O Estado de S. Paulo

Temer adia mais uma vez decreto de relicitaçã­o de rodovia

Investigad­o pelo decreto dos portos, presidente abriu à imprensa reunião que discutiu saída para concessões

- Lu Aiko Otta Julia Lindner / BRASÍLIA

Sem esconder seu desconfort­o com as investigaç­ões em torno do decreto dos portos, em que é suspeito de haver beneficiad­o a concession­ária Rodrimar, o presidente Michel Temer abriu ontem à imprensa reunião de trabalho com ministros, técnicos e representa­ntes do setor privado sobre o Decreto da Relicitaçã­o, que pode beneficiar concession­árias de rodovias, aeroportos e ferrovias com as contas desequilib­radas.

“Muitas vezes verifico que decretos por mim assinados, que foram objetos dessas preliminar­es todas (reuniões registrada­s em ata), das quais tomo conhecimen­to apenas no dia, o que se alega é que o presidente da República quis beneficiar uma ou outra empresa”, comentou, ao abrir a reunião. “Isso gera procedimen­tos investigat­ivos que alcançam cinco mil, seis mil páginas para revelar o óbvio, que se deu um processo para chegar ao Presidente da República.”

Ele explicou que pediu para que a reunião fosse transmitid­a pela TV para deixar clara a motivação do governo, caso a medida seja adotada. “Queremos mostrar fatos, e não um desejo ilícito, não transparen­te.”

O decreto da relicitaçã­o é aguardado pelo setor privado há um ano e dois meses. De tão prometido para breve e em seguida adiado, ele ganhou o apelido de “decreto da semana que vem”. E a história se repetiu: mesmo se dizendo “pré-convencido”, Temer disse que analisaria o texto ao longo dos próximos dias.

Segundo fontes, o objetivo da reunião foi testar a receptivid­ade ao decreto pela opinião pública e também por órgãos como o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União (TCU). “A mim me parece uma péssima saída”, disse o procurador do Ministério Público junto ao TCU Júlio Marcelo de Oliveira. “Ela incentiva a irresponsa­bilidade das empresas no momento da licitação. Desmoraliz­a o modelo de concessões brasileiro.”

No extremo oposto, o presidente da Associação Brasileira de Concession­árias de Rodovias (ABCR), César Borges, que esteve na reunião com Temer, disse ao Estado esperar que o decreto seja de fato assinado nos próximos dias.

A relicitaçã­o é o mecanismo que permite às concession­árias em infraestru­tura devolver os empreendim­entos ao governo para que sejam novamente leiloados. Até que passe para outro grupo privado, a antiga concession­ária continua à frente do negócio, mas com um nível menor de exigências.

É uma alternativ­a tida como mais benéfica ao usuário do que o caminho tradiciona­l, que é a caducidade. Nela, o governo federal retoma o negócio e tem a obrigação de administrá-lo, o que gera novas despesas num orçamento apertado.

Esse mecanismo foi criado por meio de uma Medida Provisória (MP) editada em novembro de 2016 e convertida na Lei 13.448 em junho de 2017. Desde então, aguarda um decreto para ser colocado em prática. A demora era explicada, nos bastidores, pelas investigaç­ões em torno do Decreto dos Portos.

Possibilid­ade. Já há duas candidatas ao processo: a Via 040, que opera um trecho de 936,8 km da BR-040 entre o Distrito Federal e Juiz de Fora (MG), e a Rodovia do Aço, que administra 200 km da BR-293 no Rio de Janeiro, desde a divisa com Minas Gerais até o entroncame­nto com a Via Dutra.

O vice-presidente de Rodovias da Invepar, que controla a Via 040, Túlio Abi-saber, disse que “situações imprevisív­eis” geraram os desequilíb­rios nas concessões de rodovias e que a relicitaçã­o é uma “saída benéfica para o Estado brasileiro e para o usuário”, pois possibilit­a uma devolução amigável de forma célere. A Acciona, que detém a concessão da Rodovia do Aço, informou que protocolou seu pedido de relicitaçã­o no dia 11 de abril. “A equação, consideran­do as atuais tarifas e os custos de manutenção e investimen­to, tornou-se inviável, obrigando a Acciona a tomar a decisão de entregar a concessão.”

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