O apelo do bem-estar com vista panorâmica
Área de lazer no alto do prédio ainda atrai por ser menos sujeita a sombra de edificações vizinhas; mas também pode ser fonte de problemas
Em regiões densamente povoadas e com escassez de terrenos, incorporadoras aproveitam em seus projetos o topo dos edifícios para implantar áreas de lazer, principalmente em prédios de alto padrão, segundo profissionais do mercado ouvidos pela reportagem.
“Fazer a incorporação é cada vez mais complicado. É uma questão de tamanho de terreno”, diz a gerente da Lello Condomínios, Angélica Arbex. Para ela, não é cabível que empreendimentos novos não tenham uma boa estrutura de lazer e, por isso, o uso da cobertura é a resposta à uma necessidade.
Além de poderem aproveitar os espaços que não poderiam ser implantados no térreo por falta de espaço, os moradores ainda têm visão panorâmica da metrópole. “Todos podem desfrutar da vista privilegiada”, reforça Andrea Bellinazzi, diretora de Inteligência de Mercado da Tegra Incorporadora.
O advogado José Fernando Neto, de 32 anos, conta que a piscina com borda infinita na cobertura foi um diferencial na aquisição de seu imóvel em Pinheiros. “É um chamariz”, afirma o morador, que conta nadar diariamente no local.
Além da visão panorâmica, o lazer na cobertura reduz, por exemplo, a possibilidade de a sombra de outros arranha-céus estragar o banho na piscina. Para o arquiteto Felipe Luciano, o lazer no topo proporciona mais privacidade. “É desconfortável estar na piscina e moradores, inclusive de outros prédios, observando você lá embaixo.”
O arquiteto Pietro Terlizzi ressalta, ainda, um aspecto positivo em relação aos espaços de festas: “Em um salão gourmet ou churrasqueira, há mais facilidade de escoar fumaça”.
O fato de o espaço de lazer estar no alto do prédio não encarece a taxa de condomínio. “O lazer tem um custo, mas se ele está em cima ou embaixo não é o que o torna mais sensível à cota condominial”, diz Angélica, da Lello.
O custo da construção, no entanto, é maior do que um prédio semelhante sem lazer na cobertura, por questões estruturais. É preciso reforçar o esqueleto
do edifício com vigas mais robustas e em maior quantidade, para aguentar a carga. “Áreas ajardinadas ou molhadas, como piscinas, têm um peso bastante significativo”, diz o professor de engenharia civil do Mackenzie, Henrique Dinis.
Reparos. O custo maior é repassado ao futuro comprador no preço do imóvel. “Os bairros escolhidos são os com maior movimentação imobiliária, para que exista um retorno com a venda da unidade”, comenta o arquiteto Felipe Luciano.
A taxa de condomínio, no entanto, também pode ser impactada se houver necessidade de reparos constantes nesses locais.
“Temos de pensar no que estamos entregando aos moradores, no sentido de não entregar um possível problema”, diz o sócio da incorporadora Magik JC, André Czitrom.
O primeiro ponto de atenção que vem à cabeça ao pensar na área de lazer na cobertura são as possíveis infiltrações causadas pela piscina. Para as incorporadoras, no entanto, este não é um problema que tenha a ver com a localização do espaço de convivência no empreendimento.
“A preocupação é a mesma. Normalmente, a piscina fica em uma laje acima da garagem, então, de qualquer forma, não poder haver vazamento”, diz Andrea, da Tegra.
O professor de engenharia civil da Universidade Mackenzie Henrique Dinis não concorda. “Na cobertura, o vazamento é mais grave, porque provavelmente vai causar um prejuízo imenso ao condômino do último andar. Na garagem, é possível se adequar melhor até corrigir o problema.”
A estudante Gabriela Varella, de 23 anos, mora com a família no último andar de um edifício com lazer na cobertura, em Santo André, e entende bem dos danos causados pelas infiltrações, que acontecem em sua casa. “A parede forma bolha, estoura, estraga a tinta e a água começa a escorrer”, lamenta.
Segundo ela, a questão nunca
é resolvida de maneira efetiva, pois o custo de reforma é alto e muitos moradores do prédio se posicionam contra.
O gestor de núcleo gerencial da administradora Graiche, Luiz Tofoli, afirma que, quando essas situações acontecem, cabe à apólice de seguros do condomínio cobrir os danos.
Tecnologia. “Atualmente, temos tecnologia disponível para fazer uma construção que não cause problema para os andares de baixo. A questão é fazer uma boa obra e usar essa tecnologia”, afirma o sócio gestor da incorporadora Idea!Zarvos, Luiz Felipe Carvalho.
Segundo o advogado Leandro Mello, do Braga Nascimento e Zilio Advogados, não é necessário que as construtoras tenham alguma licença específica para construir área de lazer na cobertura, apenas as aprovações de praxe da prefeitura.
Fernando Neto, o comprador do imóvel em Pinheiros, conta que não se preocupa com vazamentos, porque pesquisou o histórico da empresa responsável pela obra antes de adquirir o empreendimento. O arquiteto Luciano aprova a iniciativa do morador e endossa: “Dependendo da construtora, piscina no topo pode ser um tiro no pé”.
Outra preocupação recorrente nesse tipo de imóvel é a logística envolvendo os visitantes. Por isso, algumas empresas implantam, por exemplo, o salão de festas no térreo. “Para que não haja um número grande de não moradores circulando pelas torres do empreendimento”, diz o gerente comercial da Eztec, Tellio Totaro.
Por se tratar de um lugar mais alto, todo o parapeito da área de lazer deve estar resguardado com guarda-corpos seguindo as instruções técnicas do Corpo de Bombeiros, afirma Tofoli.
Entretanto, é comum que o público-alvo desses empreendimentos seja de solteiros ou casais sem filhos. “Os pais não iriam querer que uma criança desacompanhada fosse, por exemplo, andar de bicicleta na cobertura do prédio”, comenta Carvalho.
O tráfego de pessoas indo para a cobertura também pode ser uma dificuldade para os elevadores, que, usualmente nos condomínios residenciais, estão programados para atender os chamados de cima para baixo.
“Quando você tem a área de lazer no topo, o elevador tem que ter uma programação diferente e respeitar quem chama primeiro. É um fluxo diferente”, afirma o diretor da Manager Gestão Condominial, Marcelo Mahtuk.