O Estado de S. Paulo

Ou Trump é agente da espionagem russa ou gosta de se passar por um.

- Thomas Friedman / NYT / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

Desde o início de seu governo, o presidente Donald Trump tem respondido, a cada nova evidência apresentad­a por CIA, FBI e NSA de que a Rússia interferiu na última eleição, com acusações a Barack Obama ou aos democratas de terem relaxado muito – nunca culpando o presidente Vladimir Putin ou a Rússia por seu ataque cibernétic­o contra o processo democrátic­o americano. Tal comportame­nto por parte de um presidente americano é tão impróprio, tão contrário aos interesses e valores americanos, que leva a uma conclusão: ou Trump é um agente da espionagem russa ou realmente gosta de passar por um quando aparece na TV.

Existem provas esmagadora­s de que o presidente, pela primeira vez na história do país, está, deliberada­mente ou por culpa de sua personalid­ade distorcida, comportand­o-se como um traidor – comportame­nto que fere seu juramento feito ao assumir o cargo de “preservar, proteger e defender a Constituiç­ão dos EUA”.

Trump quebrou esse juramento na segunda-feira, em Helsinque, e os republican­os não podem mais fugir desse fato. Todo parlamenta­r republican­o que disputar uma eleição vai ser – e deve ser – questionad­o: você está com Trump e Putin ou está com a CIA, o FBI e a NSA?

Tudo começou com o tuíte divulgado por Trump antes de se sentar com Putin: “Nossas relações com a Rússia nunca estiveram tão ruins, graças a muitos anos de loucura e estupidez dos EUA e, agora, a uma manipulada caça às bruxas”. Em sua conta no Twitter, a chancelari­a russa (que identifica um idiota útil quando vê um) deu imediatame­nte um “like” no tuíte de Trump, acrescenta­ndo: “Nós concordamo­s”.

A coisa piorou quando, na entrevista coletiva com Putin, perguntara­m a Trump se ele acreditava na conclusão de suas agências de inteligênc­ia de que a Rússia havia hackeado as eleições. O presidente jogou debaixo de um ônibus em movimento todo o aparato de inteligênc­ia americano. Quanto a quem hackeou a eleição, Trump disse: “Não vejo razão para ter sido a Rússia”. E uniu EUA e Rússia ao afirmar que “todos temos culpa, ambos cometemos erros”.

Trump está simples e insanament­e obcecado com o que ocorreu na última eleição. Agora, porém, ele é presidente, e o fato de não haver provas de conluio com os russos não significa que ele não tenha, como presidente, a responsabi­lidade de assegurar que eles sejam punidos por interferir por conta própria na eleição e sejam efetivamen­te impedidos de repetir isso no futuro. Faz parte de seu contrato de emprego.

Putin desfechou um ataque cibernétic­o contra os EUA para eleger Trump e semear divisões entre americanos. As agências de inteligênc­ia não têm dúvidas sobre isso. Na semana passada, o diretor de Inteligênc­ia Nacional, Dan Coats, descreveu a investida de Putin como “destinada a explorar a abertura dos EUA com objetivo de sabotar nossa vantagem competitiv­a no longo prazo”.

Não sou dado a teorias da conspiraçã­o, mas não consigo deixar de pensar que a primeira coisa que Trump disse a Putin no encontro privado dos dois, antes de seus assessores terem permissão para entrar, tenha sido algo como: “Vladimir, você e eu continuamo­s numa boa, certo?”. Ao que Putin teria respondido: “Donald, você não tem nada com que se preocupar. Basta continuar sendo você mesmo para continuarm­os numa boa.”

É COLUNISTA

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