Devolução de recurso desviado não caduca
Com a decisão, ações para ressarcimento em atos de improbidade administrativa não prescrevem; ministros Fux e Barroso mudam voto
O STF decidiu que não há prazo de prescrição para o ressarcimento de dinheiro público desviado por agentes públicos. Os ministros derrubaram a tese de que uma ação desse tipo deveria ser aberta em até cinco anos.
Após reviravolta no Supremo Tribunal Federal, a Corte decidiu, por 6 votos a 5, que não existe prazo de prescrição para o ressarcimento de dinheiro público desviado por atos de improbidade administrativa praticados com dolo (com intenção de causar dano) por agentes públicos ou terceiros. Os ministros derrubaram a tese de que uma ação para esse tipo de cobrança teria de ser aberta em até cinco anos após o descobrimento do fato.
O julgamento começou na semana passada, quando a Corte formou maioria pela fixação do prazo de cinco anos, o que provocou repercussão no meio jurídico. Como o Estado mostrou ontem, para procuradores e juristas, a prescrição iria dificultar a reparação de dano ao erário, incluindo casos antigos da Lava Jato.
A reversão do placar ocorreu após os ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso mudarem a posição da semana passada, quando haviam defendido a prescrição. Com a mudança dos votos de Fux e Barroso, ajudaram a formar os seis votos vencedores ontem os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia e o decano Celso de Mello. Ficaram vencidos, além do relator Alexandre de Moraes, os ministros Marco Aurélio Mello, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
O julgamento tem repercussão
geral – servirá de base para todos os tribunais do País, onde 999 ações estão paradas aguardando esse desfecho. A tese foi definida em um recurso do Ministério Público de São Paulo contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP) que reconheceu a prescrição em processo de improbidade de ex-servidores públicos municipais.
Os ministros afirmaram que a imprescritibilidade é exclusiva à prática de ressarcimento, ou seja, se o ato de improbidade prescreveu, não há como aplicar outras sanções a quem cometeu o ato ilícito. “Entendo que hoje em dia não é consoante com a postura judicial que danos decorrentes de crimes praticados contra a administração pública fiquem imunes da obrigação com o ressarcimento. Então, com toda humildade, eu peço vênia aos colegas e retifico meu voto”, disse Fux.
Ao alterar o voto, Barroso disse que a prescritibilidade, nesse caso, não produz o melhor resultado para a sociedade. Foi o ministro quem sugeriu que a prescrição seja exclusiva aos atos de improbidade dolosos (como enriquecimento ilícito, enriquecimento ilícito de terceiros, dano intencional a administração pública), e não aos atos culposos (descaso, inépcia).
‘Falácia’. Moraes, que se posicionou a favor da prescrição, afirmou que sua preocupação estava voltada ao “devido processo legal”. O relator ainda criticou as afirmações de que o prazo prescricional “atrapalharia” o combate à corrupção. “É uma falácia, com o perdão da palavra, que a imprescritibilidade atrapalharia o enfrentamento da corrupção. O que atrapalha o enfrentamento é a incompetência”, disse Moraes. “Chegou-se ao absurdo de falar que atrapalha a Lava Jato, (mas a prescrição) já é uma vacina que previne eventual incompetência.”
“Se não se pode mais discutir o ato de improbidade (em função da prescrição), como se pode discutir o ressarcimento?”, questionou o ministro Marco Aurélio, também a favor da prescrição.