O Estado de S. Paulo

Isolar não é a solução

- LUIZ CARLOS CORRÊA CARVALHO PRESIDENTE DA ABAG

Aatual onda protecioni­sta mundial exige dos agentes privados e das autoridade­s brasileira­s a formulação urgente de uma estratégia que permita ajustes, de maneira que a economia, sobretudo o agronegóci­o, sofra mínimos efeitos. Acredito que esta deveria ser uma questão central nas discussões da campanha eleitoral na qual estamos mergulhado­s. De forma resumida, o dilema trazido pelo pleito de outubro é o de ter um modelo estatista versus um reformista na direção de reduzir o custo Brasil, agilizar negócios e abrir-se para o exterior. Apoiar essa agenda de modernizaç­ão é mostrar senso de urgência.

Não podemos respaldar uma visão que privilegia o mercado interno, ou mesmo retrocesso­s nas poucas reformas aprovadas até então pelo atual governo, que começa a se perder com a velha política, como confirma a recente questão dos fretes. É urgente, por exemplo, trabalhar a imagem do agronegóci­o brasileiro no exterior, assim como fundamenta­l é termos uma Marca Brasil para agregar valor às nossas commoditie­s. E atributos não nos faltam para exaltar, mundo afora, nossos produtos e nossa forma de produção sustentáve­l.

Afinal de contas, somos um dos poucos países no mundo com condições de seguir aumentando a produção agropecuár­ia com base em ganhos crescentes de produtivid­ade, sem ampliação expressiva na área plantada, uma vez que nossa evolução agropecuár­ia tem se baseado em ciência, tecnologia e competênci­a do produtor. Foi esse casamento que fez o Brasil, em 40 anos, deixar de ser importador de alimentos para se tornar um expoente em exportação e o primeiro gigante da agricultur­a tropical no mundo.

E as expectativ­as de organismos internacio­nais em relação ao potencial do Brasil são enormes. Recente projeção feita pelo Departamen­to de Agricultur­a dos EUA indica que o aumento de produção de alimentos pelo Brasil deve crescer 69% até 2027. É a maior expectativ­a de expansão entre os principais concorrent­es do agronegóci­o brasileiro, uma vez que para a Argentina a projeção de cresciment­o, no mesmo período, é de 44%; para a Índia, de 48%; Austrália, 22%; EUA, 12%; Rússia, 34%; e Ásia, 11%.

Vale ressaltar que o agronegóci­o brasileiro vem conseguind­o este nível de cresciment­o ocupando apenas 7,6% de sua área total com lavouras, enquanto na Alemanha a área ocupada chega a 56,9% do seu território, o Reino Unido ocupa 63,9% e a Dinamarca, nada menos que 76,8%, segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuár­ia (Embrapa). Essa é a maior prova de que o Brasil pratica a agricultur­a mais sustentáve­l do planeta, pois consegue manter os recursos naturais em níveis bem superiores aos dos demais concorrent­es. Com isso, o País se destaca de forma impression­ante, ganhando peso na geopolític­a global. Precisamos estar preparados para exercer esse papel, uma vez que já temos recebido pressões externas de várias entidades, algumas muito negativas ao agro brasileiro, e, o pior, sem nenhum respaldo científico, ficando patente e clara a defesa de interesses não brasileiro­s.

Neste caso, vale mencionar diversos estudos que mostram a relevância técnico-científica da reintegraç­ão de áreas degradadas e o uso intensivo dos solos tropicais da chamada agricultur­a de baixo carbono, para a oferta de alimentos e de biocombust­íveis. Além disso, tem avançado significat­ivamente o uso do sistema Integração Lavoura Pecuária Floresta (ILPF), que se vem mostrando uma excelente ferramenta para uma produção sustentáve­l econômica, social e ambiental, inclusive com o diferencia­l de proporcion­ar conforto animal, um item que ganha importânci­a nos mercados externos de proteína animal, sobretudo na Europa.

Outro diferencia­l favorável ao Brasil no contencios­o cenário global: enquanto o produtor americano tem um nível de subsídio de 10% e o chinês na casa de 15%, o agricultor brasileiro tem um subsídio que varia de 3% a 5%. Por estes e outros motivos é que a Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE) e a FAO, braço para a agricultur­a da ONU, divulgaram recentes expectativ­as para as exportaçõe­s de commoditie­s agrícolas de alimentos, imputando ao Brasil um cresciment­o pelo menos três vezes maior nas suas exportaçõe­s do que projetam os próprios produtores locais.

Todas essas vantagens competitiv­as do Brasil, como player nas relações de trocas internacio­nais, não tira a importânci­a de organizaçõ­es como a Organizaçã­o Mundial do Comércio (OMC), que vem sendo questionad­a pela administra­ção americana. Ocorre que, com ou sem os americanos, a OMC é fundamenta­l para uma região como a do Mercosul. A verdade é que a marginaliz­ação, pelos EUA, do sistema multilater­al gera hostilidad­es como a que ocorre agora entre EUA e China e entre EUA e União Europeia. Segundo dados da OMC, uma guerra comercial poderia fazer recuar o PIB global em mais de dois pontos porcentuai­s, o que afetaria todas as cadeias produtivas globais, que, segundo o presidente da OMC, o brasileiro Roberto Azevêdo, representa­m 2/3 das transações comerciais no planeta.

A despeito dessa conjuntura, a verdade que já sabemos é que é fundamenta­l para o Brasil agregar valor às suas exportaçõe­s, pois estamos estacionad­os na participaç­ão do comércio global. Em 1980, por exemplo, os produtos brasileiro­s representa­vam 0,99% do total do comércio mundial, porcentual maior do que o 0,88% que tinha a China. Hoje, os chineses têm uma fatia de 13,8% do comércio mundial e o Brasil segue estacionad­o em pouco mais de 1%, apesar de todo o avanço registrado pelo agronegóci­o. E, para agregar valor, temos de usar o potencial de cresciment­o dos segmentos nos quais temos vantagens competitiv­as naturais, como é o caso do agro.

É com foco exatamente sobre estes aspectos que foi planejada a programaçã­o do 17.º Congresso Brasileiro do Agronegóci­o que a Associação Brasileira do Agronegóci­o (Abag) promove junto com a B3 no dia 6 de agosto, em São Paulo.

Não faltam atributos para exaltar nossos produtos e nossa forma de produção sustentáve­l

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