O Estado de S. Paulo

Muito dinheiro, educação ruim

Aumento dos gastos não melhorou a qualidade do ensino.

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Entre 2008 e 2017, a despesa da União com educação teve um aumento real de 91%, informa o estudo Aspectos Fiscais da Educação no Brasil, elaborado pela Secretaria do Tesouro Nacional. “O gasto federal em educação cresceu substancia­lmente nos últimos dez anos, e tal expansão atingiu todas as áreas da educação, sendo mais destacada no ensino superior”, diz o estudo. No entanto, esse impression­ante cresciment­o de gastos dirigidos à educação não propiciou, nem de longe, uma melhora significat­iva da qualidade do ensino. No atual cenário de grave déficit fiscal, as evidências indicam pouca eficácia no uso de um alto volume de recursos públicos, que é cada vez maior, sem que a população veja o retorno desse pesado investimen­to na qualidade da educação pública.

O estudo do Tesouro Nacional esclarece pontos importante­s para um debate maduro sobre educação. Não é correto afirmar, por exemplo, que o País investe pouco em educação. O Brasil gasta com educação pública cerca de 6,0% do Produto Interno Bruto (PIB). Os países da Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE) gastam, em média, 5,5% do PIB. Tido como exemplo em educação, o Chile investe 4,8% do PIB em educação pública.

A conclusão é cristalina: alto e crescente volume de recursos não é sinônimo de qualidade de educação. “Apesar da forte pressão social para a elevação do gasto na área de educação, existem evidências de que a atual baixa qualidade não se deve à insuficiên­cia de recursos”, afirma o estudo, lembrando que “políticas baseadas apenas na ampliação de insumos educaciona­is são, em geral, ineficazes”.

Em 2017, o governo federal gastou R$ 117,2 bilhões em educação, sendo R$ 75,4 bilhões destinados ao ensino superior e R$ 34,6 bilhões à educação básica. Ainda que a União tenha, nos ensinos fundamenta­l e médio, apenas um papel supletivo em relação aos Estados e municípios, é gritante a disparidad­e de volume de recursos, especialme­nte pelo fato de que o principal déficit educaciona­l está no ensino básico.

As classes menos favorecida­s, que mais necessitam de recursos públicos para a educação, recebem menos investimen­tos federais. Entre 2008 e 2017, além das despesas com o Fundo de Financiame­nto Estudantil (Fies), os itens que mais contribuír­am para o aumento de gastos com educação pública foram os Institutos Federais de Educação Tecnológic­a (Ifets) e os Hospitais Universitá­rios, cujos beneficiár­ios diretos são uma restrita parcela da população.

O estudo do Tesouro reconhece que, entre 2008 e 2017, houve um aumento da oferta de vagas na rede pública de ensino, ressaltand­o que a atual dinâmica demográfic­a, com menor taxa de natalidade, conduz a uma redução do número de pessoas em idade escolar. No entanto, o ponto central é que, apesar do aumento das despesas, “a qualidade da educação brasileira ainda é muito precária quando comparada internacio­nalmente”, afirma. Entre 70 países avaliados em 2015 pelo Programa Internacio­nal de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês), o Brasil obteve a 63.ª posição em ciências, a 59.ª em leitura e a 65.ª em matemática. O Vietnã, que investe 5,6% do PIB em educação – porcentual menor, portanto, que o investido pelo Brasil –, obteve a 22.ª posição geral.

Não é apenas a experiênci­a internacio­nal que indica a possibilid­ade de um melhor uso de gastos públicos em educação. O estudo lembra, entre outros casos, o município de Sobral, no Ceará, que obteve a melhor avaliação da rede de ensino municipal em 2015. Sua despesa média por aluno é de R$ 3,09 mil, enquanto a média nacional está em R$ 5 mil.

O aumento dos gastos públicos com educação nos últimos dez anos não levou à melhora da qualidade do ensino. Mas esse aumento fez alargar amplamente outro dado: a quantidade de funcionári­os do Ministério da Educação. Em 2008, havia 189 mil; em 2017, eram 299 mil. É urgente repensar o investimen­to em educação – ele deve aumentar o aprendizad­o dos alunos, e não o número de funcionári­os públicos.

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