O Estado de S. Paulo

Elena Landau

A função da agência reguladora não é definir preços, mas estimular a concorrênc­ia.

- ELENA LANDAU E-MAIL: ELENALANDA­U58@GMAIL.COM ELENA LANDAU ESCREVE QUINZENALM­ENTE ECONOMISTA E ADVOGADA

Greve dos caminhonei­ros, aumento das tarifas de energia, novas regras para planos de saúde, spreads bancários elevados trouxeram a discussão sobre regulação para o centro do debate econômico. São setores muito distintos, mas os dilemas regulatóri­os são parecidos: como desenhar a melhor forma do mercado em que atuam para gerar eficiência.

Como a importânci­a da regulação só vem à tona quando preços administra­dos sobem mais que a inflação, o debate invariavel­mente se divide entre mais intervenci­onismo ou mais concorrênc­ia. No curto prazo, o controle de preços sempre dá rendimento­s políticos. Mas os efeitos ao longo do tempo são negativos e duradouros. Apesar de incontávei­s episódios desastroso­s de tabelament­o e intervençã­o, a tentação é sempre grande.

O fundamenta­l é dar ao consumidor liberdade de escolha e, assim, eliminar de vez a tutela do Estado, que está na raiz da intervençã­o. Para isso deve-se dar total transparên­cia e usar termos acessíveis nas explicaçõe­s dos motivos de reajustes. Em geral, as notas técnicas das agências reguladora­s são ininteligí­veis para o público.

No caso de energia elétrica, as distribuid­oras são, na maioria dos casos, meras repassador­as de elevação de custos que não estão sob seu controle, como aumento dos encargos ou do custo de geração de energia. Em consequênc­ia, reajustes na conta de luz não seguem necessaria­mente a inflação. Com o impacto das mudanças climáticas, o custo da energia deverá ser crescente e o papel das agências é deixar isso claro à sociedade e, ao mesmo tempo, criar incentivos e campanhas para o uso eficiente de energia.

As decisões do regulador precisam considerar múltiplos interesses: o dos usuários, o das empresas prestadora­s e o do Estado, que delegou esses serviços à iniciativa privada. Com frequência, as agências são confundida­s com serviços de proteção ao consumidor, por elas próprias ou pela sociedade, ao focar principalm­ente na definição de preços e tarifas, deixando muitas vezes o bom funcioname­nto do setor como objetivo secundário. Mas a tarefa mais importante e mais complexa do regulador é criar condições para um ambiente competitiv­o, estimuland­o a eficiência.

O melhor caminho para obter melhores serviços e produtos de maior qualidade ao menor custo possível é a concorrênc­ia. A entrada de novos participan­tes deve ser estimulada. Nacionais e estrangeir­os. O Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo, com uma legislação que, se não impede, cria obstáculos para a participaç­ão de capital estrangeir­o, limitando o número de ofertantes potenciais. Isso deve mudar para beneficiar a sociedade.

Onde a competição não é possível, como nos monopólios naturais, a regulação ocorre através de contrato de concessão que define direitos e deveres do prestador, estabelece­ndo metas de qualidade e regras de ajuste tarifário.

A intervençã­o nos preços é sempre a solução pior. Ela gera inseguranç­a jurídica e regulatóri­a, criando riscos ao negócio que afastam potenciais investidor­es. Exemplo importante é o debate sobre venda das refinarias que entrou em voga após a greve dos caminhonei­ros. Bom lembrar que não há impediment­o para o desinvesti­mento da Petrobrás nesse segmento. O que existe é um monopólio de fato, e não legal, decorrente da falta de interesse de investidor­es por um setor marcado pela ingerência política nos preços.

A solução do governo para atender às demandas dos grevistas trouxe de volta o fantasma da intervençã­o, que parecia ter ficado no passado. E até a Agência Nacional do Petróleo (ANP) caiu nessa armadilha e resolveu lançar uma consulta pública para estabelece­r uma política de reajustes. Mais um exemplo de sinais trocados.

A função da agência reguladora não é definir preços de bens em setores potencialm­ente competitiv­os, mas sim estimular concorrênc­ia. E no final das contas, se a antiga política de reajustes tivesse sido mantida, o preço do diesel estaria menor. Um total desperdíci­o de recursos públicos com subsídios desnecessá­rios.

Tabelar preços não ajuda ninguém. É uma ilusão passageira. Exemplos de fracasso na nossa história não faltam. Do Plano Cruzado à intervençã­o de Dilma nos preços de energia. Quando preços se libertam das amarras, a vingança é terrível.

A função da agência reguladora não é definir preços, mas sim estimular a concorrênc­ia

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil