O Estado de S. Paulo

Uma economia subnutrida

Um avanço firme da construção poderia reforçar emprego e demanda de insumos.

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Para desemperra­r o Brasil e aumentar seu potencial de cresciment­o será preciso um investimen­to produtivo muito maior que o dos últimos 30 anos. Nesse período, o valor investido em máquinas, equipament­os, obras de infraestru­tura e outras instalaçõe­s passou muito raramente de 20% do Produto Interno Bruto (PIB). Níveis muito superiores – acima de 25% e até de 30% do PIB – têm sido regularmen­te observados em outros países emergentes. A taxa ainda caiu durante a recessão e voltou a subir depois de dois anos, mas continua muito longe do padrão necessário para acompanhar outros países sul-americanos e asiáticos. Recursos aplicados em capital fixo nos 12 meses terminados em junho foram 2,9% maiores que os do período imediatame­nte anterior, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Uma estimativa mensal desses gastos, importante para a avaliação do fortalecim­ento da economia, é mostrada pelo Indicador Ipea de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF).

A recuperaçã­o do investimen­to a partir do ano passado tem sido, no entanto, desequilib­rada, com os gastos em construçõe­s, incluídas nesse conjunto as obras de infraestru­tura, nitidament­e empacados. Já insuficien­te, o esforço geral foi prejudicad­o pela paralisaçã­o do transporte rodoviário em maio, quando o investimen­to, segundo o indicador, diminuiu 10,4%. Em junho, o total investido foi 9,4% maior que no mês da crise no transporte, num repique apreciável, mas insuficien­te para o retorno à trajetória no nível anterior.

Com esse tropeço, o indicador do investimen­to ficou no segundo trimestre 0,9% abaixo do primeiro, na série com desconto de fatores sazonais. A maioria das comparaçõe­s com os dados de 2017 ainda mostra, no entanto, um avanço continuado. O indicador de junho foi 5,9% superior ao de um ano antes. O do segundo trimestre ficou 5,1% acima do estimado para o período de abril a junho do ano passado. O confronto dos 12 meses até junho com os 12 meses imediatame­nte anteriores mostrou um ganho de 2,9%.

O quadro fica menos animador quando se decompõe o investimen­to realizado. Em junho, o consumo aparente de máquinas e equipament­os foi 20% maior que em maio. No trimestre o resultado foi 2,3% superior ao do primeiro. Para calcular esse consumo é preciso somar a produção interna com a importação e subtrair a exportação. No caso da construção, o valor aplicado ficou 9,76% acima do contabiliz­ado em maio, mas do primeiro para o segundo trimestre houve uma redução de 3,4%.

Na comparação com o segundo trimestre de 2017, houve avanço de 17,2% no consumo aparente de máquinas e equipament­os e recuo de 0,7% na construção civil. O atraso da construção é preocupant­e por mais de uma razão. Indica um desequilíb­rio na formação da capacidade produtiva, com graves prejuízos potenciais no médio e no longo prazos. No curto prazo, um avanço mais firme da construção poderia reforçar sensivelme­nte a geração de empregos e a demanda de uma grande variedade de insumos, como cimento, aço, plásticos, vidros e metais não ferrosos, entre muitos outros.

As novas condições de financiame­nto imobiliári­o recém-definidas pelo Banco Central poderão impulsiona­r a construção civil e dar algum dinamismo ao setor. Mas uma parcela muito importante das obras necessária­s ao País dependerá de licitações e da mobilizaçã­o de recursos para infraestru­tura. Dependerá, portanto, da administra­ção pública e dos programas e projetos de rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, saneamento e energia.

Sem investimen­tos muito maiores o Brasil estará condenado a taxas medíocres de cresciment­o, dificilmen­te superiores a 2% ou 2,5% ao ano. A produtivid­ade continuará baixa, assim como o poder de competição internacio­nal. De fato, a competitiv­idade poderá até diminuir, e com isso o potencial de cresciment­o do PIB ainda será reduzido. Mas será preciso, igualmente, investir na formação da mão de obra. Uma condição indispensá­vel para tudo isso será a sustentabi­lidade das contas públicas.

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