O Estado de S. Paulo

Apreensão de cocaína em portos é a maior em 10 anos

Segurança. Escondida em contêinere­s ou nos navios, carga de droga tem como destino prioritári­o portos europeus, como o de Antuérpia, na Bélgica. Melhora da inteligênc­ia policial, aumento na produção de entorpecen­tes e avanço do PCC explicam essa alta

- Marco Antônio Carvalho

Neste ano, a PF e a Receita Federal já apreendera­m 13,8 toneladas de cocaína em contêinere­s ou navios nos portos do País, o que dá uma média de 66 quilos por dia – maior volume em dez anos. Só no Porto de Santos, o maior do Brasil, foram encontrada­s 10,1 toneladas da droga, ante 1,4 tonelada registrada em 2015. O número de apreensões também cresceu nos portos do Rio e de Paranaguá, no Paraná.

As apreensões de cocaína em 2018 nos maiores portos do País já são as mais volumosas dos últimos dez anos. Do início de janeiro até anteontem, a Polícia Federal e a Receita Federal flagraram, em média, 66 quilos da droga por dia. O material é achado escondido em contêinere­s ou nos navios, a maioria com destino à Europa – pelo menos 28 operações somaram 13,8 toneladas retiradas de circulação. Durante todo o ano passado, foram 17,6 toneladas de droga apreendida­s nos portos – média de 49 quilos por dia.

Especialis­tas apontam que o aumento nas apreensões, que começou a ser notado a partir de 2016, indica atuação mais qualificad­a das forças policiais, com trabalho de inteligênc­ia, mas também que as facções criminosas, em especial o Primeiro Comando da Capital (PCC), têm atuado com mais intensidad­e para escoar o produto ilegal e manter seu ritmo de cresciment­o.

Das 13,8 toneladas apreendida­s até esta semana, 10,1 toneladas foram encontrada­s no Porto de Santos, o maior do País. Apesar da concentraç­ão em Santos, a localizaçã­o de cocaína nos portos também cresceu em Paranaguá (Paraná) e no Rio. No porto paranaense, as 2,1 toneladas encontrada­s neste ano são a maior quantidade já apreendi- da no local na década. O mesmo vale para a 1,5 tonelada apreendida no porto fluminense.

Ao longo dos anos, as operações no porto paulista têm encontrado os maiores volumes da droga. Enquanto em 2015 os órgãos de segurança haviam flagrado 1,4 tonelada, em 2016 o número passou para 10,6 toneladas. O cresciment­o foi confirmado no ano passado: 12,1 toneladas ao longo dos 12 meses.

Os terminais do litoral paulista movimentam anualmente cerca de 110 milhões de toneladas de mercadoria­s. O grande volume de trânsito é apontado como um dos fatores para o Porto de Santos ser o escolhido por quadrilhas para transporta­r drogas, com o objetivo de ficar menos sujeitas a fiscalizaç­ão.

“É impossível fiscalizar todos os contêinere­s. O que fazemos é montar um perfil de carga suspeita com base em informaçõe­s do exportador, do destino, além de usar imagens de scanner que podem indicar a presença da droga”, disse o auditor fiscal Oswaldo Souza Dias Júnior, chefe da Equipe de Repressão (Eqrep) da Alfândega de Santos.

Fiscal. Ontem, uma equipe da Receita Federal inspeciono­u dois contêinere­s, com base em alertas feitos por analistas do scanner. O raio X mostrava um material com densidade diferente no meio da carga. Em um ambiente monitorado por dezenas de câmeras, um dos funcionári­os do terminal rompeu o lacre e abriu uma das portas para que Dixie, uma pastora alemã de 6 anos, iniciasse a inspeção.

Anteontem, ela já havia se sentado em frente a uma das grandes caixas de metal, sinalizand­o que havia farejado droga. Ao desembarca­r a carga de soja, os inspetores constatara­m que 13 sacas de 50 quilos não carregavam o produto, mas sim cocaína.

Nos poucos minutos que Dixie ficou na frente dos contêinere­s ontem, não houve nenhum indicativo. Ainda assim, metade da carga de cascas de limão desidratad­as exportadas pela Argentina foi retirada para checagem. Com um equipament­o de metal, a funcionári­a da Receita furou várias sacas e confirmou que se tratava do produto indicado na embalagem. Reparou o furo com uma fita e liberou a carga para a exportação.

A droga tem sido destinada, sobretudo, para portos europeus. Neste ano, cocaína foi encontrada em seis oportunida­des em contêinere­s que fariam baldeação ou tinham como destino final o porto da Antuérpia, na Bélgica. A recorrênci­a de casos já fez com que policiais federais belgas viessem a São Paulo, em abril, para discutir estratégia­s de combate ao tráfico com as autoridade­s brasileira­s.

Delegado da Polícia Federal com cinco anos de atuação no Porto de Santos, Ciro Tadeu Morais disse ao Estado que o local é “um funil da droga produzida nos países andinos”. Para ele, é “evidente” a grande participaç­ão de membros do PCC nos crimes cometidos no porto paulista. O delegado destaca a logística oferecida pelo grupo para tentar facilitar o cometiment­o do crime.

“O estivador que vai lá e auxilia na inserção da droga não necessaria­mente é um membro do PCC, mas a pessoa que o cooptou sim. A facção fornece a estrutura para que a droga entre fácil no País e saia para a Europa”, disse.

A Receita Federal estima que em 95% dos casos a técnica usada pelos traficante­s seja a chamada

“rip-off loading”. Sem conhecimen­to do proprietár­io, a carga é desviada para a “contaminaç­ão”, como denominam os fiscais, momento no qual o lacre é rompido ou a estrutura do contêiner é alterada para a inserção da droga.

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Faro de Dixie. Cadela, com funcionári­a da Receita, no Porto de Santos
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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO Santos. Fiscais têm perfil de carga suspeita

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