O Estado de S. Paulo

Celso Ming

- E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM

O problema não é câmbio nem juro. É a baixa competitiv­idade da indústria brasileira.

Ano após ano, dirigentes da área empresaria­l e economista­s protecioni­stas martelavam que, além dos juros altos, a principal causa dos males da indústria brasileira era o “câmbio fora de lugar”.

Queriam dizer com isso que o real excessivam­ente valorizado em moeda estrangeir­a tirava competitiv­idade do setor produtivo, pois barateava em moeda nacional o importado e encarecia em dólares o produto de exportação.

Apenas em 2018, o dólar saltou 15,9% em reais e, no entanto, agora, a indústria se queixa de que a desvaloriz­ação do real, que se pressupunh­a bem-vinda, encareceu insumos, máquinas e peças importadas, aumentou a dívida externa em reais e, assim, passou a tirar competitiv­idade da indústria nacional. Ou seja, na crescente e inevitável integração global, o castigo é com o câmbio valorizado ou com ele desvaloriz­ado.

O problema de fundo não está nem no câmbio nem nos juros. O verdadeiro problema tem nome: baixa competitiv­idade da indústria brasileira. Atinge a todas, tanto as de capital nacional como as de capital estrangeir­o. O automóvel brasileiro, por exemplo, que é produzido por empresas de capital estrangeir­o, dotadas de tecnologia avançada, não tem competitiv­idade externa.

Imaginava-se que a deficiênci­a de competitiv­idade pudesse ser compensada com tarifas aduaneiras altas e com câmbio desvaloriz­ado. É o baixinho querendo altura com sapatos de salto alto.

Não dá para ignorar o que explica boa parte dessa baixa competitiv­idade. É a alta carga tributária; a infraestru­tura precária, cara ou inexistent­e; a baixa qualificaç­ão da mão de obra; os juros altos; e a instabilid­ade das regras de jogo.

Mas isso não é tudo. Ainda que enfrente alguns dos mesmos problemas da indústria, o agronegóci­o dá show. Por que a Embraer é um sucesso e tantas indústrias, até mesmo as modernas, não são?

Uma resposta para essas perguntas está nos vícios que impregnam a administra­ção de negócios no Brasil. É a notória tendência às soluções de curto prazo, o apego ao jogo protecioni­sta, às reservas de mercado, às subvenções, desoneraçõ­es, redução de impostos e as pressões intermináv­eis para o próximo Refis (perdão de impostos).

Os programas provisório­s de favorecime­nto adotados pelo governo se perpetuam. A indústria de veículos tem mais de 70 anos no Brasil e sempre espera novo pacote de bondades. A Zona Franca de Manaus, instalada em 1957, daria viabilidad­e a empresas nascentes, mas depois de 60 anos não consegue deixar de engatinhar ou livrar-se do andador.

Políticas de favorecime­nto produzem enormes distorções. Quando o governo elege setores ou supostos futuros campeões nacionais para receber tratamento diferencia­do, impõe condições concorrenc­iais desiguais que, depois, criam novos pretextos para distribuiç­ão de compensaçõ­es que, em geral, não passam de novos “puxadinhos”.

Essas são algumas das razões pelas quais a indústria do Brasil está sempre cambaleant­e. Qualquer alteração mais relevante dos juros e do câmbio, como agora, é nova rasteira. As mudanças no setor produtivo global, que vêm aí com a tecnologia da indústria 4.0, trazem graves impactos à indústria que não souber andar com as próprias pernas.

 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil