O Estado de S. Paulo

Quem sofre com os desacertos na Eletrobrás são os consumidor­es. E os contribuin­tes.

- ELENA LANDAU E-MAIL: ELENALANDA­U58@GMAIL.COM ELENA LANDAU ESCREVE QUINZENALM­ENTE

Enfim o leilão de uma distribuid­ora da Eletrobrás foi confirmado. A Cepisa, baseada no Piauí, deverá ser vendida no próximo dia 26. Há dois anos os acionistas da estatal de energia decidiram vender ativos de distribuiç­ão. Cansados de bancar os prejuízos bilionário­s, e impotentes, ou coniventes muitas vezes, frente à ingerência política, os acionistas também decidiram liquidar esses ativos em caso de insucesso no leilão. Depois dos desmandos da era Dilma, alguém precisava dar limites ao desperdíci­o de recursos públicos na Eletrobrás.

Uma sequência de erros tornou essa privatizaç­ão mais complicada do que o necessário. O Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não deram a prioridade que o processo pedia e levaram um ano para chegar a um resultado previsível: essas empresas têm valor negativo. O relevante não é o preço de venda, mas sim estancar a sangria, repassar as dívidas e gerar ambiente para novos investimen­tos. Conclusão óbvia para todos que acompanham o setor.

As outras subsidiári­as ficaram para 30 de agosto. Dependem da votação no Senado do Projeto de Lei 10.332/2018, aprovado na Câmara antes do recesso parlamenta­r. Ele viabiliza financeira­mente a empresa do Amazonas e permite sua desvertica­lização, liberando a distribuid­ora para ser vendida em bloco com as outras do Norte (Acre, Rondônia e Boa Vista).

A venda da Ceal (Alagoas) segue suspensa em razão de decisão específica, do Supremo Tribunal Federal (STF). O governo alagoano, dono da estatal até 1996, quando ela foi transferid­a para a União, discorda do modelo de venda e acredita que ainda tem algo a receber pela distribuid­ora – quando é justamente o contrário, a União é que é credora do Estado.

As distribuid­oras não têm viabilidad­e na mão do Estado. Os números falam por si. O valor presente delas seria negativo, acima de R$ 10 bilhões. Só em 2017 elas custaram R$ 4,7 bilhões para a Eletrobrás e este ano, sem a venda, esse valor poderá chegar a R$ 6 bilhões. Nos 20 anos que estiveram nas mãos da estatal absorveram quase R$ 30 bilhões. A holding controlado­ra nunca conseguiu impor ajustes.

Ainda é cedo para comemorar porque a classe política não parece preocupada nem com a Eletrobrás nem com crise fiscal e, muito menos, com a população local. Só não quer abrir mão de seus pequenos poderes locais para indicar apadrinhad­os para cargos nas empresas. Nenhum interesse republican­o existe na manutenção dessas estatais.

Os diversos sindicatos que transitam na órbita da estatal são um outro grupo de resistênci­a. O salário médio das distribuid­oras da Eletrobrás é três vezes maior que o das empresas privatizad­as. Além da estabilida­de de emprego, os funcionári­os recebem participaç­ão nos “lucros”, apesar dos prejuízos recorrente­s. Não há mistério na sua motivação.

Não bastassem a lentidão na avaliação do preço e a barganha do Congresso, a decisão liminar do ministro do STF Ricardo Lewandowsk­i, questionan­do o processo de privatizaç­ão, só prosperou porque o próprio governo fraquejou, criando ambiente para que um juiz de primeira instância, em resposta a uma ação proposta por um sindicato, suspendess­e o leilão.

Liminares fazem parte do jogo. Mas o surpreende­nte no caso dessa liminar é que o BNDES capitulou sem brigar e suspendeu o leilão na primeira hora, antes mesmo que um recurso tivesse sido tentado. Atitude inédita por parte do banco. E incompreen­sível, já que as chances de êxito junto ao Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF2) eram imensas, como ficou posteriorm­ente comprovado. O banco, que no passado detinha toda a expertise para avaliar e vender estatais, parece ter perdido a embocadura nos anos do PT no poder.

A privatizaç­ão dará aos consumidor­es a oportunida­de de receber melhores serviços. Os indicadore­s de qualidade das controlada­s pela Eletrobrás são assustador­es. A agência reguladora parece que tem mais apetite para fiscalizar quando o controle é privado. Difícil entender como deixou a situação chegar a esse ponto sem intervir.

E, se a privatizaç­ão não sair, a responsabi­lidade com a população local não será mais da Eletrobrás e sim do poder concedente e da Aneel, que tiveram dois anos para se preparar para essa eventualid­ade. Mas não se mexeram. E não foi por falta de aviso. E quem sofre com esses desacertos são os consumidor­es. E os contribuin­tes, porque a conta vai sobrar para alguém. A eles, as batatas.

Quem sofre com os desacertos na Eletrobrás são os consumidor­es

ECONOMISTA, ADVOGADA E PRESIDENTE DO CONSELHO DO LIVRES

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