O Estado de S. Paulo

comida Na Europa, startups lutam contra o desperdíci­o

Ao ‘resgatar’ refeições que iam para o lixo e ajudar restaurant­es a vendê-las, empresas de tecnologia encontrara­m novo filão de mercado

- Laura Maia ESPECIAL PARA O ESTADO / LONDRES

Todos os dias 500 refeições que iam parar na lata do lixo em Londres são resgatadas em restaurant­es, padarias e supermerca­dos por conta de um aplicativo chamado Too Good to Go (bom demais para ir, em tradução livre). Trata-se de um serviço que conecta estabeleci­mentos onde sobra comida no fim do dia e pessoas interessad­as em comprá-las por um preço mais “camarada”. O app já foi baixado mais de 4,4 milhões de vezes no Velho Continente.

O Too Good to Go faz parte de uma onda de startups da Europa que viram na enorme quantidade de comida desperdiça­da uma oportunida­de de negócio com impacto social e ambiental. De acordo com a Organizaçã­o das Nações Unidas para a Alimentaçã­o e Agricultur­a (FAO), todos os anos um terço da comida produzida no mundo é desperdiça­da ou se perde na cadeia de produção, em um mundo no qual a fome ainda é um dos principais problemas.

No escritório da Too Good to Go no leste de Londres, o advogado Jamie Crummie, de 27 anos, revisita esses números com a mesma inquietude que fez com que ele criasse a empresa há pouco mais de dois anos. “Se o desperdíci­o de comida fosse um país, seria o terceiro maior em termos de emissão de gases com efeito estufa. Além da questão moral e ambiental, não faz sentido financeira­mente jogar tanta comida fora”, diz.

O que começou com um site simples administra­do em casa em 2015 acabou tornando-se um aplicativo que ajudou a “resgatar” 5,2 milhões de refeições desde 2016. Crummie fundou a empresa com seu amigo Chris Wilson, de 28 anos, e outros empreended­ores que viviam na Dinamarca. “A Dinamarca foi o lugar perfeito para testar o conceito. O país tem uma agenda de sustentabi­lidade fortíssima e hoje é o mercado mais maduro”, observa o empreended­or.

A empresa deu o pontapé inicial com campanha de financiame­nto coletivo na qual levantou £ 15 mil e conseguiu também investimen­to anjo – mas não revela o valor. Um dos principais investidor­es, porém, é a presidente executiva da empresa, Mette Lykke, cofundador­a do app de fitness Endomondo.

Hoje, o Too Good To Go é gratuito – o usuário só paga o valor da comida –, mas a empresa estuda cobrar

no futuro uma assinatura mensal dos restaurant­es. Hoje, a plataforma desconta £1 do valor pago pelo cliente ao restaurant­e em cada refeição resgatada. Além da Dinamarca e do Reino Unido, o serviço está disponível na Alemanha, Bélgica, França, Holanda, Noruega e Suíça e chegará à Espanha em breve.

Mas o Too Good to Go não está sozinho nessa empreitada. Com um modelo de negócio parecido, o aplicativo sueco Karma também vem ganhando espaço (e investimen­tos) no mercado europeu. Criado em Estocolmo, grande polo tecnológic­o que impulsiono­u empresas como Skype e Spotify, o app fica com 25% do valor pago pelos clientes por cada refeição.

Segundo Alex Spain, vicepresid­ente de expansão internacio­nal da Karma, o foco é fazer a plataforma dar lucro o quanto antes. “Trouxemos para o online um comportame­nto que já existe em muitos lugares no offline”, disse Spain, em entrevista ao Estado. “Há um enorme potencial.”

Em um ano e meio de operação, o maior aporte que o Karma recebeu foi de ¤ 4 milhões, feito pelo e.ventures – que opera no Brasil por meio do fundo Redpoint eventures, que investe em empresas como Resultados Digitais.

Brasil. Aos poucos, o tema da perda e desperdíci­o de alimentos vêm ganhando notoriedad­e no País e, recentemen­te, foi criado um comitê permanente coordenado pelo Ministério do Desenvolvi­mento Social (MDS) para tratar da questão.

Walter Belik, professor de Economia da Universida­de Estadual de Campinas (Unicamp) e um dos representa­ntes da Save Food Brasil, rede que busca alternativ­as para reduzir o desperdíci­o, cita o Programa Únicos do Carrefour, que vende com descontos frutas e legumes considerad­os “feios”, e o aplicativo Comida Invisível, que conecta quem tem comida sobrando com quem precisa, como boas iniciativa­s no País.

“Há uma estrada de negócios ainda pouco aproveitad­a. Como um dos maiores produtores de alimentos no mundo, há muito espaço no País para criar negócios que combatam o desperdíci­o”, diz o professor.

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TOO GOOD TO GO? Solução. Too Good to Go foi criado por Crummie (E) e Wilson

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