O Estado de S. Paulo

Distorções da política artificial do óleo diesel

- CELSO MING

Em política econômica, artificial­idades cobram seu preço. Raramente a conta demora a chegar. A intervençã­o canhestra do governo nos preços dos combustíve­is, imposta em maio no calor da paralisaçã­o dos caminhonei­ros, vai produzindo distorções e mais incertezas.

A decisão mais importante foi a de estabiliza­r preços até 31 de dezembro, com redução de R$ 0,46 por litro de óleo diesel nos postos de reabasteci­mento.

Para viabilizar a operação, o governo aceitou pagar um subsídio de R$ 9,5 bilhões para a Petrobrás e para as importador­as. Mas, até agora, a redução dos preços no varejo não passou de R$ 0,21 por litro, conforme consta de levantamen­to feito na primeira semana de julho pela Agência Nacional do Petróleo.

As razões pelas quais a redução de preços pretendida foi insatisfat­ória são mais ou menos conhecidas. Uma delas foi a de que os cálculos prévios do governo para definir o desconto ignoraram a adição de biodiesel, produto derivado do óleo de soja, sempre mais caro. E outra, a de que não há instituiçã­o do governo capaz de fiscalizar em todo o vasto território nacional o cumpriment­o dessas determinaç­ões voluntaris­tas e de punir eventuais desvios.

Foi produzida, ainda, outra distorção. Como nesta quinta-feira observou o diretor do Centro Brasileiro de Infraestru­tura Adriano Pires, se o governo não tivesse se metido artificial­mente no mercado, os preços nos postos de combustíve­l hoje estariam bem mais baixos, porque as cotações internacio­nais do petróleo caíram da altura dos US$ 80 por barril registrado­s nos dias da greve aos US$ 72,58 de ontem.

Ou seja, a estabiliza­ção dos preços em nome da previsibil­idade impediu a prática de preços mais favoráveis aos caminhonei­ros e ao mercado. Foi ignorado o fato de que petróleo é commodity e, portanto, sujeito não só a períodos de alta, mas também de derrubada dos preços em moeda estrangeir­a.

E tem a tal tabela de fretes, cujas bases foram definidas em medida provisória já aprovada no Congresso, mas sujeita ainda a regulament­ação pela Agência Nacional de Transporte­s Terrestres. Até agora, ninguém conseguiu o que, afinal, é “inconseguí­vel”, elaborar uma tabela que atendesse às condições de mercado. Por isso, qualquer uma que seja editada estará sujeita a contestaçõ­es sem fim.

As condições das estradas e as distâncias não podem ser unificadas em tarifas uniformiza­ntes. Há caminhões demais e carga de menos. A recessão ou o cresciment­o econômico mais baixo do que o esperado também aumentou o desequilíb­rio. E nisso contribuiu a própria paralisaçã­o, que reduziu a produção em maio e junho e, portanto, reduziu o volume de mercadoria­s a transporta­r.

Nessa matéria, a nova bomba pode estourar em alguns meses. O subsídio de R$ 9,5 bilhões cobre apenas o consumo até 31 de dezembro. Depois disso, para onde irão os preços do diesel? Será o momento de mudança de governo, portanto de certa paralisia na tomada de decisões. Em tais condições, os caminhonei­ros voltarão a bloquear o transporte de cargas por todo o Brasil?

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