O trauma de uma criança separada
Costa Rica recebeu ao menos 23 mil imigrantes em três meses; parte deles entra clandestinamente por trilhas abertas na floresta
Thiago, de 5 anos, brinca com a mãe, Ana Carolina Fernandes, na Filadélfia, onde hoje moram. Depois de passar 50 dias separado da mãe na fronteira dos EUA, o garoto agora evita contato com outras pessoas e sua brincadeira favorita é revistar e prender “imigrantes” com algemas. “Ele está assim desde que o busquei”, disse Ana Carolina.
Ao menos 23 mil nicaraguenses buscaram refúgio na Costa Rica desde o início da crise política, em abril, quandocomeçaram os protestos contra o presidente Daniel Ortega. Alguns imigrantes entram no país vizinho clandestinamente, por trilhas na selva. Estima-se que milhares tenham viajado para outros países da América Central, como Honduras e El Salvador.
A Agência das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) alertou ontem que a crise no país é séria e o fluxo de imigrantes pode aumentar. “Nos últimos meses, o número de pedidos de refúgio apresentados por nicaraguenses na Costa Rica e outros países aumentou de forma exponencial”, declarou ontem o porta-voz do Acnur, William Spindler, em Genebra. “A Costa Rica recebeu a maioria das solicitações de asilo, mas Panamá, México, Estados Unidos e Espanha também registraram alta, com um avanço significativo em junho.”
Os números regionais não são conhecidos, mas no caso da Costa Rica foram registrados quase 8 mil pedidos de refúgio de cidadãos nicaraguenses desde abril e 15 mil pessoas conseguiram
agendar o registro, já que a capacidade do país foi superada, informou o Acnur. Atualmente, a Costa Rica registra 200 solicitações de refúgio a cada dia, segundo o Acnur.
Muitas pessoas que fogem da Nicarágua são recebidas por algumas das 150 mil famílias nicaraguenses que já estavam na Costa Rica antes da crise, segundo a ONU.
A Costa Rica abriu dois centros de acolhimento, um no norte e outro no sul do país, para lidar com a crise. No total, eles podem acolher 2 mil refugiados.
Um dos pontos mais críticos é a fronteira por terra, na região de Peñas Blancas, entre a cidade de Rivas, na Nicarágua, e Libéria, na Costa Rica. Ali, centenas de nicaraguenses chegam todos os dias para atravessar para o vizinho, muitas vezes sem os documentos necessários.
As filas no local são enormes, e muitos nicaraguenses demoram dias para conseguir um visto. “Parece que todo mundo quer deixar o país por causa da situação terrível, não há nenhuma garantia de nada”, disse ao jornal La Prensa, da Nicarágua, Loyda Rugama, uma mulher de 35 anos. Ela contou ao jornal que pediu asilo ao Canadá, mas enquanto não obtém resposta preferiu fugir para a Costa Rica. “Tenho meus filhos e não quero que nada aconteça comigo e com eles.”
O líder opositor Cristhian Fajardo, de 37 anos, e sua mulher, María Adilia Peralta, de 30 anos, foram presos na semana passada quando tentavam cruzar a fronteira por terra. Fajardo foi acusado dos delitos de crime organizado e terrorismo.