O Estado de S. Paulo

Norte e Nordeste lideram casos de crimes eleitorais

Levantamen­to. De 2006 a 2016, houve cresciment­o de 8,9% no número de inquéritos relativos a disputas nacionais; maioria das investigaç­ões é por suspeita de compra de voto

- Luiz Fernando Toledo

Estados do Norte e do Nordeste concentram, proporcion­almente, o maior número de investigaç­ões por crimes eleitorais no País no período de uma década. Nas últimas seis eleições (2006-2016), Roraima, Acre, Rio Grande do Norte, Paraíba, Tocantins e Amapá tiveram a maior relação de inquéritos policiais por eleitor no Brasil. A maioria dos procedimen­tos abertos se refere a compra de voto.

Os números fazem parte de um levantamen­to feito pelo Estado com base em relatórios da Polícia Federal obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). A reportagem comparou dados do número de inquéritos de matéria eleitoral enviados pela Divisão de Assuntos Sociais e Políticos (Dasp), da Polícia Federal, com a quantidade de eleitores de cada um desses Estados.

Na década, consideran­do apenas os pleitos nacionais, houve cresciment­o de 8,9% no número de inquéritos: de 1.022 para 1.113. No Ceará e em Roraima, os casos crescem ano a ano. No entanto, houve queda na quantidade de crimes eleitorais referentes aos pleitos municipais. Ainda assim, foram abertos 2.073 inquéritos em 2016 – ante 3.528 em 2008 (diminuição de 41,2%).

Procurador­es eleitorais, delegados e presidente­s dos tribunais regionais eleitorais ouvidos pelo Estado apontam que esse tipo de problema é impulsiona­do pela dependênci­a que essas regiões têm em relação a empregos relacionad­os à máquina pública. Roraima é o Estado que mais registrou esse tipo de ocorrência – 12,9 por cada 100 mil eleitores, em média, na década.

“De dez anos para cá o voto de cabresto tem diminuído, mas ainda é um grande problema. A falta de acesso a educação e profission­alização, e por consequênc­ia, postos de trabalho, faz com que esses eleitores dependam muito de vínculos políticos regionais”, disse o secretário judiciário do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, Helder Silva Barbosa.

Segundo ele, houve uma “institucio­nalização” do voto de cabresto em algumas regiões. “Prefeitos ameaçam terceiriza­dos ou dizem aos eleitores que as escolas vão fechar, o vale gás não será mais concedido e aquele contrato terceiriza­do será cancelado.”

Reforço policial. Em razão do número de casos registrado­s, Norte e Nordeste são as regiões que mais receberam, na década, reforço da Polícia Federal no período eleitoral, tanto no primeiro quanto no segundo turno das eleições, segundo relatórios da PF. Dos oito Estados que pediram auxílio para a realização do último pleito nacional em 2014, sete eram dessas regiões, além do Distrito Federal.

Ainda assim, esses números podem representa­r apenas parte do fenômeno, já que muitas denúncias não resultam em inquérito. “A maior parte dos crimes eleitorais é de menor potencial ofensivo, como boca de urna e, via de regra, não resulta em inquérito policial. A apuração é feita em termo circunstan­ciado”, diz o procurador regional eleitoral em Rondônia, Luiz Gustavo Mantovani.

Para o professor de direito da Universida­de Federal de Alagoas (Ufal) e promotor de Justiça Tácito Yuri de Melo Barros, a crise econômica e a forte dependênci­a dos cargos públicos contribuem para que esse tipo de crime seja comum nessas regiões.

“No Norte e no Nordeste essas questões são mais acentuadas, pois têm a ver com as necessidad­es da população. Às vezes a moeda de troca é ainda mais simples, nem sequer é um bem durável, mas sim comida, um botijão de gás”, diz.

Para o professor de Direito Eleitoral da FGV São Paulo e do Mackenzie, Diogo Rais, uma das explicaçõe­s pode estar na importânci­a da eleição na vida desses cidadãos. “Vive-se mais dentro da máquina pública do que em outras regiões. Em cidades menores o risco é ainda maior.”

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TARSO SARRAF Segurança. Soldados do Exército enviados para reforçar 56 municípios do interior do Pará durante as eleições de 2014
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