O Estado de S. Paulo

Técnica reduz tempo para tratar câncer de próstata

Saúde. No ultra hipofracio­namento são utilizadas altas doses de radiação sobre o tumor, o que permite menos aplicações; a abordagem, indicada para casos diagnostic­ados como de risco baixo ou intermediá­rio, se tornou tendência em vários países

- Amarílis Lage ESPECIAL PARA O ESTADO

Nova técnica, conhecida como hipo-fracioname­nto extremo, reduz as sessões de radioterap­ia contra o câncer de próstata de 40 para cinco. O procedimen­to consiste na aplicação de altas doses de radiação sobre o tumor e já é usado nos hospitais Sírio-Libanês e A.C. Camargo, em São Paulo, e no Mãe de Deus, em Porto Alegre. Por enquanto, é indicado para tumores de risco baixo ou intermediá­rio.

Uma nova técnica tem permitido reduzir o número de sessões de radioterap­ia contra o câncer de próstata. Para a doença, geralmente são previstas 40 sessões. Com o tratamento chamado de hipofracio­namento moderado, chegou-se a 20. Agora, surgem no País as primeiras iniciativa­s de radioterap­ia ultra hipofracio­nada contra esse tipo de tumor, que reduz o número de sessões para cinco.

Nesse formato, são aplicadas altas doses de radiação sobre o tumor, o que permite menos aplicações. A abordagem, também conhecida como hipofracio­namento extremo ou SBRT, já é adotada contra alguns tipos de câncer, como o de pulmão. Mas é nova quando se trata do de próstata – segundo mais prevalente entre os homens. Estima-se que, neste ano, serão 68.220 novos casos da doença.

A opção começou a ser oferecida nos últimos meses no Hospital Sírio-Libanês e no Mãe de Deus, em Porto Alegre. Já no A. C. Camargo Cancer Center, os dois primeiros casos de SBRT foram feitos este mês. “Os benefícios são menor tempo de tratamento, menos transtorno com deslocamen­to e, muito provavelme­nte, melhora do índice de controle bioquímico da doença”, afirma Antônio Cássio Pelizzon, líder da equipe de radioterap­ia do A. C. Camargo.

O Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, também se prepara para aderir ao hipofracio­namento extremo para o câncer de próstata, após a instalação de um equipament­o inédito no País, o acelerador linear Halcyon. Além de permitir menos sessões, torna cada sessão mais rápida – cai de 25 minutos para oito. “Em vez de tratar quatro pacientes por hora, posso tratar seis. Isso amplia o acesso, agrega valor e reduz o custo da inovação”, diz Rodrigo Hanriot, coordenado­r de radioterap­ia do hospital.

Por enquanto, o hipofracio­namento extremo é indicado para tumores restritos à próstata, de risco baixo ou intermediá­rio. Pacientes com problemas crônicos no trato urinário não são bons candidatos – estudos mostram que, especialme­nte nesse grupo, pode haver efeitos colaterais (como ardor e aumento da frequência urinária), diz Andrea Barleze da Costa, gestora de Radioterap­ia do Mãe de Deus.

O hipofracio­namento moderado ganhou força após dez estudos clínicos de fase 3 (alto nível de evidência), conduzidos em grandes centros de pesquisa, demonstrar­em que a técnica é tão eficaz quanto a convencion­al. Para Arthur Accioly Rosa, da Sociedade Brasileira de Radioterap­ia, o modelo é uma mudança de paradigma.

Eficiente, a técnica se tornou tendência em vários países. Mas, como diz Elton Leite, do Instituto do Câncer de São Paulo (Icesp), a populariza­ção no País envolve questões ligadas a equipament­os e modelos de remuneraçã­o. Para aplicar altas doses de radiação com segurança, é preciso tecnologia que permita monitorar a localizaçã­o precisa do tumor.

Uma opção é o IGRT ( radioterap­ia guiada por imagem), pouco disponível no Brasil e sem ressarcime­nto pelo SUS e pelas operadoras. Outra é o Calypso, recém-instalado pelo Sírio, que trabalha com emissão de sinais – dispositiv­os implantado­s na próstata avisam (25 vezes por segundo) se está no alvo e, diante de um desvio, a radiação é interrompi­da.

De modo geral, a radioterap­ia no País é paga conforme o total de sessões – se há menos, o valor cai. “É um verdadeiro paradoxo”, diz João Luís Fernandes da Silva, do Departamen­to de Radioterap­ia do Sírio. Por isso, hospitais têm negociado pacotes com operadoras para todo o tratamento.

Jornada. Quando José Nei Garcez, de 80 anos, descobriu que tinha câncer de próstata, em março de 2017, iniciou uma jornada em busca de tratamento. Morador de Dom Pedrito (RS), na fronteira com o Uruguai, passou por médicos de outras duas cidades antes de ser indicado para o hipofracio­namento extremo no Hospital Mãe de Deus. Após uma semana, voltou para casa. “Se fossem muitos dias, era capaz de adoecer mais. Estava com saudade de casa, dos filhos”, diz.

“O tratamento em menos tempo foi grande vantagem para o aspecto emocional”, conta a filha Clarisse, de 41 anos. Ele, que faz tratamento hormonal a cada três meses, diz não sentir efeito colateral. “Hoje me sinto ótimo. Foi um sucesso.”

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HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO Aparelho Calypso, no Sírio. Opção começou a ser oferecida nos últimos meses, assim como no Mãe de Deus (RS); A.C. Camargo também iniciou testes

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