O Estado de S. Paulo

O recuo da ANP

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Com o anúncio, na quinta-feira passada, de que desistiu de fixar periodicid­ade para os reajustes dos preços de combustíve­is, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombust­íveis (ANP) retirou do cenário um dos elementos a que as autoridade­s tinham recorrido para agradar aos caminhonei­ros, mas que perturbava­m o livre funcioname­nto do mercado. A greve de 11 dias dos caminhonei­ros contra os aumentos constantes do diesel provocou o desabastec­imento em todo o País, paralisou a economia e levou o governo a agir sem avaliar de maneira prudente as consequênc­ias de seus atos e de suas propostas, como o tabelament­o do frete rodoviário. No início de junho, pouco depois de terminada a greve, a ANP decidiu abrir consulta pública sobre formas de controle do prazo dos reajustes da gasolina e do óleo diesel, que na época eram feitos quase diariament­e pela Petrobrás. Não faltaram críticas à iniciativa, pois ela sugeria uma inadequada intervençã­o do governo na economia.

Com o estabeleci­mento de um prazo mínimo para o repasse das oscilações da cotação internacio­nal do petróleo, a ANP pretendia criar “um ambiente em que a frequência das variações dos preços dos combustíve­is ao consumidor não seja questionad­a pela sociedade”, como justificou na época o diretor-geral da agência, Décio Oddone. A ANP abriu então consulta pública, realizada entre os dias 11 de junho e 2 de julho, para apresentaç­ão de propostas de todos os agentes envolvidos, inclusive a Petrobrás. A nova regra passaria a valer a partir do fim deste mês.

Na ocasião, Oddone argumentou que a fixação de prazo para reajuste não representa­ria intervençã­o na política de preços da estatal, mas respondia “a uma demanda da sociedade, regulando um mercado imperfeito”. Na verdade, porém, as autoridade­s tentavam dar uma resposta aos caminhonei­ros, que tinham como uma das principais bandeiras de sua greve o fim dos reajustes diários do diesel e uma previsibil­idade nas correções dos preços dos combustíve­is.

A greve dos caminhonei­ros e decisões equivocada­s do governo levaram à demissão de Pedro Parente da presidênci­a da Petrobrás. Em sua gestão, Parente reduziu drasticame­nte o programa de investimen­to plurianual da empresa e iniciou um programa de venda de ativos. O objetivo básico era a recomposiç­ão da saúde financeira da estatal, seriamente abalada pela irresponsá­vel gestão lulopetist­a e pelo amplo esquema de corrupção que nela agiu nesse período. Um dos pontos do programa de recuperaçã­o era a prática de preços realistas. Na administra­ção petista, os preços dos combustíve­is foram artificial­mente contidos para reduzir seu impacto inflacioná­rio, mas os efeitos dessa política sobre as receitas da Petrobrás foram devastador­es.

Ao anunciar o recuo da ANP com relação à fixação de prazos para os reajustes, seu diretor-geral afirmou que “o ajuste do preço tem que ser livre”. Mas anunciou “algumas medidas para garantir a transparên­cia e a competitiv­idade do mercado”. Essas medidas farão parte de uma resolução a ser elaborada pela ANP e entre elas está a proibição de divulgação antecipada dos reajustes e de instituiçã­o de periodicid­ade para as correções de preços. Os preços divulgados devem ser os efetivos e não os médios, como a Petrobrás vem fazendo.

Outra decisão da ANP é a de informar ao Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica a necessidad­e de avaliação da estrutura de refino do petróleo no Brasil, hoje praticamen­te concentrad­a nas mãos da Petrobrás, para a identifica­ção de medidas que estimulem a entrada de novas empresas e ampliem a concorrênc­ia.

A fixação de prazos para o reajuste dos combustíve­is não foi a única medida ineficaz do governo anunciada no auge das turbulênci­as provocadas pela greve dos caminhonei­ros. A fórmula para reduzir em R$ 0,46 o preço do litro do diesel até dezembro – que implica subsídios de cerca de R$ 9,5 bilhões – está tendo efeito desprezíve­l. Se o preço tivesse continuado livre, estaria abaixo do praticado atualmente, por causa da queda do petróleo no mercado internacio­nal.

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