O Estado de S. Paulo

Falta de experiênci­a é risco para o VAR

Para ele, mesmo com a boa preparação, o pouco contato com o árbitro de vídeo pode atrapalhar o trabalho de seus colegas

- Gonçalo Junior

Sandro Meira Ricci, principal árbitro brasileiro da Copa, revela que quem atua no País recebeu o mesmo treinament­o dado pela Fifa e, por isso, está preparado para usar o árbitro de assistente de vídeo (VAR) que estreia hoje, na Copa do Brasil. Por outro lado, ele mostra preocupaçã­o com o número de câmeras, a precisão da linha de impediment­o e a inexperiên­cia de alguns árbitros em jogos oficiais. Em entrevista exclusiva ao Estado, o árbitro de 43 anos recém-aposentado e cotado para ser o substituto de Arnaldo Cézar Coelho na Rede Globo revela que ficou decepciona­do por não ter apitado a final da Copa. “Fizemos um trabalho para merecer a indicação à final. Ficou a decepção porque queria encerrar a carreira com esse título.”

Qual sua expectativ­a para a estreia do VAR hoje?

Os treinament­os do VAR no Brasil são muito parecidos aos que recebemos na Fifa. Torço para que os resultados sejam também parecidos. A diferença de estrutura pode interferir um pouco, principalm­ente no que diz respeito ao número de câmeras disponívei­s e à precisão da linha de impediment­o, que na Fifa é tridimensi­onal. A questão da falta de experiênci­a em jogos oficiais também pode pesar um pouco. Na Copa, a maioria dos árbitros de vídeo tinha bastante experiênci­a porque eles vinham utilizando essa ferramenta em suas competiçõe­s nacionais.

O que achou do VAR na Copa? A avaliação é muito boa. Nos 64 jogos, o árbitro de vídeo corrigiu 17 decisões equivocada­s do árbitro de campo. É uma quantidade elevada de intervençõ­es, mas o índice de acerto da arbitragem nas decisões capitais superou os 99%, o que é praticamen­te a perfeição.

O que pode melhorar?

É preciso experiment­ar mais vezes o VAR em jogos reais, pois a realidade do jogo apresenta um cenário de pressão bem diferente do treinament­o. O protocolo está bem claro para todos, mas a linha de intervençã­o, ou seja, o conceito de erro claro ainda carece de critérios mais objetivos para que as intervençõ­es sejam mais uniformes. Defendo que as equipes deveriam ter direito a pedir pelo menos um desafio à arbitragem para torná-las protagonis­tas também nesse projeto de VAR, que é excelente.

Quais as diferenças entre atuar na sala de vídeo e no campo? Trabalhei na função de VAR e na de árbitro em várias competiçõe­s da Fifa e admito que a pressão na cabine do VAR, com no máximo dez pessoas, é bem superior à pressão no campo de jogo, com mais de 50 mil. O árbitro de campo tem a seu favor a necessidad­e de tomar uma decisão imediata com apenas um ângulo de visão. Por isso, seus erros são, muitas vezes, compreensí­veis. Já o VAR não pode errar, pois ele tem tempo para poder ver a jogada por vários ângulos.

Qual foi a sua maior dificuldad­e na Copa do Mundo? Certamente o jogo de matamata, entre Rússia e Croácia, foi o mais marcante e emocionant­e por envolver a seleção da casa e ter sido decidido na disputa de pênaltis. Particular­mente, a minha maior dificuldad­e foi lidar com a não designação para a final.

Você tinha expectativ­a de apitar a final da Copa?

Tinha. Acredito que fizemos um trabalho para merecer a indicação à final. Outros também o fizeram e ao final a Fifa tinha que escolher um e optou pelo argentino. Para mim, ficou a decepção. Queria encerrar a carreira com esse título.

O que vai fazer agora? Infelizmen­te não existe, formalment­e, aposentado­ria para árbitro, pois não recebemos nenhum benefício quando encerramos a carreira. Decidi pendurar o apito porque acredito que meu ciclo de árbitro de campo se encerrou. O processo de preparação para um Mundial dura três anos e exige muita dedicação. Deixei de lado muita coisa para participar de duas Copas. Agora quero me dedicar mais à minha carreira de servidor público e, quem sabe, a algo relacionad­o ao futebol, mas sem abdicar da convivênci­a com minha futura esposa, filhas, pais e amigos.

 ?? MATTHEW CHILDS/REUTERS-16/6/2018 ?? Frustração. Sandro Meira lamenta não ter apitado a final do Mundial
MATTHEW CHILDS/REUTERS-16/6/2018 Frustração. Sandro Meira lamenta não ter apitado a final do Mundial

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