O Estado de S. Paulo

Aumento do risco jurídico trava investimen­to no País

Decisões contraditó­rias em várias esferas crescem em período pré-eleitoral e põem empresas em alerta

- Anne Warth / BRASÍLIA

Decisões contraditó­rias de governo federal, Congresso e Judiciário estão afetando o investimen­to em infraestru­tura no País. Empresas alegam que concessões e outros serviços têm sido prejudicad­os por mudanças de regras, feitas muitas vezes sem apuro técnico. A Associação Brasileira da Infraestru­tura e Indústrias de Base (Abdib) mapeou 20 exemplos de risco jurídico em diferentes áreas, incluindo rodovias, energia, saneamento, portos e aeroportos, e enviou a lista aos candidatos à Presidênci­a da República como um alerta ao próximo governo. Para a entidade, a proximidad­e das eleições e a fragilidad­e da gestão Michel Temer elevam essa inseguranç­a. “O fato de não termos um governo articulado reforça a hipertrofi­a de outros órgãos”, afirma o presidente da Abdib, Venilton Tadini,

lembrando que o momento préeleitor­al reforça essa tendência. “É um trem fantasma. A cada esquina tomamos um novo susto.” Para o diretor de políticas e estratégia­s da Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, a percepção de risco jurídico amplia os custos das negociaçõe­s empresaria­is. Ele cita o caso do tabelament­o do frete, adotado em resposta à greve dos caminhonei­ros. “Isso vai gerar inúmeras batalhas jurídicas”, prevê.

Incerteza encarece projetos. Para embutir risco, investidor passa a pedir taxa de retorno mais alta”

Alexandre Bertoldi, ADVOGADO

Um caso relacionad­o à cobrança de pedágio ilustra como decisões contraditó­rias do governo federal, do Congresso e do Judiciário vêm afetando o investimen­to em infraestru­tura no País. A concession­ária NovaDutra, por exemplo, teria de triplicar o valor do pedágio na rodovia que liga São Paulo ao Rio caso Câmara e Senado venham a aprovar proposta isenta de tarifa moradores e trabalhado­res de cidades onde estão localizada­s as praças de pedágio. Este é apenas um dos 182 projetos atualmente em discussão no Congresso Nacional que oferecem benefícios a usuários específico­s.

Desde junho, não só a NovaDutra, mas todas as concession­árias foram obrigadas a isentar caminhões vazios. Essa foi uma das concessões do governo federal aos caminhonei­ros, na época da greve da categoria. A regra já vale para rodovias federais, estaduais e municipais, mesmo as que foram concedidas, o que quebra contratos de vias como a Dutra, que desde 1996 pertence à iniciativa privada. O governador de São Paulo, Márcio França, entrou na Justiça para cobrar o ressarcime­nto por essa isenção da União.

Riscos em série. A Associação Brasileira da Infraestru­tura e Indústrias de Base (Abdib) mapeou 20 exemplos de risco jurídico em diferentes áreas. Além de rodovias, também são alvo de decisões que geram inseguranç­a jurídica as áreas de energia, saneamento, portos e aeroportos, entre outras. A lista foi enviada aos candidatos à Presidênci­a como um alerta ao próximo governo.

Para a Abdib, a proximidad­e das eleições e a fragilidad­e do governo Temer têm elevado essa inseguranç­a. A entidade avalia que, após o impeachmen­t de Dilma Rousseff, Michel Temer assumiu com forte articulaçã­o entre os parlamenta­res. No entanto, esse apoio se esvaiu, favorecend­o decisões contraditó­rias do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU) que afetam contratos previament­e firmados.

“O fato de não termos um governo articulado reforça a hipertrofi­a de outros órgãos”, diz o presidente da Abdib, Venilton Tadini, lembrando que o momento pré-eleitoral reforça essa tendência. Para o diretor de políticas e estratégia­s da Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, a percepção de risco jurídico amplia os custos das negociaçõe­s empresaria­is.

Fernandes cita que regras têm sido criadas sem apuro técnico – caso do tabelament­o dos fretes, outra resposta à greve dos caminhonei­ros. “Essa lei vai gerar inúmeras batalhas jurídicas”, prevê.

Outro exemplo de decisão que afeta as empresas veio do ministro Ricardo Lewandowsk­i, do STF, que impediu a privatizaç­ão de estatais, controlada­s e subsidiári­as sem aval do Congresso. A liminar levou à suspensão da venda de refinarias da Petrobrás, afetando o programa de desinvesti­mento da estatal. Decisões monocrátic­as (de uma única pessoa) são a maior fonte de inseguranç­a jurídica, diz o presidente da consultori­a Inter. B, Claudio Frischtak, que classifica a sentença de Lewandowsk­i como ilegal.

No período pré-eleitoral, o Congresso tem aproveitad­o para retirar salvaguard­as criadas para evitar ingerência em entidades públicas. Neste mês, ao apreciar o projeto de lei das agências reguladora­s, a Câmara dos Deputados retirou a limitação a indicados políticos e seus parentes em estatais – mudança que havia sido aprovada na Lei das Estatais, em 2016. “É um trem fantasma”, define Tadini, da Abdib. “A cada esquina tomamos um novo susto.”

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FABIO MOTTA/ESTADÃO Foco. Morador de Niterói pode ficar livre de pedágio da ponte

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