O Estado de S. Paulo

‘O que aconteceu comigo é inadmissív­el’

Indignada. A francesa Marie Laguerre, que foi agredida após assédio

- / A.N.

• Você foi alvo de uma agressão por reagir a assédio de rua. O que a motivou a publicar o vídeo? Quando postei o vídeo, não esperava essa difusão. Foi uma surpresa. Mas o combate contra a violência e o assédio de rua é um combate que eu travo todos os dias. Sobre a repercussã­o, eu não vejo TV. As mensagens privadas que recebi muitas vezes foram muito agressivas. Evitei ler os comentário­s em redes sociais, para me proteger. Vi apenas alguns e muitos são horríveis. Mas as mensagens de apoio foram muito mais numerosas.

• Com a repercussã­o, você decidiu criar um site para recolher testemunho­s de outras mulheres vítimas de assédio. Por quê? Tive a oportunida­de de falar em muitos veículos de mídia e isso me deu outra oportunida­de, a de reunir uma equipe de feministas que compartilh­a os mesmos valores que eu. Como eu não queria que essa atenção e a reação das pessoas acabasse de um dia para o outro, tentamos fazer alguma coisa para mudar comportame­ntos. Então decidimos criar o site (noustoutes­harcelemen­t.fr) para publicar testemunho­s. O site vai dar voz às mulheres, que podem falar de forma anônima. Também teremos uma página no Facebook para ampliar a repercussã­o. O que aconteceu comigo é inadmissív­el.

• Que tipo de reações houve? Em poucas horas, recebemos mais de 400 mensagens. As mensagens privadas que recebi foram enviadas por mulheres que foram agredidas e ainda sentem as sequelas. Recebi um testemunho de uma mulher que fez queixa à polícia contra seu marido violento e nada ocorreu. Como isso pode acontecer? Uma delas me disse que foi alvo de assédio de um de seus amigos e, quando prestou queixa, foi recriminad­a por seu grupo de amigos. Ou seja, sua palavra não foi levada em conta, mesmo que fosse a vítima. Uma amiga brasileira me contou três dias atrás o estupro que sofreu. Sei que no Brasil o problema da violência sexual e do assédio de rua existe e é preciso enfrentá-lo.

• O Parlamento aprovou uma lei que cria multas para o assédio de rua. Qual sua opinião?

A lei que foi votada tem coisas positivas, mas não é suficiente e talvez seja até um fracasso. Me parece errado que o ultraje sexista deixe de ser um delito e passe a ser alvo de uma multa. Para que ela fosse efetiva, seriam necessário­s policiais em todas as esquinas, o que não é realista. É necessário fazer evoluir a mentalidad­e dos cidadãos, das forças de ordem, do corpo judiciário, do corpo médico, e todos os profission­ais em torno de um caso de assédio.

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ALAIN JOCARD/AFP Marie Laguerre, estudante francesa agredida após assédio de rua flagrado em vídeo em Paris

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