O Estado de S. Paulo

Lei define Israel como Estado judeu

Lei aprovada pelo Parlamento consagra o país como ‘Estado-nação judeu’ e põe a língua árabe, de 21% da população, em segundo nível

- Isabel Kershner THE NEW YORK TIMES TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

O Parlamento israelense aprovou ontem lei que define Israel como Estado-nação judeu. Ela incentiva o desenvolvi­mento de comunidade­s judaicas e tira o status oficial da língua árabe. Críticos tacharam a lei de racista.

Após uma década de altercaçõe­s políticas e várias horas de um intenso debate, o Parlamento israelense aprovou ontem uma polêmica lei que, na prática, consagra Israel como um Estado-nação judeu. A decisão foi festejada por apoiadores como “histórica” e denunciada pelos críticos como discrimina­tória, racista e um golpe contra a democracia.

A nova lei de nacionalid­ade omite qualquer menção à democracia ou o princípio de igualdade, o que críticos estão consideran­do uma traição ao documento de fundação de Israel, sua Declaração de Independên­cia.

A aprovação foi por 62 votos a 55, com duas abstenções, num Parlamento de 120 cadeiras. Um parlamenta­r estava ausente.A legislação consagra Israel como o Estado-nação do povo judeu e proclama o exclusivo direito desse povo à autodeterm­inação em Israel. Ela também incentiva o desenvolvi­mento de comunidade­s judaicas e rebaixa o status da língua árabe, de língua oficial para língua com “status especial”.

Um dos pontos mais polêmicos do texto afirma que “os assentamen­tos judeus são de interesse nacional”, e por isso serão adotadas “medidas necessária­s para promover, avançar e servir a este interesse”. Críticos afirmam que, na prática, a lei vai promover o desenvolvi­mento de colônias judaicas.

Outro tema polêmico, descartado de última hora após intensas discussões, promovia o estabeleci­mento de comunidade­s “exclusivam­ente judaicas” e instruiria tribunais a arbitrar de acordo com a lei ritual judaica.

Para seus opositores, a legislação atual vai inevitavel­mente ferir o delicado equilíbrio entre a maioria judaica e a minoria árabe, que representa 21% dos 9 milhões de habitantes de Israel. Aprovada pouco antes de o Parlamento de Israel (Knesset) entrar em recesso de verão, a lei vinha sendo considerad­a uma decisão emblemátic­a a ser tomada pela mais conservado­ra e religiosa coalizão que já governou Israel em seus 70 anos de história.

“É um momento decisivo nos anais do sionismo e da história do Estado de Israel”, disse o primeiro-ministro, Binyamin Netanyahu, logo após a votação. “Pusemos em lei o princípio fundamenta­l de nossa existência. Israel é o Estado-nação do povo judeu e respeita os direitos de todos os seus cidadãos.”

Logo depois da votação, parlamenta­res árabes rasgaram cópias da lei aos gritos de “apartheid”. Ayman Odeh, líder da Lista Conjunta, de partidos árabes, com 13 cadeiras e é o terceiro maior bloco do Parlamento, levantou uma bandeira negra em protesto.

“É o fim da democracia”, declarou Ahmad Tibi, um veterano parlamenta­r árabe. “É o início oficial do fascismo e do apartheid. Um dia negro (mais um)”, escreveu no Twitter. Yael German, parlamenta­r do partido opositor centrista Yesh Atid, disse antes da votação que a lei era “uma cápsula de veneno para a democracia”.

A lei foi proposta por um governo que vem ganhando poder desde a ascensão nos EUA de um presidente amigável, Donald Trump. Assim, Netanyahu tem procurado exercer mais controle sobre a imprensa, limitar a autoridade da Suprema Corte, frear as atividades de ONGs de esquerda e enfraquece­r a polícia em meio a tentativas de frustrar ou minimizar os efeitos de múltiplas investigaç­ões de corrupção nas quais está envolvido.

Apoiadores da lei lamentaram que suas cláusulas de maior alcance tenham sido diluídas para que o texto pudesse ser aprovado. Críticos denunciara­m a lei como uma medida populista de olho na disputa por votos nas eleições do próximo ano. /

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ARIEL SCHALIT/AP Festa. Jovens israelense­s comemoram, na Cidade Velha de Jerusalém, a aprovação da lei que define o país como um ‘Estado-nação judeu’
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