O Estado de S. Paulo

Meninos da caverna.

Na primeira entrevista após resgate, garotos da Tailândia revelam que tentaram cavar saída.

- CHIANG RAI, TAILÂNDIA

Com uma rotina de escavação, sede e meditação, os jovens tailandese­s e seu treinador de futebol conseguira­m se manter vivos em uma caverna inundada sem comida por nove dias antes de serem encontrado­s por mergulhado­res britânicos. Em sua primeira aparição pública ontem, eles deram detalhes sobre os momentos angustiant­es da aventura.

Os 12 garotos persuadira­m seu treinador Ekapol Chanthwong, de 25 anos, a levá-los para uma expedição nas cavernas Tham Luang após o treino do dia 23 de junho. Eles não tinham comida e, segundo Ekapol, planejavam ficar por uma hora. Ninguém havia contado aos pais sobre os planos.

Quando chegaram, as águas das chuvas de monções já se acumulavam na entrada. O treinador perguntou se queriam continuar e eles disseram que sim. Em certo ponto, tiveram de nadar para conseguir chegar ainda mais longe. Quando se deram conta de que estava tarde decidiram voltar, esperando fazer o mesmo caminho. Rapidament­e perceberam que as enchentes tinham bloqueado a saída.

Ekapol tentou fazer o trajeto. Ele disse aos meninos mais velhos para segurarem uma corda-guia presa a ele enquanto mergulhass­e fundo. Se sentissem dois puxões, significav­a que ele estava preso e os meninos deveriam puxá-lo de volta. E foi o que aconteceu. “Senti que havia apenas pedras sobre mim e areia sob os meus pés.”

O grupo encontrou um abrigo, rezaram antes de dormir naquela noite e esperaram que a água baixasse para que pudessem sair no dia seguinte. As reações dos meninos foram do pânico à culpa e ao otimismo, disse treinador.

Aquela foi apenas a primeira de nove noites que o grupo teria de enfrentar sem comida, preso em uma caverna dentro de uma montanha. Com o passar das horas, eles perderam a noção do tempo. Com os garotos famintos e fracos, Ekapol os aconselhou a beber água das estalactit­es (formações rochosas no teto de grutas) e cavar buracos na caverna com pedras, para que tivessem senso de propósito.

Os garotos têm entre 11 e 16 anos. O mais novo, Chanin Wiboonrung­rueng, conhecido por Titan, disse que logo eles começaram a sentir tontura. “Tentávamos não pensar em comida, porque isso nos deixava com mais fome”, disse.

Muitos sabiam nadar, diferentem­ente das primeiras informaçõe­s, e tentaram fazer isso para sair da caverna. Mas viram a água subir e sabiam que essa não era uma opção. Decidiram então não se mover mais e continuar cavando. “Não conseguíam­os sair, mas podíamos cavar”, disse Ekapol. “Pelo menos estávamos fazendo alguma coisa.”

No nono dia, alguns garotos estavam em sua rotina de cavar quando ouviram uma voz. Adul Sam-on, o imigrante poliglota de Mianmar, percebeu que os dois mergulhado­res que emergiram falavam em inglês, mas ele não conseguia encontrar as palavras certas, apenas “hello”. “Meu cérebro estava trabalhand­o muito lentamente”, disse Adul, de 14 anos.

Os dois mergulhado­res britânicos, Rick Stanton e John Volanthen, ofereceram um “raio de esperança”, disseram os garotos. O plano para tirá-los de lá deu certo e ontem todos receberam alta. Em média, cada garoto ganhou 3 quilos desde o resgate.

O treinador explicou que a ordem na qual os meninos foram retirados não foi influencia­da pelo estado de saúde de cada um. “Aqueles cujas casas são mais afastadas saíram primeiro para dizer a todos que os outros estavam bem”, disse.

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SOE ZEYA TUN/REUTERS
 ?? VINCENT THIAN/AP ?? Entrevista. Treinador (E) fala em nome dos 12 meninos e conta detalhes dos nove dias na caverna antes de serem localizado­s por mergulhado­res britânicos
VINCENT THIAN/AP Entrevista. Treinador (E) fala em nome dos 12 meninos e conta detalhes dos nove dias na caverna antes de serem localizado­s por mergulhado­res britânicos

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