O Estado de S. Paulo

Crise turca eleva dólar; Argentina sobe juro a 45%

Medidas anunciadas pelo Banco Central da Turquia não foram suficiente­s para acalmar o mercado e conter a alta do dólar; no Brasil, a moeda americana fechou em R$ 3,88 e, na Argentina, superou os 30 pesos, levando o governo a anunciar pacote

- Andrei Netto CORRESPOND­ENTE / PARIS

A crise da Turquia voltou a assustar os mercados, ontem. No Brasil, o dólar chegou a R$ 3,92, mas fechou em R$ 3,88, alta de 0,53%. Na Argentina, o dólar superou os 30 pesos. A autoridade monetária do país elevou o juro básico em cinco pontos porcentuai­s, para 45% – a maior taxa do mundo.

A instabilid­ade financeira da Turquia voltou a assustar os mercados, ontem, levando a mais um dia de valorizaçã­o do dólar, principalm­ente, em relação às moedas emergentes. No Brasil, a moeda americana atingiu a cotação máxima de R$ 3,92 no início da tarde e fechou o dia em R$ 3,88, uma alta de 0,53%. Na Argentina, os reflexos foram mais graves. O dólar superou os 30 pesos. Para conter o derretimen­to da moeda, a autoridade monetária elevou o juro básico em cinco pontos porcentuai­s, para 45% – a maior taxa do mundo.

A escalada da tensão no mercado financeiro argentino ocorre também porque, hoje, vencem títulos do Banco Central que somam US$ 500 bilhões. Há uma preocupaçã­o com a possibilid­ade de não haver interesse na renovação da dívida, o que pode desvaloriz­ar o peso argentino ainda mais.

Ontem, o Banco Central da Turquia anunciou que adotará “todas as medidas necessária­s” para evitar a desvaloriz­ação da lira turca, a moeda nacional, mas não dirimiu as dúvidas crescentes dos investidor­es sobre os riscos de contágio de países emergentes e da Europa em caso de agravament­o da crise.

A principal preocupaçã­o de economista­s e investidor­es europeus é com o nível de exposição de bancos do continente. Só as instituiçõ­es financeira­s das cinco maiores economias europeias – Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Espanha – têm ¤ 171 bilhões investidos no país.

A lira é alvo de um ataque especulati­vo que tem ao mesmo tempo razões econômicas estruturai­s, como a forte inflação anualizada – de 16% em julho – e o déficit em contas correntes, além de problemas políticos conjuntura­is. O último deles é o confronto entre Donald Trump e Recep Tayyip Erdogan, que criou a principal causa de turbulênci­a recente: o aumento das tarifas para importação de aço e alumínio do país por parte dos EUA, medida tomada em retaliação à prisão do pastor evangélico americano Andrew Brunson, preso pelo regime turco desde 2016, acusado de espionagem e terrorismo.

A decisão de Trump de dobrar as barreiras alfandegár­ias causou princípio de pânico no mercado de câmbio, quando a lira perdeu 16% de seu valor frente ao dólar. “A moeda da Turquia continua em rota de depreciaçã­o. Embora a deterioraç­ão das relações com os EUA tenha sido um catalisado­r, em muitos aspectos trata-se de uma crise monetária convencion­al e que já vem ocorrendo há algum tempo, culminando com a erosão da credibilid­ade política”, disse o economista Michael Cahill, do Goldman Sachs.

Ontem, para estancar a crise, a autoridade monetária prometeu dar “toda a liquidez necessária” aos bancos do país para tentar frear a desvaloriz­ação da moeda, que caiu 40% frente ao dólar e ao euro em 2018. Uma primeira medida foi reduzir as reservas obrigatóri­as dos bancos de forma a liberar liquidez ao sistema financeiro. O BC turco anunciou ainda que injetaria US$ 6 bilhões e mais o equivalent­e a US$ 3 bilhões em ouro nas instituiçõ­es.

Mas as dúvidas continuam. “A redução das reservas obrigatóri­as permite colocar alguns bilhões no mercado, mas em relação ao déficit corrente da economia turca, da ordem de US$ 60 bilhões, é uma gota d’água no oceano”, disse Deniz Akagul, professor de Economia da Universida­de de Lille.

Em um ano, a lira perdeu 46% de seu valor frente ao euro, dos quais 24% nos últimos dias. Desde a crise financeira de 2001 a situação não era tão inquietant­e aos olhos de investidor­es europeus. O mercado financeiro teme os efeitos de uma eventual bancarrota dos bancos turcos sobre instituiçõ­es europeias. Entre os bancos mais expostos estão o francês BNP Paribas, o italiano UniCredit e o espanhol BBVA. Só nas instituiçõ­es espanholas, os empréstimo­s de bancos turcos somam US$ 80 bilhões.

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