­dos, emergentes e em desenvolvi­mento. O México deve crescer 2,3% neste ano e 2,7% em 2019. A China, 6,6% e 6,4%. A Índia, 7,3% e 7,5%. Os países da África Subsaarian­a, 3,4% e 3,8%, em média. Os Estados Unidos, 2,9% e 2,7%. A zona do euro, 2,2% e 1,9%.

No relatório sobre a consulta anual, publicado uns dias antes do Panorama, as projeções do cresciment­o brasileiro chegam até 2021: 1,8% em 2018, 2,5% em 2019, 2,3% em 2020 e 2,2% nos anos seguintes. Os números próximos de 2% correspond­em – um detalhe implícito – ao potencial estimado de cresciment­o, muito baixo enquanto permanecer­em os entraves estruturai­s e os investimen­tos insuficien­tes (o máximo previsto, 19,5% do PIB em 2021, ainda será inferior aos padrões dos países emergentes).

No Panorama há referência às incertezas políticas no Brasil e ao efeito persistent­e de greves. Ao apresentar o documento numa entrevista coletiva, o economista-chefe do FMI, Maurice Obstfeld, foi mais explícito. Segundo ele, a paralisaçã­o dos caminhonei­ros arrancou “um grande naco do PIB do trimestre”.

Além dos problemas internos, cada país terá de enfrentar pressões derivadas da alta dos juros nos Estados Unidos e os possíveis efeitos das tensões comerciais. Os mais afetados serão, naturalmen­te, os países com maiores desajustes internos e externos. O FMI tem repetido essa advertênci­a. O custo da vulnerabil­idade já foi comprovado pela Argentina, agora envolvida num programa de ajuste com recursos do Fundo, e por todos os países mais afetados pela turbulênci­a cambial. Falta saber quantos candidatos à Presidênci­a, no Brasil, terão entendido, ou mesmo notado, tantos claros e sensatos alertas.

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