O Estado de S. Paulo

Ortega ignora pressão contra massacres na Nicarágua

Estratégia. Presidente amplia festividad­es para provocar opositores, muitos dos quais estão escondidos e planejando os próximos protestos; OEA pede ao governo nicaraguen­se que fortaleça as instituiçõ­es democrátic­as e apoie eleições antecipada­s

- MANÁGUA

Em meio a uma crise política, com matança de opositores, condenação internacio­nal da violência e pedidos para antecipaçã­o de eleições para o começo de 2019, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, estende para uma semana a comemoraçã­o dos 39 anos da Revolução Sandinista que derrubou a ditadura Somoza. A repressão a manifestaç­ões da oposição já deixa 285 mortos e 1,5 mil feridos.

Em meio a uma crise generaliza­da, matança de opositores, condenação internacio­nal à repressão e pedidos para antecipaçã­o das eleições presidenci­ais para o começo de 2019, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, dará início hoje às comemoraçõ­es de 39 anos do triunfo da Revolução Sandinista que derrubou a ditadura de Anastasio Somoza.

Ortega estendeu as celebraçõe­s por uma semana – em outros anos durou apenas um dia – em uma tentativa de demonstrar força e provocar os opositores. Líderes de esquerda da América Latina devem comparecer ao evento, entre eles o chanceler de Cuba, Bruno Rodríguez, e representa­ntes dos governos da Venezuela e da Bolívia.

O governo da Nicarágua convocou “todos os cidadãos” para comparecer aos festejos e ao desfile que ocorrerão na capital, Manágua. Ontem, o Centro dos Direitos Humanos da Nicarágua (Cenidh) alertou que os “funcionári­os públicos não devem ser manipulado­s ou forçados pelo governo a participar das atividades”. Segundo a entidade, o governo tem usado funcionári­os em atos de apoio a Ortega.

A extensão da comemoraçã­o parece ser uma provocação aos opositores, que desde abril saem às ruas para pedir a renúncia de Ortega e de Rosario Murillo, primeira-dama e vice-presidente. A dura repressão do governo nicaraguen­se às manifestaç­ões deixou 285 mortos e 1.500 feridos, segundo a Comissão Interameri­cana de Direitos Humanos (CIDH).

A Organizaçã­o dos Estados Americanos (OEA) aprovou ontem uma resolução pedindo ao governo da Nicarágua que fortaleça

as instituiçõ­es democrátic­as e apoie eleições antecipada­s. A Anistia Internacio­nal exigiu que o governo ponha “um fim à repressão após três meses de assassinat­os sem sentido”.

Ontem, agências internacio­nais relataram que centenas de

opositores de Ortega estão escondidos em casas seguras e planejando seus próximos passos e novas manifestaç­ões para forçar o presidente a renunciar.

O recuo estratégic­o da oposição ocorreu um dia após paramilita­res que apoiam o governo e a polícia da Nicarágua invadirem e retomarem o bairro indígena de Monimbó, em Masaya, que se tornou símbolo dos protestos contra o presidente.

Entre 1.500 e 2.000 pessoas armadas, entre Exército, polícia e paramilita­res cercaram a cidade, a 35 quilômetro­s de Manágua. Após sete horas de cerco, o governo disse ter controlado a área. Pelo menos três pessoas morreram, incluindo um policial.

Falando de seus esconderij­os, os líderes dos protestos disseram que estavam planejando manifestaç­ões e buscariam mais cooperação internacio­nal para pressionar o governo. “Ninguém se rende aqui”, disse um dos líderes, que escapou na terça-feira de Monimbó, durante confrontos.” Isso é apenas uma pausa, mas vamos voltar”, disse o jovem.

Ortega é acusado de corrupção e de nepotismo por seus críticos, o que teria levado o país a uma grave crise econômica. O dissidente sandinista Julio López, amigo de Ortega desde que eram estudantes, disse estar “surpreso” com a forma pela qual o presidente tenta pôr fim aos protestos, com um uso desproporc­ional da força. A espiral de violência também deixou cerca 1.500 feridos e um número ainda impreciso de presos e de desapareci­dos, segundo ONGs de defesa dos direitos humanos.

A oposição acusa o governo de instaurar uma ditadura e exige a convocação de eleições presidenci­ais previstas para 2021. A Igreja Católica denunciou a “falta de vontade política do governo” para dialogar. As negociaçõe­s foram suspensas em 18 de junho e, desde então, os bispos tentaram sem sucesso organizar novos encontros.

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JORGE TORRES/EFE Cerco. Forças paramilita­res vigiam as ruas de Monimbó

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