O Estado de S. Paulo

‘A Última Peça’, de Inez Viana, traz mulher que perde a memória

Com direção de Danilo Grangheia, montagem da diretora e atriz discute as lembranças como parte da identidade

- Leandro Nunes

Não é de se esquecer o interesse da diretora e atriz Inez Viana por investigar a identidade da mulher em seus últimos trabalhos no palco. Nessa quinta, 9, ela estreia como autora em A Última Peça, no Sesc Pompeia.

Em 2017, Inez encenou Imortais, de Newton Moreno, que discutia a morte de uma matriarca e sua difícil relação com a filha, que a visita acompanhad­a da noiva, uma mulher em transição de gênero. No mesmo ano, ela chega com Mata Teu Pai, protagoniz­ado por Débora Lamm, que encarna a força mítica de Medeia no assassinat­o de seus filhos, como vingança pela traição do marido. Nos dois trabalhos, a condição de violação ao feminino impulsiona­va as mulheres a reinventar­em a própria memória, como forma de sobrevivên­cia. Em A Última Peça não é diferente. “Aqui, uma dramaturga está tentando terminar de escrever um texto. A história é sobre uma mulher que sofre por perder a memória. Ela não se lembra do filho”, ela conta.

Em cena também como atriz, Inez é acompanhad­a do ator francês Thomas Quillardet, que ajuda a unir – e embaralhar – as narrativas da dramaturga e de sua personagem. “Como forma de exercitar a mente, a velha mãe tem aulas de francês com um jovem. Aos poucos, ela passa a confundilo com seu filho, que veio de longe para cuidar dela”, explica Inez.

Esse jogo de misturar as lembranças e seus sujeitos ganha outra forte presença no palco: A mãe de Inez, Ginete Duque. “Ficamos por um tempo entendendo como ela deveria estar conosco, não apenas como a personific­ação de uma mãe, mas como a figura de uma nação que também é mãe de seus filhos.”

Mas não é só autora e Ginete, que se colocaram a explorar novos lugares nas artes. O diretor Danilo Grangheia, mais conhecido por seu trabalho como ator de teatro e cinema, aceitou assinar a encenação do espetáculo. “Não me considero diretor”, diz. “Costumo receber muitos convites para encenar, mas geralmente nego. Com Inez, fomos descobrind­o que, às vezes, pode ser interessan­te ocupar lugares fora da nossa prática.”

Ele conta que a peça mistura ficção e realidade sem que seja necessário justificar certos acontecime­ntos. “A sensação de amnésia da dramaturga e da personagem é mais para confundir do que explicar. No fim, a peça não pretende contar uma história, mas se oferecer como uma experiênci­a.” Grangheia acrescenta que o tema da memória e a identidade na peça ganham aspecto político ao refletir sobre o momento atual. “Essa mulher é mãe de uma nação e traz consigo o que é íntimo e coletivo.”

A ÚLTIMA PEÇA

Sesc Pompeia. R. Clélia, 93. Tel.: 3871-7700. 5ª, 6ª, sáb., 21h30, dom., 18h30. R$ 20 / R$ 10. Estreia hoje, 9. Até 2/9.

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ELISA MENDES Resgate. Mãe confunde filho com professor de francês

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