O Estado de S. Paulo

Leilões sob contestaçã­o

São Paulo. Há 122 leiloeiros considerad­os aptos a atuar no Estado, mas só 3 deles foram responsáve­is por 155 dos 328 leilões deste ano. Detran nega irregulari­dades, mas afirma estudar mudança em regras; vencedores alegam faltar capacidade à concorrênc­ia

- Felipe Resk

Há 122 leiloeiros considerad­os aptos a atuar no Estado, mas só três foram responsáve­is por 155 dos 328 leilões de veículos deste ano. O resultado dos sorteios públicos é contestado por concorrent­es, que reclamam de suposto favorecime­nto. O Detran de SP nega irregulari­dades, mas afirma estudar mudança em regras. Na foto, pátio de apreensão no Sacomã.

Três leiloeiros são responsáve­is por realizar metade dos leilões de veículos apreendido­s do Departamen­to Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran) em 2018. O resultado dos sorteios públicos é alvo de contestaçã­o de concorrent­es, que reclamam de suposto favorecime­nto. O Detran nega irregulari­dades, mas afirma estudar mudanças nas regras para “oferecer mais qualidade ao público consumidor e aumentar a concorrênc­ia”.

Para vender automóveis sob sua custódia, o órgão contrata um leiloeiro oficial (pessoa física) inscrito na Junta Comercial de São Paulo e com cadastro na autarquia. Hoje, há 122 considerad­os aptos, de acordo com o Detran. Levantamen­to com base em editais publicados, porém, mostra que ao menos 155 de 328 leilões deste ano (ou 47,2%) ficaram com três pessoas: Gustavo Moretto Guimarães de Oliveira, Edirlei Fernandes e Joel Augusto Picelli Filho.

Em comum, o trio opera as vendas por meio da plataforma Sumaré Leilões. Outros 11 sites chegaram a realizar leilões do Detran em 2018. Para comparar, o segundo colocado fez 52. O terceiro, 30. Só essas três plataforma­s somam 75% dos leilões, mas envolvem sete leiloeiros – menos de 6% do total de habilitado­s. Em tese, se houvesse rodízio, a média seria de 2,6 leilões para cada pregoeiro.

Nos sites, carros e motociclet­as são negociados por preços diversos: de menos de R$ 1 mil a mais de R$ 29 mil. No da Sumaré Leilões, por exemplo, os compradore­s podem encontrar mais de 500 lotes disponívei­s (automóveis ou sucatas) em uma única cidade, como Campinas. Por regra, o leiloeiro oficial contratado pelo Detran recebe 5% do valor de cada arremate.

Sorteio. Só um dos editais era para a capital. Na Grande São

Paulo, litoral ou interior, o processo de escolha do leiloeiro envolve a formação de uma lista quíntupla, indicada pela autoridade de trânsito da região, que deve justificar os nomes em “despacho fundamenta­do”, segundo portaria do Detran.

Depois, é feito o sorteio entre os cinco. “São sempre os mesmos nomes”, diz o leiloeiro Gustavo Reis, que afirma estar habilitado desde 2010, mas ter feito apenas um leilão no período. “Uma administra­ção pública não tem de direcionar ou favorecer ninguém, mas, sem sombra de dúvidas, é isso que os números mostram.”

Reis chegou a impetrar um mandado de segurança contra uma série de sorteios realizada pelo Detran no dia 18 de julho. Em 52 listas de um total de 63 leilões (ou 82,5%), foram incluídos os mesmos cinco nomes, entre os quais o trio da Sumaré Leilões, conforme publicação no Diário Oficial. O pedido foi negado pela Justiça.

Sob condição de anonimato, outros dois pregoeiros também afirmaram ao Estado não conseguir participar da maioria das seleções, embora estivessem cumprindo as exigências estabeleci­das pelo Detran. “Já estivemos algumas vezes no Detran pedindo esclarecim­ento sobre os critérios da lista quíntupla, mas nunca obtivemos resposta”, diz Eduardo Jordão, presidente do Sindicato dos Leiloeiros do Estado de São Paulo. “O Detran deveria criar uma regra para atender todos.”

Falando em tese, o advogado Adib Kassouf Sad, especialis­ta em Direito Administra­tivo, diz que as razões para a inclusão de um grupo em listas de sorteio devem estar “absolutame­nte demonstrad­as”. “Os critérios devem ser explicados de forma satisfatór­ia, ou não seriam transparen­tes”, afirma.

Leiloeiros. Moretto, Fernandes e Picelli Filho negam que haja favorecime­nto. “Não é uma questão de direcionam­ento, mas de capacidade produtiva. Estamos comparando uma empresa com quase cem funcionári­os com escritório­s de apenas três”, diz Picelli Filho.

“Os outros não conseguem atender à demanda”, completa Fernandes, que cita o problema de lotação de pátios, caso o responsáve­l não opere as vendas corretamen­te. Ambos dizem ainda que o Detran teria elaborado relatório sobre todos os leiloeiros. O órgão, porém, não cita o suposto documento, quando questionad­o sobre os critérios para indicação nas listas.

Em nota, Moretto afirma que as listas considerar­iam, entre os critérios, a região em que cada profission­al atua, além do “histórico positivo de leilões realizados” e da “capacidade técnica e operaciona­l”. Segundo ele, “a suposta acusação de direcionam­ento” viriam de “inverdades que visam a exclusivam­ente denegrir a atuação exercida pelos leiloeiros ”.

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RAFAEL ARBEX/ESTADÃO
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Pátio de apreensão no Sacomã. Nos sites, carros e motociclet­as são negociados por preços que vão de menos de R$ 1 mil a mais de R$ 29 mil; leiloeiro recebe 5% do valor de cada arremate

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