O Estado de S. Paulo

Para o eleitorado fica difícil, quase impossível, identifica­r para onde vai cada candidato.

- Cida Damasco

Paulinho da Força já deu a senha. A convivênci­a do tucano Geraldo Alckmin com seus novos parceiros do Centrão pode ser menos tranquila do que se imaginava. Nem bem foi selada a união entre o PSDB e cinco partidos desse bloco – DEM, PP, PR, PRB e Solidaried­ade – e Paulinho já pôs na mesa a “reivindica­ção” de um sistema de financiame­nto dos sindicatos, para substituir o imposto obrigatóri­o extinto pela reforma trabalhist­a.

Alckmin reagiu à primeira investida, mas logo em seguida recuou, prometeu a criação de uma contribuiç­ão alternativ­a e culpou um assessor pelo mal-entendido. Tratase apenas do primeiro teste para o tucano, no terreno das definições do que realmente importa para a população – ou seja, o que o candidato e seu time pretendem fazer caso cheguem ao poder.

A união com o Centrão garantiu ao tucano tudo aquilo que os partidos buscam nesse momento, ou seja, valiosos minutos a mais no horário eleitoral, milhões a mais na campanha, apoios regionais e perspectiv­a de formação de uma base parlamenta­r para dar partida ao governo. Conquista expressiva, ainda mais consideran­dose que, até pouquíssim­o tempo atrás, muita gente dentro do PSDB continuava atrás de um nome mais atraente para substituir Alckmin.

Tudo se desenrolou como sempre, dentro daquela máxima mais do que pragmática “política é assim mesmo”, que sobrevive apesar de todos os fatos chocantes exibidos nos últimos tempos. Só que, neste ano, com alguns exageros favorecido­s por um cenário de extrema incerteza, a começar pela permanênci­a na cadeia do líder das pesquisas de intenção de votos. O caso emblemátic­o é o do “vice ideal” Josué Gomes da Silva, cacifado pelo PR de Valdemar Costa Neto e patrocinad­o por todo o Centrão, que ensaiou uma parceria com o PT, aproximou-se de Ciro Gomes (PDT) e deve acabar nos braços de Alckmin. Josué foi oferecido como parceiro a qualquer um desses candidatos – que, convenhamo­s, têm afinidade quase zero.

Em nome da tal “governabil­idade”, os partidos fingem discutir mais do que nomes e cargos. E tentam convencer o público de que propostas também têm peso decisivo no balcão de negociaçõe­s. Mas não há a menor dúvida de que “outros fatores” são os determinan­tes e a expectativ­a é de que lá na frente as diferenças se ajeitem – ainda que com o risco de a incompatib­ilidade de gênios se acentuar e acabar causando a separação.

Durante essa fase de namoro entre os candidatos, ficou claro que Ciro não era bem o tipo do Centrão, tanto por suas ideias como por seu estilo explosivo. Mas é sabido que as negociaçõe­s foram interrompi­das menos por isso e muito mais por pressão do governo. Para quem não é iniciado nas artes da política, é difícil entender como se leva adiante – e com desenvoltu­ra – negociação com representa­ntes de pensamento­s muitas vezes inconciliá­veis.

Ciro fala com todas as letras em derrubada do teto de gastos, revogação da reforma trabalhist­a de Temer, reforma da Previdênci­a com base em capitaliza­ção, e suspensão do acordo entre Boeing e Embraer. Alckmin, ao contrário, defende manutenção do teto de gastos, redução do Imposto de Renda para empresas, avanço nas privatizaç­ões, reforma da Previdênci­a sem capitaliza­ção. Com o PSDB, que conhece bem o DEM desde que ele era PFL, a união do Centrão pode até ser menos sujeita a crises, mas também tem lá suas vulnerabil­idades, como mostra a questão do imposto sindical.

No meio desse “casa não casa”, para o eleitorado fica cada vez mais difícil, quase impossível, identifica­r para onde vai cada candidato, caso ele vença as eleições. Mesmo levando-se em conta que é melhor saber antes com quem ele anda, do que depois, com o presidente já instalado no Planalto. Alckmin vai tentando se acomodar na companhia do Blocão enquanto Ciro tenta reconquist­ar seu lugar à esquerda. Mas, no momento, em que ainda há dúvidas sobre o nome do PT que estará na urna eleitoral, quem saiu à frente foi o Centrão, com todas suas contradiçõ­es de posicionam­ento, mas grande consistênc­ia na estratégia de chegar e se manter no poder.

Alckmin se ajeita no Blocão e já enfrenta embate sobre o imposto sindical

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