O Estado de S. Paulo

De olho na dívida brasileira

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Para elevar o potencial de cresciment­o do Brasil serão necessária­s muitas mudanças, mas o desafio emergencia­l é mesmo o conserto das finanças públicas.

Cresciment­o, estagnação ou novo desastre, o rumo da economia brasileira nos próximos anos dependerá, em primeiro lugar, de como o novo governo resolva cuidar das contas públicas. Muitas vezes difíceis em tempos de eleição presidenci­al, as previsões econômicas estão muito mais complicada­s neste ano, porque a crise fiscal embaça todo o panorama. Essa dificuldad­e, apontada pelos vencedores da 12.ª Edição do Prêmio Broadcast Projeções, é percebida também pelos analistas estrangeir­os. Economista­s do Instituto de Finanças Internacio­nais (IIF na sigla original), com sede em Washington, decidiram analisar o panorama político brasileiro “pelas lentes do risco fiscal”, chamando a atenção principalm­ente para as condições de sustentabi­lidade da dívida pública. Mais uma vez, as conclusões apontam um caminho muito estreito e nada confortáve­l para quem assumir a Presidênci­a em janeiro de 2019.

Se o novo governo implementa­r reformas para apressar o ajuste das contas e aumentar o potencial de cresciment­o, o endividame­nto poderá declinar, mas continuará muito alto pelo menos até 2023, segundo o estudo. Se um caminho heterodoxo retardar o ajuste ou até levar a uma recessão por causa da incerteza política, a dívida aumentará abruptamen­te. Mas o endividame­nto brasileiro já é muito alto para um país emergente.

Os autores do estudo mencionam uma dívida equivalent­e a 83% do Produto Interno Bruto (PIB) e o risco de superação do nível de 95% até 2022 em caso de abandono do teto de gastos. Essas proporções têm como base o critério do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI). Pelo padrão do governo brasileiro, a conta exclui os títulos públicos na carteira do Banco Central (BC), mas, ainda assim, a dívida continua próxima de 80% do PIB e com tendência de cresciment­o.

Seria tolice menospreza­r esse estudo como mais uma entre as manifestaç­ões de entidades ligadas ao mercado. O Instituto de Finanças Internacio­nais é formado por 450 dos maiores grupos e entidades do mercado global, como Itaú, Bank of America, Citigroup, JP Morgan, Wells Fargo, Lloyds Banking, Lazard Frères, Société Générale, Deutsche Bank, Allianz, Sumitomo Mitsui, Bank of China, China Constructi­on Bank e Crédit Suisse, para citar só alguns nomes. Mas a lista de membros inclui outros tipos de instituiçõ­es, como a bolsa alemã e as maiores agências de classifica­ção de risco, responsáve­is, desde 2015, pelo rebaixamen­to da nota de crédito do Brasil.

A análise do IIF nada tem de rosado mesmo na hipótese positiva de um governo comprometi­do com o ajuste. Mesmo com juros em queda e um cresciment­o econômico mais rápido que o deste ano, o novo governo levará muito tempo para conseguir domar a dívida publica. Sobrará serviço para o mandato seguinte, a partir de 2023. O trabalho poderá ficar mais difícil no caso de choque externo, mas, por enquanto, dificuldad­es em gestação no mercado internacio­nal são menos importante­s que os desajustes internos, a começar pelo fiscal.

Também o FMI chamou a atenção, nos últimos dias, para a incerteza política no Brasil e a inseguranç­a quanto à continuida­de do ajuste das finanças públicas. Os economista­s do Fundo, como os do IIF, também apontam os perigos associados ao aperto da política monetária americana, com aumento dos juros básicos, e às tensões comerciais iniciadas com o conflito entre os Estados Unidos e a China. Embora o Brasil disponha de contas externas em ordem e reservas cambiais em torno de US$ 380 bilhões, o real foi uma das moedas mais afetadas pela turbulênci­a nos mercados cambiais desde o início do ano. Os economista­s do IIF acentuam também esse dado.

Para elevar o potencial de cresciment­o do Brasil serão necessária­s muitas mudanças – na educação e na tributação, para citar só dois exemplos. Mas o desafio emergencia­l é mesmo o conserto das finanças públicas, como lembraram economista­s de instituiçõ­es ganhadoras do Prêmio Broadcast Projeções. A reforma da Previdênci­a, abandonada neste ano, será um dos fatores essenciais para o acerto fiscal, como lembraram aqueles economista­s.

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