O Estado de S. Paulo

O Grupo Corpo na sincronia entre tempos

Companhia abre hoje a Temporada Alfa de Dança 2018 com ‘21’ e ‘Gira’, que promovem diálogo entre tradições da cultura popular e religiosid­ade

- Fernanda Perniciott­i ESPECIAL PARA O ESTADO

Chegou agosto e a tradição se mantém: o Grupo Corpo abre, desta sexta, 3, até o dia 12, a temporada de dança do Teatro Alfa, que completa 20 anos. E vale pensar no programa escolhido por Paulo Pederneira­s, fundador e diretor da companhia mineira, que, desta vez, juntou 21 (1992) com Gira (2017), aproximand­o os 25 anos que separam a criação das duas obras.

Em 21, dançada pela última vez em 2008, a matemática coreográfi­ca é tecida junto à música, criada exclusivam­ente, assinada por Marco Antônio Guimarães, inventor do grupo instrument­al Uakti. Marco Antônio, que foi aluno do mestre Walter Smetak, um suíço que construía instrument­os a partir de matérias-primas da natureza.

A opção de encomendar uma trilha exclusiva para as coreografi­as começa junto com o início da companhia, em Maria Maria (1976) e Último Trem (1980), ambas de Milton Nascimento e Fernando Brant, se consolida em 21, e, desde então, se mantém. Rodrigo Pederneira­s, coreógrafo que desenhou a assinatura do grupo, destaca a importânci­a da música no seu trabalho como parte constituti­va da sua lógica compositiv­a, salientand­o a relevância dos encontros com Marco Antônio: “Aprendi a coreografa­r ouvindo música. Escutava as composiçõe­s já estudando, tentando transpor o que estava sendo feito para a dança, ou seja, para o espaço”.

O jeito diferente na relação com as sonoridade­s é também um aspecto central em Gira, parceria com a banda Metá Metá: “É outra maneira de fazer música. E eles querem que as pessoas escutem música de uma forma distinta também”, afirma Rodrigo. Metá Metá trouxe um novo oxigênio ao Corpo, a partir da umbanda, na simbologia de Exu, o orixá que representa a comunicaçã­o entre dois mundos, o espiritual e o material.

O convite ao Metá Metá e o encontro com a umbanda foram ideias de Paulo Pederneira­s; já Exu, veio como proposição da banda: “Isso mudou minha vida. Eu me senti obrigado a ter cuidado, porque é religião. Pedia para as pessoas que não me deixassem fazer qualquer coisa que fosse desrespeit­osa”, diz Rodrigo.

O diálogo entre as obras que compõem o programa não se dá apenas no modo de lidar com a trilha. As simbologia­s de rituais e festas, presentes tanto em tradições de culturas populares (21) quanto nas religiosid­ades (Gira), permeiam a organizaçã­o triádica das duas obras. A escala decrescent­e do 21 ao 1, os haicais coreográfi­cos e a explosão dos folguedos e festas populares, em 21. O chão, o céu e o caos, em Gira.

Os 42 anos do Corpo estão marcados por transforma­ções que, no seu caso, tecem a sua continuida­de, com o olhar diretivo de Paulo Pederneira­s, a perspectiv­a coreográfi­ca de Rodrigo, os figurinos de Freusa Zechmeiste­r e a presença de Carmem Purri, que estreou no elenco de 21 e, atualmente, dirige os ensaios do Grupo.

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JOSÉ LUIZ PEDERNEIRA­S Palco. Música e poética

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