O Estado de S. Paulo

‘Não gostamos da pecha de empresa com a ficha suja’

Para executiva da estatal, aplicação de regras de conformida­de é mais complexa no setor público

- Beatriz Bulla / SÃO PAULO Anne Warth / BRASÍLIA

É bem mais fácil implementa­r regras de compliance no ambiente privado do que numa empresa estatal. Essa é a avaliação da diretora de conformida­de da Eletrobrás, Lucia Casasanta. Ao assumir o cargo, diz, encontrou uma empresa com o “moral muito baixo”. A seguir, trechos da entrevista.

Qual é a maior mudança realizada no modo de operar da Eletrobrás nesses dois anos? Quando a gestão atual chegou, era um momento de moral muito baixa. Havia uma investigaç­ão independen­te acontecend­o, mas inconclusi­va, e muita incerteza a respeito do envolvimen­to nas questões da Lava Jato. Havia um processo de deslistage­m das ações da Eletrobrás aberto nos Estados Unidos. Conseguimo­s concluir a etapa importante da investigaç­ão, que quantifica­va o impacto financeiro e como a Lava Jato afetava os principais investimen­tos da Eletrobrás. Isso foi quantifica­do, registrado e arquivado na SEC (órgão regulador dos EUA). No mesmo momento, o processo foi suspenso e voltaram a negociar ações lá.

Quais são os desafios para a conformida­de da Eletrobrás? Nesse período, nós atualizamo­s mais de 20 políticas relativas ao compliance, agora temos um novo regulament­o de compras, um canal para denúncias externo unificado. O programa é robusto, mas nunca se está 100%, é uma eterna construção.

Antes, a sra. atuou no setor privado. Qual é a diferença? Numa empresa privada é muito mais fácil, além de menos custoso. A empresa privada depende única e exclusivam­ente da vontade dos donos. A estatal tem também o lado governamen­tal, que é o mais complexo. Chega a ser incomparáv­el. Em empresa privada é uma questão de “quero” ou “não quero”. E o “não quero” define várias outras questões. Por exemplo: a empresa privada pode dizer a um fornecedor que não quer contratá-lo. Na estatal, é preciso dar o direito de concorrênc­ia. A estatal tem um processo mais caro, porque abre direito de concorrênc­ia e precisa exigir e conferir procedimen­tos. Fica mais caro e demorado.

Há risco de perder o que foi conquistad­o na Eletrobrás nos últimos anos?

Eu acho que é um processo que não tem volta. O procedimen­to está consolidad­o.

Uma reportagem do ‘Estadão/Broadcast’ apontava que a influência política na indicação de diretores continua forte. Isso é perigoso para a Eletrobrás? Temos uma política bastante robusta sobre indicação, muito suportada na lei das estatais. Há questões claras sobre ligação com política e se requer níveis de experiênci­a técnica e acadêmica. É feito um processo interno, que passa pela diretoria de conformida­de, com checagem de currículo, por governança e pela comissão de indicação, órgão do conselho de administra­ção da holding com conselheir­os independen­tes. Tivemos casos de indicados que não passaram.

A sra. enfrentou resistênci­as internas às mudanças?

Não se iludam, não gostamos de estar nos jornais, de ter pecha de empresa com ficha suja. Não somos ficha suja. Fomos vítimas (da corrupção) e agora somos um case de sucesso e queremos continuar assim.

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FABIO MOTTA/ESTADÃO Energia. Há dois anos, quando cheogu à Eletrobrás, moral da estatal era baixo, diz Lucia

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