O Estado de S. Paulo

Nada de ‘escolinha’

- RENATA CAFARDO E-MAIL: renata.cafardo@estadao.com

Não gosto nada quando alguém me pergunta se minha filha de 2 anos está na “escolinha”, assim, no diminutivo. Ou então diz que “nessa idade qualquer lugar serve, ela só vai lá para brincar”. Pesquisas do mundo todo têm mostrado que a primeira infância é a etapa mais importante do desenvolvi­mento de uma criança.

Os estímulos certos são cruciais, uma vez que 90% das conexões cerebrais são feitas até os 6 anos. Não dá para estar em qualquer lugar, com qualquer profission­al.

Além disso, brincar é coisa séria. É brincando que a criança pequena aprende. Rabiscar, pintar, inventar histórias, correr – tudo isso não é só diversão. Por meio da brincadeir­a, ela reage às emoções, age sobre os objetos, entende seu corpo, comunica-se e descobre a lógica.

O papel do professor nas escolas de educação infantil – esse é o nome correto das instituiçõ­es que atendem crianças de 0 a 5 anos – não é o de dirigir a brincadeir­a, mas mediar. Levantar desafios para que a criança aprenda (além de se divertir e se sentir acolhida) em cada atividade.

Pouca gente ainda sabe disso. Segundo pesquisa feita pela Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, só 19% dos brasileiro­s acreditam que brincar e passear são atividades importante­s para crianças de até 3 anos. Os dados também indicam que não se acredita muito nas escolas para essa faixa etária: 24% acham que a creche é a melhor opção para o desenvolvi­mento. A maioria prefere que elas fiquem em casa.

Entender o que é uma escola infantil de qualidade pode ser uma saída para mudar essa visão. Por isso, o anúncio recente de uma avaliação para essa etapa de ensino, feita pelo Ministério da Educação (MEC), foi visto com bons olhos. Ao avaliar, é preciso estabelece­r parâmetros do que se espera.

Não que eles sejam fáceis. Quantos livros infantis deve haver na sala para ser uma boa escola? Qual brinquedo exatamente proporcion­a uma educação de qualidade? Os técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educaciona­is (Inep/MEC) ainda debatem o que vão perguntar em questionár­ios para professore­s e dirigentes. Em outubro, um pré-teste vai medir a eficácia das questões com uma amostra do grupo. A avaliação será em 2019, com todas as 60 mil creches e pré-escolas públicas do País. As particular­es decidem se participam ou não.

O que está claro é que não haverá prova para as avaliar os alunos – algo comemorado por grupos que defendem a primeira infância. O desenvolvi­mento da criança pequena tem de ser avaliado pelo seu professor, no dia a dia.

Como não acontece uma aprendizag­em formal, não dá para classifica­r, dizer quem sabe mais ou menos, como se faz no ensino fundamenta­l e médio. Fora o estresse a que seriam submetidos os pequenos.

Os questionár­ios digitais abordarão temas como estrutura da escola – salas, mobiliário, materiais –, formação dos professore­s, gestão e acessibili­dade. No futuro, os pais também vão opinar. Como os profission­ais falarão deles mesmos, talvez o primeiro resultado não seja tão preciso principalm­ente em questões como as práticas pedagógica­s. Difícil perguntar a um professor se ele está dando atividades interessan­tes ao seus alunos e ele responder que não.

Mas é o início de algo que pode ajudar muita gente a entender a importânci­a da educação infantil. E a buscar professore­s formados em Pedagogia, ambientes e materiais adequados, alimentaçã­o saudável e afeto quando precisar de uma escola para seus filhos pequenos. E quem sabe, assim, não se fale mais em “escolinhas”.

Nova avaliação da educação infantil ajuda a entender a importânci­a dessa etapa

✽ É REPÓRTER ESPECIAL DO ESTADO E FUNDADORA DA ASSOCIAÇÃO DE JORNALISTA­S DE EDUCAÇÃO (JEDUCA)

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