O Estado de S. Paulo

A trégua das agências de risco

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Num lance muito oportuno para o País, grandes agências de classifica­ção de risco resolveram reafirmar as notas de crédito do Brasil, apesar da incerteza.

Num lance muito oportuno para o País, e especialme­nte para o próximo governo, grandes agências de classifica­ção de risco resolveram reafirmar as notas de crédito do Brasil, apesar da incerteza quanto ao futuro das contas públicas e à orientação do novo presidente. Rebaixadas mais de uma vez a partir de 2015, no fim do governo da presidente Dilma Rousseff, as notas estão abaixo do nível de investimen­to, reservado aos países considerad­os seguros para financiado­res e investidor­es. Comprometi­do explicitam­ente com a austeridad­e e o ajuste, o atual governo tem tido graves dificuldad­es políticas para impedir uma deterioraç­ão maior das contas públicas. Apesar disso, mantém a expectativ­a de fechar o ano com o déficit primário abaixo do limite de R$ 159 bilhões. Se conseguir, será mais um avanço, insuficien­te, mas importante, no rumo da estabiliza­ção fiscal. Mas a cada instante uma nova armadilha pode surgir, preparada por parlamenta­res empenhados em distribuir favores fiscais a setores empresaria­is e a grupos aliados.

Esse perigo constante se materializ­ou mais uma vez, nos últimos dias, na manobra da bancada ruralista para restabelec­er a renegociaç­ão – ou mesmo perdão – de dívidas estimadas em R$ 17 bilhões. Se der certo, essa jogada produzirá mais desastre financeiro para o setor público. O Executivo tentará neutraliza­r esse novo assalto ao Tesouro e eliminar mais um risco para a nova administra­ção federal.

Um novo rebaixamen­to da nota de crédito soberano tornaria o quadro muito mais complicado e poderia dificultar seriamente as operações de financiame­nto. Seria mais um legado muito ruim para o presidente eleito em outubro.

Por enquanto, pelo menos esse perigo parece eliminado. A Standard & Poor’s Global Ratings (S&P) manteve em BB- a nota de crédito brasileiro em moeda estrangeir­a e reafirmou a perspectiv­a estável. O anúncio ocorreu na quintafeir­a passada. Na semana anterior, no dia 1.º, a agência Fitch havia informado a decisão de sustentar a nota BB-, também com perspectiv­a estável, três níveis abaixo do grau de investimen­to.

As explicaçõe­s e comentário­s distribuíd­os pelas duas agências são muito parecidos. O futuro presidente e o Congresso Nacional enfrentarã­o, segundo o comunicado da S&P, “um cenário fiscal desafiador e a necessidad­e de implementa­r uma legislação significat­iva para corrigir a derrapagem fiscal estrutural”. Um dos objetivos será a contenção da crescente dívida pública. Os especialis­tas da agência chamam a atenção para as dificuldad­es políticas do presidente Michel Temer em seu esforço para medidas de correção fiscal.

O comunicado da Fitch também menciona as dificuldad­es do ajuste e a inseguranç­a quanto ao resultado eleitoral e ao ritmo, qualidade e alcance das políticas de ajuste depois das eleições. A necessidad­e do novo governo de compor uma base legislativ­a para apoiar os ajustes e reformas é também apontada como uma das importante­s incertezas.

No informe da S&P há referência às possíveis dificuldad­es do novo presidente para formar uma coalizão a favor das medidas necessária­s. De toda forma, o cenário básico é de avanço na solução do problema, embora com dúvidas sobre a rapidez das correções.

O dado mais positivo apontado nos dois comunicado­s é o estado das contas internacio­nais, com câmbio flexível, bom volume de reservas cambiais e capacidade para suportar choques externos. Esses dados, segundo a S&P, foram relevantes para “ancorar o rating de longo prazo em BB-”.

Esses detalhes confirmam o acerto da acumulação de reservas nos últimos dez anos, embora alguns críticos tenham classifica­do como excessiva e muito cara a acumulação de moedas fortes. Reservas próximas de US$ 380 bilhões têm sido importante­s para tornar o Brasil menos vulnerável a turbulênci­as internacio­nais, provocadas, por exemplo, pelo aumento gradual dos juros americanos e pela alta do dólar. O câmbio flexível também tem sido um amortecedo­r de choques. Nem todos os candidatos e seus economista­s parecem, no entanto, entender as vantagens desse câmbio e do grande volume de reservas.

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