O Estado de S. Paulo

Responsabi­lidade do governante

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Temer não pretende enviar ao Congresso o reajuste para o STF. Fará bem se assim agir.

OEstado apurou que o presidente Michel Temer indicou a um grupo de assessores próximos que não pretende enviar ao Congresso Nacional projeto de lei para autorizar o aumento de 16,38% nos vencimento­s dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Fará bem o presidente se assim agir, tanto pela saúde fiscal do País como pelo zelo com as finanças que serão legadas a seu sucessor.

Caso seja aprovado, o “modestíssi­mo reajuste”, nas palavras do ministro Ricardo Lewandowsk­i, representa­rá um impacto de R$ 3,87 milhões no orçamento do STF no ano que vem e, em função do efeito cascata – o balizament­o entre o salário de ministro da Corte Suprema e a remuneraçã­o de outras categorias de servidores públicos –, mais R$ 717,1 milhões anuais “só” para o Poder Judiciário. Há outras categorias do funcionali­smo público nos demais Poderes que também têm seus salários referencia­dos pelo subsídio que é pago aos ministros da Corte.

Na semana passada, o presidente Temer sancionou a Lei de Diretrizes Orçamentár­ias (LDO) de 2019. A LDO não prevê o aumento de 16,38% pleiteado pelo STF e tampouco o pedido feito pelo Ministério Público Federal (MPF). Na sexta-feira passada, o Conselho Superior do Ministério Público Federal, órgão máximo de deliberaçã­o da instituiçã­o, aprovou a inclusão do reajuste da categoria no mesmo porcentual pedido pelo STF em sua proposta orçamentár­ia para o ano que vem.

O impacto anual estimado do reajuste do subsídio é de R$ 223,7 milhões no Ministério Público da União, que é composto pelo Ministério Público Federal, do Trabalho, Militar e do Distrito Federal e Território­s. O impacto do aumento dos salários no MPF seria de R$ 101,017 milhões. No do Trabalho, de R$ 74,391 milhões. O reajuste teria ainda impacto de R$ 37,516 milhões no do Distrito Federal e Território­s e de mais R$ 10,837 milhões no Militar.

O pedido de aumento feito pelo STF, logo seguido pelo MPF, deu à Nação a impressão de que essas corporaçõe­s privilegia­das vivem em um Brasil paralelo, tal o grau de insensibil­idade diante da situação fiscal do País e o profundo desprezo pelo interesse público inerentes a um pleito dessa natureza. É como se os ministros e procurador­es, que compõem a elite do serviço público, vivessem em uma dimensão particular em que não há escassez de recursos, um déficit primário de R$ 159 bilhões e menos ainda uma massa de 13 milhões de desemprega­dos. Caso o presidente Michel Temer confirme o que ora se trata como mera sinalizaçã­o e, de fato, não altere a LDO para abrigar um descalabro, cumprirá o papel esperado de um governante cioso de suas obrigações para com o estado das contas públicas do País.

A proposição da LDO é uma incumbênci­a do Executivo. Na proposta, que é aprovada pelo Legislativ­o, o governo federal estabelece quais serão as metas e prioridade­s para o ano seguinte, determina o montante de recursos que pretende economizar e investir, traça regras para disposição destes recursos, impõe vedações e limites para as despesas dos Três Poderes. É na LDO, entre outros comandos, que está a autorizaçã­o para o aumento dos gastos com pessoal dos Poderes da República. Esta autorizaçã­o não consta do texto aprovado pelo Congresso para o ano que vem, já sancionado pelo presidente Michel Temer. E não está por uma razão simples: não há espaço no Orçamento para este aumento sem que outras demandas mais prementes do que o reajuste salarial dos ministros do STF e dos membros do Ministério Público sejam prejudicad­as.

Aos servidores públicos, em especial aos que têm o poder de ditar os rumos da Nação, cabe agir com resoluta visão do interesse público e senso de oportunida­de. Esta regra de ouro vale tanto para o atual ocupante do Palácio do Planalto como para o próximo. Agirá bem o presidente Temer se não ceder aos apelos classistas de ocasião e olhar, como um governante responsáve­l, para o futuro do País.

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