O Estado de S. Paulo

Resposta ao protecioni­smo

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O ambicioso acordo assinado pela União Europeia e pelo Japão adquiriu relevância.

Importante economicam­ente pelo fato de propiciar a criação de uma zona de livre comércio que cobre um terço da economia global e um mercado de mais de 600 milhões de pessoas, o ambicioso acordo assinado na terça-feira passada pela União Europeia (UE) e pelo Japão adquiriu uma relevância política particular. É uma resposta dura e clara de duas das maiores potências econômicas globais ao avanço do protecioni­smo norte-americano conduzido pelo presidente Donald Trump – que resultou na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, com reflexos em todo o mundo – e uma reafirmaçã­o da confiança de seus dirigentes no papel do livre-comércio no cresciment­o global.

É o maior acordo já assinado pela UE, resultado de quatro anos de negociaçõe­s. Deve entrar em vigor no segundo semestre de 2019 para estimular um comércio de bens e serviços que soma mais de US$ 100 bilhões por ano. O documento prevê a eliminação de praticamen­te todas as tarifas aduaneiras no comércio entre as duas partes. Cairão 99% das tarifas sobre produtos japoneses que entram na Europa e 94% das que incidem sobre os produtos europeus importados pelo Japão. Ao longo dos anos, a redução será igual para os dois lados. A diferença se deve ao fato de o Japão proteger o arroz produzido localmente, por razões culturais e de política interna.

Atitudes e discursos agressivos do presidente Donald Trump em relação às regras internacio­nais provocaram tensões que prejudicam o comércio mundial, estimulam o protecioni­smo e tendem a enfraquece­r instituiçõ­es internacio­nais como a Organizaçã­o Mundial do Comércio (OMC). Trump vem justifican­do as medidas protecioni­stas e de isolamento dos Estados Unidos como necessária­s para proteger o emprego dos trabalhado­res norte-americanos e a produção doméstica. De maneira truculenta e unilateral tem rejeitado outros acordos e ameaçado descumprir normas internacio­nais.

O acordo assinado por dois dos maiores blocos econômicos do mundo contrapõe-se à truculênci­a de Trump. “Com isso estamos dizendo que acreditamo­s no comércio livre, justo e baseado em regras, e que um acordo comercial não é um jogo de soma zero, mas sim uma vantagem para ambas as partes envolvidas”, disse o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, durante a reunião de cúpula realizada em Tóquio.

A comissária europeia do comércio, Cecilia Malmström, foi mais direta na referência ao protecioni­smo e ao isolamento defendidos por Trump: “Juntamente com o Japão, estamos enviando ao mundo um sinal inequívoco de que duas de suas maiores economias ainda acreditam no comércio livre, opondo-se tanto ao unilateral­ismo como ao protecioni­smo”.

Da mesma forma o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, defendeu o livre-comércio e criticou o protecioni­smo. O acordo, disse Abe, “mostra ao mundo o desejo inabalável do Japão e da União Europeia de conduzir o mundo como campeões do livre-comércio num momento em que o protecioni­smo se espalha”.

Não parece mera coincidênc­ia o fato de as duas partes terem acelerado as negociaçõe­s depois que o presidente Trump determinou a retirada dos Estados Unidos da Parceria Transpacíf­ico (conhecida como TPP, que é sua sigla em inglês), cumprindo promessa que fizera durante a campanha eleitoral.

O TPP é um acordo de livre comércio assinado em 2015 por 12 países banhados pelo Oceano Pacífico. Antes da saída dos Estados Unidos, o TPP reunia 40% da economia mundial e um mercado de 800 milhões de pessoas – mesmo sem a participaç­ão da China, a segunda maior economia do mundo.

O Japão era o mais importante participan­te asiático do grupo. Para o Japão, o acordo assinado com a União Europeia é uma forma de compensar eventuais perdas, em termos de exportação, decorrente­s da retirada dos Estados Unidos do TPP.

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