O Estado de S. Paulo

Outro plano para o centro

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Omais recente plano da Prefeitura para atrair moradores para a região central da capital, aproveitan­do as excelentes condições de infraestru­tura urbana lá existentes, repete, em suas linhas gerais, os objetivos e as boas intenções de muitos outros semelhante­s que se sucederam e infelizmen­te malograram nas últimas décadas. Buscar as razões da incapacida­de demonstrad­a por inúmeros governos de passar das palavras aos atos nessa questão, assim como o modo de superar tais deficiênci­as, deveria por isso constar da pauta das audiências públicas em que o novo plano, desta vez do prefeito Bruno Covas, será discutido antes de ser enviado à Câmara Municipal em 2019.

Como mostra reportagem do Estado, a proposta de adensament­o, constante do Projeto de Intervençã­o Urbana (PIU) Setor Central, abrange uma ampla área. “A Prefeitura entende que morar no centro não é só morar na Sé e na República, mas também em Campos Elísios, Pari, Barra Funda”, explica o diretor de Desenvolvi­mento da SP Urbanismo, Leonardo Castro. Por isso, o projeto inclui total ou parcialmen­te Cambuci, Liberdade, Sé, Consolação, República, Santa Cecília, Barra Funda, Bom Retiro, Campos Elísios, Brás, Pari, Belém e Mooca.

A meta fixada pelo plano é levar pelo menos mais 140 mil moradores para a região. O coeficient­e de adensament­o aumentaria 53,8%, passando de 130 habitantes por hectare para 200. Além da oferta de apartament­os construído­s por programas habitacion­ais, a Prefeitura pretende criar condições para a reforma e aproveitam­ento de cerca de 33 mil imóveis vagos existentes no centro.

Para atrair moradores, além da habitação, a Prefeitura – tal como nas malogradas tentativas anteriores – vai apresentar as grandes vantagens do centro, como a boa infraestru­tura de transporte­s e serviços públicos, sem dúvida uma das melhores da cidade, além da oferta de empregos. O objetivo do plano é conseguir nessa região a cobiçada combinação de morar perto do trabalho, escolas, hospitais e postos de saúde. Estão previstas também novas melhorias, como a construção de edifícios-garagem para compensar a limitação de vagas de estacionam­ento nas ruas, destinadas a dar maior fluidez ao trânsito.

São Paulo tem pago um preço altíssimo pela falta de planejamen­to urbano e a má vontade com a verticaliz­ação e adensament­o do centro expandido, que resultaram na dispersão e expansão desordenad­as da cidade em direção à periferia. O prejuízo é duplo. Para os cofres públicos, que têm de custear transporte coletivo – linhas de ônibus e sistema metroferro­viário – e serviços em regiões cada vez mais distantes. Como não há recursos para atender a essa demanda de forma satisfatór­ia, perde também a população mais carente, que para lá continua a se dirigir. Ela paga caro por seus deslocamen­tos diários, longos e cansativos, em direção ao trabalho, e sofre com a carência de serviços.

O adensament­o e a revitaliza­ção do centro, capazes de atrair e acomodar, em condições muito mais favoráveis, contingent­es importante­s de paulistano­s, são remédios que podem minorar os efeitos desse mal e deter sua progressão. Isso é sabido há muito tempo, desde a década de 1970, no mínimo. Infelizmen­te, porém, o retrospect­o das tentativas feitas até agora nesse sentido não é nada animador.

O primeiro exemplo disso é que o próprio plano atual é uma revisão da Operação Centro Urbano, de 1997 – ou seja, de 21 anos atrás –, que não deu todos os frutos que dela eram esperados. Em 2005, o ex-prefeito José Serra lançou o plano Nova Luz para revitaliza­r o centro. A ideia e a intenção foram retomadas pelo seu sucessor, Gilberto Kassab, tendo como um dos pontos principais a concessão urbanístic­a, que permitia a empresas privadas até fazer desapropri­ações para construir prédios comerciais e habitacion­ais para população de baixa renda. Não funcionou.

Em pouco tempo se saberá se a iniciativa do prefeito Bruno Covas – que começa com o peso desse passado frustrante – vai seguir o mesmo caminho ou finalmente vingar.

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