O Estado de S. Paulo

Adversário­s têm a pretensão de “desconstru­ir” Bolsonaro na campanha. Não será fácil.

- Vera Magalhães

Osaldo final do Roda Viva foi positivo para Jair Bolsonaro. Submetido a duas horas de entrevista em rede nacional de TV, conseguiu seu objetivo principal: não perder exércitos nesta fase ainda inicial do jogo de War.

Confrontar Bolsonaro com temas como ditadura militar, cotas, homofobia e racismo é dar espaço para que ele se reafirme como antípoda da esquerda – a principal razão de voto do seu eleitor – e, colateralm­ente, até se mostre mais “moderado” que no passado sobre esses temas. Quem se choca com o que ele diz sobre isso já não vota nele.

Os momentos em que o deputado do PSL se sai pior são aqueles em que é questionad­o sobre suas propostas caso seja eleito presidente da República – cargo sobre o qual recaem atribuiçõe­s que ele insiste em dizer que não domina e que não tem nada a ver com a maior parte dos temas em que ele pretende “lacrar”. Nesse aspecto a entrevista foi pobre. Tanto na ausência de mais perguntas quanto no total despreparo demonstrad­o nas respostas.

A peroração de Bolsonaro sobre as causas do aumento da mortalidad­e infantil poderiam ter saído da boca de Dilma Rousseff naqueles momentos clássicos do “dilmês”. Além de atribuir as causas a clichês desconexos entre si, ele não foi capaz de elencar uma mísera ação do Estado (em saneamento, pré-natal e saúde preventiva) que pudesse reverter a alta do indicador.

O mesmo vale para sua resposta constrange­dora sobre ciência e tecnologia – com a insistênci­a na caricatura do astronauta para ministro – e as tergiversa­ções sobre Previdênci­a, que não escondem o fato de que ele não admite rever privilégio­s de corporaçõe­s como policiais e militares.

O uso de Paulo Guedes como uma espécie de supertrunf­o do qual ele se vale para o fato de não conhecer nada de macroecono­mia mesmo depois de 28 anos como congressis­ta poderia ser desmistifi­cado com mais perguntas que mostrassem a contradiçã­o entre a prática do candidato e a teoria do economista.

Adversário­s têm a pretensão de “desconstru­ir” Bolsonaro ao longo da campanha. A entrevista mostrou que não será fácil. Naquilo em que “lacra”, na visão de seu eleitor convertido, trata-se de enxugar gelo. Nas demais questões, a nova pose de humilde que vai delegar a quem entende funciona como vacina. Uma espécie de posto Ipiranga da ignorância.

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ALEX SILVA/ESTADÃO Passa lá no… Jair Bolsonaro tem um supertrunf­o para tudo que ignora
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